sábado, 6 de julho de 2013

Série simplesmente Livro -3 - Simplesmente sensual

Simplesmente Sensual
Carly Phillip
Digitalização Joyce
Revisão: Crysty
Resumo
Era uma missão comum... que se tornou amor!
Quando o investigador particular Ben Callahan aceitou a proposta
para vigiar a mimada herdeira Grace Montgomery, imaginou que
aquele seria um dinheiro fácil. Então, descobriu que a linda Grace era
um tanto inconseqüente... e uma séria ameaça a sua libido. Ben não
estava preocupado com sua capacidade de manter Grace a salvo de
estranhos... Mas quem a protegeria dele?
Grace Montgomery estava finalmente livre... livre para descobrir
quem era e o que queria. E quem ela queria, no momento, era seu
novo e sexy vizinho! Pretendia explorar seu lado sensual, livrar-se de
todas as inibições e descobrir como era ser uma mulher... a mulher
de Ben. Só não sabia que ele fora pago para ter esse privilégio!
CAPÍTULO I
Ben Callahan franziu o cenho para a xícara de porcelana finíssima na
bandeja à sua frente, Como não conseguisse enfiar um dos dedos
grossos pela asa da peça delicada, tentou segurar a xícara com a
mão inteira. Teria desistido da idéia, não fosse por sua idosa anfitriã.
Emma Montgomery declarara a hora do chá e, pelo que Ben já
pudera perceber, não arrancaria nenhuma informação dela, enquanto
não houvesse partilhado do ritual diário.
Não compreendia os ricos e nem sequer tentava. Tivera ampla
experiência com eles, e nenhuma deixara boa impressão. Sua mãe
trabalhara como faxineira, e Ben vira de perto o tipo de tratamento
que davam aos empregados. Assim que tivera idade suficiente para
sustentar a ambos, ele havia afastado a mãe do trabalho pesado,
assim como do abuso verbal que ela sofria.
Era uma grande ironia o fato de que a maior parte dos clientes que
Ben acumulara como investigador particular tivesse dinheiro de
sobra. E ele não se importava de receber esse dinheiro. Além de
pagar suas contas, cobria também o custo da comunidade
independente na qual sua mãe vivia. Era o pagamento por todos os
anos de trabalho que ela enfrentara.
A mulher sentada à sua frente era uma cliente em potencial. Fora
indicada por uma amiga, também da sociedade, a quem Ben
prestara serviços no ano anterior. Até então, Emma Montgomery fora
simpática, agradável e persistente.
Enquanto outros clientes tentavam diminuir ao mínimo as despesas
de Ben, assim como seus honorários, embora pudessem pagar até
mais, Emma fizera questão de pagar sua passagem de avião, de
Nova York até Hampshire, no Estado de Massachusetts, apenas para
conversar sobre os motivos que tinha para contratá-lo. E, ainda,
oferecera uma quantia polpuda, que Ben nunca recebera por um
único caso, e lhe prometera total liberdade nas despesas, sem
perguntas. Tudo isso antes de explicar por que precisava dele.
Ben não estava só intrigado, mas também inclinado a aceitar. O
dinheiro que ela lhe oferecera permitiria providenciar os cuidados do
uma enfermeira para sua mão. Com a visão se deteriorando
rapidamente, ela não poderia continuar vivendo sozinha por muito
tempo. E se, para isso, tivesse de suportar idiossincrasias como
tomar chã em uma xícara minúscula, Ben se forçaria a fazê-lo.
Ao erguer o olhar, descobriu que ela o fitava, atenta. Era como se
dissesse: "Estou esperando". Não havia nada que Ben pudesse fazer,
senão erguer a xícara e beber um gole.
Assim que o líquido quente atravessou os lábios de Ben, ela falou:
— Minha neta precisa de uma babá. Está interessado no trabalho?
Ben engoliu o chá depressa demais, queimando a língua e quase
derrubando a xícara. Não podia ter ouvido direito. Ela estava lhe
oferecendo todo aquele dinheiro para que ele bancasse a babá?
Sacudiu a cabeça.
— O que disse?
— Talvez eu tenha me expressado mal. Acho que a palavra mais
indicada seria "protetor". Minha neta está no processo de se
encontrar e precisa de um protetor.
Ben colocou a xícara de volta no pires, antes que provocasse danos
mais sérios.
— Acho que está mal informada, sra. Montgomery — murmurou.
Não importava qual fosse o pagamento, não aceitaria o papel de
babá.
— Ah, chame-me de Emma, sim! — ela corrigiu com um sorriso.
— Emma, sou um investigar particular. Não cuido de crianças
geniosas. A propósito, que idade tem a sua neta?
Emma apanhou um porta-retrato da mesa lateral e exibiu-o.
A mulher na fotografia não estava nem perto da infância. Tinha os
cabelos cor de mel, olhos castanhos e um rosto tão delicado quanto a
xícara em suas mãos. Ben foi imediatamente varrido por uma onda
de desejo que fez seu coração disparar.
— Ela tem quase trinta anos e é linda, não acha? — Emma declarou,
sem esconder o orgulho.
— Sim, ela é... bonita — ele concordou, sem jeito, pensando que a
moça mais parecia uma princesa dourada.
Em sua profissão, Ben estava habituado a observar pessoas e
fotografias. Costumava formar opiniões e seguir seus instintos.
Raramente se enganava e nunca se deixava levar por um rosto
bonito. E sempre fora capaz de manter a distância necessária. Até
aquele momento.
Aquela mulher era bonita o bastante para afetar os seus sentidos, e
sensual o bastante para despertar sua libido. Os olhos castanhos
refletiam riqueza de emoções e segredos bem guardados. Segredos
que ele ansiava por desvendar. A missão que Ben estivera prestes a
recusar tornara-se, de súbito, um trabalho que ele não poderia
resistir.
— Grace mudou-se para Nova York há alguns anos — Emma
informou-o. — Sempre viveu da pensão que os pais estabeleceram
para ela, desde a infância, sem trabalho estável, sem um homem
estável.
As últimas palavras foram pronunciadas com ênfase, enquanto os
olhos também castanhos examinavam Bem desde os cabelos revoltos
até as botas de trabalho.
Ele sacudiu a cabeça, como se assim pudesse se livrar daquele olhar.
— E o que está acontecendo com Grace, que a fez entrar em contato
comigo?
— Ela parou de retirar dinheiro da pensão e decidiu que está na hora
de viver por conta própria.
— Na minha opinião, trata-se de uma atitude admirável — Ben
declarou, sentindo respeito maior pela nova Grace, do que por
aquela que vivera à custa da família durante anos.
— Ah, sim, claro! Foi para isso que a eduquei, para ser inde-
pendente. E funcionou, até certo ponto. Ela deixou Hampshire e o pai
controlador, Edgar, meu filho. Nós o chamamos de "juiz". — Nesse
ponto, Emma riu, embora sem demonstrar bom humor.
— Ele não faz idéia do significado da palavra "família". Mas tenho de
admitir que, agora que meu neto, Logan, se casou e tem um bebê,
Edgar está aprendendo. Infelizmente, Grace não está aqui para ver.
Percebendo que ela havia se desviado do assunto, Ben tentou voltar
a questão do que, exatamente, ela queria.
— Então, quer que Grace volte para casa?
Emma sacudiu a cabeça.
— Não se ela estiver em segurança e feliz, em Nova York, isso é tudo
o que me importa. No entanto, não consigo tirar informações dela,
pois Grace decidiu manter sua vida em segredo. Tudo o que se
dispõe a dizer é que está bem e que eu não deveria me preocupar.
Como posso não me preocupar, sabendo que ela anda por aí, com
uma câmera fotográfica pendurada no pescoço, prestando mais
atenção em suas fotografias, do que nos seus arredores.
— Ela é uma mulher adulta — Ben sentiu-se obrigado a lembrá-la.
— Mulheres como ela são atacadas todos os dias, em Nova York. Ela
jura que teve aulas de auto defesa, como se isso fosse o bastante.
Tenho certeza de que minha neta está escondendo a verdade. Desde
que tive um infarto, ela pensa que está me protegendo. Não sabe
que é mais estressante para o coração ser mantida no escuro.
Ben assentiu em compreensão. Seu próprio pai morrera de um
ataque cardíaco, quando Ben tinha oito anos. Lembrava-se da pai,
como sendo um homem bom, com um coração de ouro. Pena que tal
coração também fosse fraco, e houvesse parado de bater quando ele
voltava para casa, de seu trabalho como gerente de uma loja de
departamentos. Não deixara seguro, nem muito dinheiro no banco. A
mãe de Ben fora forçada a tomar medidas extremas para sustentar a
si e ao filho, e acabara recorrendo à única experiência que possuía:
cuidar da casa. A diferença era que, dali por diante, ela passara a
cuidar das casas dos outros.
— Não me entenda mal, sr. Callahan. Estou feliz por saber que Grace
tornou-se, finalmente, capaz de enfrentar o mundo sozinha — Emma
explicou. — Isso dará a ela a chance de recuperar o tempo que o pai
lhe tomou, com seu controle exagerado. Mas, ao mesmo tempo, esse
tipo de liberdade me assusta. Mesmo estando com quase trinta anos,
Grace foi protegida e mimada por muito tempo. E eu a conheço.
Como deu o grande passo de sua vida, seu orgulho não lhe permitirá
recorrer a mim ou ao irmão, caso tenha problemas. Preciso ter
certeza de que ela está bem.
— Chame-me de Ben — ele disse, perguntando-se se a avó tinha
motivos para pensar que Grace tinha tendência para se meter em
encrencas.
Se fosse assim, que tipo de encrencas seriam essas?
Não havia a menor possibilidade de negar a Emma a paz de espírito
que ela buscava. O amor que sentia pela neta, juntamente com a
necessidade financeira de Ben, tomaram a decisão por ele.
Ela sorriu.
— Tomei algumas liberdades, calculando que aceitaria o caso.
— Que liberdades foram essas, sra. ... Emma? — Ben indagou,
apreensivo.
— Grace mora em um apartamento de um dormitório, no bairro de
Murray Hill. Depois de uma longa conversa com o proprietário,
consegui alugar o apartamento em frente ao dela, para você. Ao que
parece, é o irmão do proprietário quem mora lá, mas está fora do
país, por algum tempo. — O sorriso de Emma tornou-se mais largo.
— Não é muita gentileza do amigo dele, Ben Callahan, cuidar do
apartamento, nesse período?
Estendeu o braço para a mesa lateral e apanhou um molho de
chaves, para então balançá-lo diante dos olhos de Ben. Ele sacudiu a
cabeça.
— Muito conveniente. — Acreditara estar preparado para qualquer
coisa, mas havia se enganado. — Deve saber que já tenho onde
morar, Emma.
Emma revirou os olhos, como se ele tivesse alguma dificuldade de
raciocínio.
— É claro que sei! — Então, agarrou-lhe o braço com olhar de
súplica. — Preciso saber que Grace está segura, satisfeita e rea-
lizada, antes que eu possa morrer em paz. E você só poderá des-
cobrir se estiver bem perto, para ver com seus próprios olhos. Fui
informada de que você é o melhor, Ben.
Embora soubesse estar sendo vergonhosamente manipulado, Ben
não conseguiu desviar o olhar. Pior, os motivos dela pareciam tão
honestos e puros, que ele se descobriu incapaz de recusar o pedido.
Ora, que mal faria conhecer a neta para assegurar a avó de que
estava tudo bem? Daria paz de espírito à velha senhora e, ao mesmo
tempo, uma boa enfermeira à sua mãe. Tratava-se de uma situação
em que todos sairiam ganhando.
— E então? — Emma pressionou.
Ben voltou a olhar para a fotografia, perguntando-se qual seria a sua
reação quando se visse frente a frente com Grace Montgomery, em
carne e osso.
Emma deu-lhe um tapinha amigável no joelho.
— Tudo bem. Todos os homens reagem assim, quando a vêem pela
primeira vez.
Deveria o comentário fazê-lo sentir-se melhor?
— Imagino que, agora, saiba por que ela precisa de alguém para
protegê-la, especialmente agora, que está sozinha e mais vulnerável
do que antes.
Ben duvidava que Grace fosse tão ingênua quanto Emma imaginava.
Afinal, vivia na cidade havia algum tempo e, mesmo tendo muito
dinheiro, teria aprendido a ser cuidadosa. Mesmo assim,
compreendia a preocupação da avó.
Ben conteve um gemido. Se não fosse cauteloso, acabaria se
envolvendo com Emma e com a neta dela, mais do que deveria
envolver-se com qualquer cliente. O que era o bastante para recusar
o trabalho.
Fitou os cativantes olhos castanhos e soube que não seria capaz de
fazer isso. O amor de Emma por Grace eram uma parte da razão.
Sua necessidade financeira, a outra parte. Porém, havia ainda um
outro motivo, bem mais elementar: se ele recusasse a missão,
Emma encontraria outro investigador particular disposto a se
aproximar de sua neta.
Olhando para a fotografia, Ben concluiu que não poderia confiar em
si mesmo no que dizia respeito a Grace. Mas nada o faria permitir
que outro se encarregasse da tarefa.
A adrenalina corria nas veias de Grace, uma reação natural depois de
uma tarde tirando fotografias que alimentavam a sua alma. Ao
contrário do emprego temporário que conseguira no estúdio
fotográfico especializado em retratos pessoais, as horas que passava
no parque guardavam a chave para o seu futuro, e ela apreciava
cada minuto. Nem mesmo a parada rotineira na mercearia da
esquina havia aplacado a excitação que ela descobrira, fazendo o que
mais gostava. Se seus instintos estivessem corretos, havia
conseguido suas melhores fotos.
Tentou equilibrar as sacolas de compras e, ao mesmo tempo, retirar
a chave do apartamento do bolso do poncho. Eram tantas as dobras
do tecido que ela encontrava dificuldade para localizar a abertura. Só
agora compreendia a reação negativa da costureira diante da idéia
de acrescentar um bolso à imensa capa, mas Grace recusara-se a
trocar o agasalho pela sensata jaqueta jeans. O poncho fora um
presente de sua adorada avó e, tempos antes, permitira a Grace
esconder a câmera fotográfica do resto da família, que jamais
compreendera a sua obsessão artística, da mesma forma que não
conseguia compreender a própria Grace.
Tivera de fugir para outro Estado, instalar-se em uma cidade
enorme, para ficar sozinha, experimentar a vida e descobrir a
verdadeira Grace Montgomery: seus gostos, seus desejos, seu fu-
turo. Por ironia, a simples mudança não a aproximara de seu
objetivo. Na verdade, continuara a viver à custa da família porque,
em seu subconsciente, buscava a aprovação que jamais teria. Fora
somente quando seu irmão, Logan, se casara com a mulher mais real
e prática que Grace já conhecera, que ela se dera conta de que
queria o que Logan tinha: uma vida escolhida por ela mesma.
Mais uma vez, a ironia desempenhara papel importante. Embora
Grace houvesse abandonado o círculo de garotas mimadas do clube
de campo de sua cidade, mantivera conta to com suas amigas mais
próximas. Cara Hill, uma mulher que Grace gostava e respeitava,
trabalhava incansavelmente para a Chances, uma instituição de
caridade que beneficiava crianças carentes. Estava preparando um
panfleto e comprara uma página inteira em uma revista de grande
circulação, na intenção de esclarecer os ricos sobre os problemas
enfrentados pelas pessoas que viviam fora de seu círculo social.
O objetivo era angariar fundos, e Cara decidira arriscar-se com uma
fotógrafa desconhecida, Grace, para capturar com sua câmera o
mundo real e as crianças que o habitavam. Grace seria incapaz de
desapontá-la. A experiência poderia lhe trazer novos trabalhos e,
eventualmente, uma carreira fotográfica que lhe permitisse pagar
suas contas e sentir-se realizada ao final do dia.
Grace sentiu o metal frio da chave entre os dedos, ao mesmo tempo
em que uma das sacolas escorregou por entre seus braços e caiu no
chão. Ela olhou para baixo e gemeu.
— Tinham de ser os ovos!
— Arruinou Um jantar animado? — indagou uma voz masculina, bem
atrás dela.
Os instintos lhe disseram que a voz sensual pertencia ao seu novo
vizinho. Sentiu o calor que tomou conta de seu corpo. Fechou os
olhos e saboreou a sensação. Sentia o mesmo, sempre que o via
pela janela. Da primeira vez, ele descarregava roupas e acessórios
de um Mustang preto. Seu vizinho, Paul Biggs, funcionário de um
banco de investimentos, partira em uma viagem de negócios, e o
síndico a informara de que ela teria um novo vizinho, tempo-
rariamente.
No final, ela se vira presenteada por um novo e sexy vizinho,
vestindo calça jeans muito justa e uma camiseta desbotada que
aderia ao corpo incrivelmente bem esculpido. Grace vinha de um
mundo no qual os homens eram suaves, de unhas feitas. Um es-
pécime como aquele era uma das grandes vantagens de viver longe
de casa, e ela passara a observá-lo a distância.
Preparando-se para o seu primeiro encontro, colocou o resto das
sacolas no chão. Virou-se e, embora o visse com freqüência da
janela, e até já houvesse tirado algumas fotos, descobriu que nada
se comparava a vê-lo de perto.
Ele estava parado do outro lado do corredor, um ombro apoiado na
parede. Os cabelos negros, ligeiramente despenteados, atingiam a
altura dos ombros dele, e pareciam implorar pelo toque de uma
mulher.
Pelo seu toque, Grace pensou, engolindo seco. Ora, de onde vinha tal
idéia? Nunca se sentira tentada a afagar os cabelos de um homem,
antes. Por outro lado, nada naquele homem se parecia com o que ela
já conhecia. Ele exalava sensualidade e apelava para algo primitivo
dentro dela, que ela nem sonhava existir.
Ali estava um verdadeiro pacote de testosterona pura, cujo rótulo
dizia: "Não se meta comigo". E, de repente, Grace descobriu-se a
imaginar como seria divertido ignorar as advertências da em-
balagem.
— Acho que você está precisando de ajuda. Sou Ben Callahan, seu
novo vizinho.
A voz grave despertou-a de suas fantasias. Dando-se conta de que
estivera olhando para ele, boquiaberta, Grace estendeu-lhe a mão,
apresentando-se:
— Grace Montgomery.
— É um prazer conhecê-la.
Uma onda de calor envolveu-os. Ben limpou a garganta e, então,
soltou a mão dela depressa. Grace perguntou-se se ele teria sentido
o mesmo que ela.
— Posso ajudá-la — Ben ofereceu, parecendo totalmente recuperado.
Grace sacudiu a cabeça, desejando poder se recompor, também.
— Não, obrigada. Posso resolver isso sozinha.
Mas não podia resolver o que a presença dele provocava.
— Bem, minha mãe me ensinou a nunca permitir que uma mulher
faça força — ele declarou com um sorriso. — Além disso, gosto de
ajudar mulheres bonitas.
Sem esperar pela resposta, Ben abaixou-se e apanhou as sacolas.
Grace virou-se, consciente do calor e da força dele atrás de si, abriu
a porta e convidou-o a entrar.
— Onde devo colocá-las?
— Sobre o balcão da cozinha.
Ben obedeceu e, então, virou-se para perguntar:
— E então, acertei? Você arruinou mais um de seus jantares
animados?
Ele só poderia estar se referindo ao grupo de mulheres que fora ao
apartamento de Grace, na noite anterior. Quando se dera conta de
que, enquanto fazia seu trabalho para Chances, tinha a oportunidade
de tirar fotos absolutamente espontâneas de crianças, começara a
fazer cópias. Então, pais e mães iam ao seu apartamento, uma vez
por semana, para tomar café e apanhar as fotos gratuitamente.
Considerando a criação privilegiada, pela qual ela não tivera de se
esforçar, era o mínimo que podia fazer.
— Nada de jantares animados — respondeu, afinal. — Não planejei
nada além de uma noite sossegada, diante da televisão. E a noite de
ontem não foi a festa que você parece estar pensando.
— Pensei que havia perdido uma grande festa — ele comentou, sem
esconder a curiosidade.
— Não, foi apenas uma reunião de amigas. Vai se sentir melhor, se
eu disser que o seu convite foi extraviado pelo correio? — Grace
indagou com um sorriso maroto.
Bem riu.
— Não, mas sei que me sentiria melhor se você organizasse uma
festa de boas-vindas ao edifício, em minha homenagem.
— Eu... Bem, acho que poderíamos providenciar — ela replicou com
surpreendente ousadia.
Por mais que a provocação bem-humorada a agradasse, aquele
encontro a perturbara um bocado. Grace respirou fundo. O perfume
almiscarado de Ben era sedutor e excitante e, agora, tomaria conta
de seu apartamento durante um bom tempo, depois que ele fosse
embora. Sua vida, que até a véspera fora preenchida pela rotina e
pela preocupação de enfrentar a vida sozinha, adquirira brilho e
energia. Inspiração, ela pensou, estudando o homem da camiseta
justa.
Ele era tudo o que a atraía no sexo oposto, totalmente diferente dos
homens que a convidavam para sair, em Hampshire, sempre usando
terno e gravata, bem ao estilo do juiz Montgomery. E, embora fosse
apenas mais uma mulher anônima em Nova York, não pensara em
namorar, desde sua mudança. Especialmente depois que as
tentativas de suas amigas em lhe apresentar conhecidos haviam se
transformado em tediosos desastres.
Nada em Ben era tedioso. Grace observou os traços atraentes, a
postura sexy. Não encontrou nada nele que não a agradasse: do
perfume tentador ao calor de sua mão. Por que não fazer uso
daquela nova descoberta?
Profissionalmente, Grace já dera os passos iniciais na direção de uma
vida nova. Pessoalmente, habituara-se a recusar convites
masculinos, em favor de desfrutar da própria companhia. Agora, sua
feminilidade e seu poder de sedução estavam enferrujados por falta
de uso. Mas, graças a Ben Callahan, isso estava prestes a mudar.
Mesmo não sabendo, ele acabara de se tornar o seu segundo passo
na estrada do auto-conhecimento.
Grace inclinou-se para ele com ousadia.
— O que você tem em mente? — perguntou em tom de cum-
plicidade.
Um sorriso delicioso curvou os lábios dele, fazendo-a se dar conta de
que estava encurralada. Deliciosamente encurralada.
— Gostaria de conhecê-la melhor, Grace. Ela sorriu.
— Boa idéia — concordou, definitivamente satisfeita pela ousadia
dele.
Já se cansara de homens sempre muito educados, que abriam
portas, puxavam cadeiras e pagavam os jantares, mas nunca eram
honestos quanto a suas intenções. Ben deixava claro, na primeira
oportunidade, quem ele era e o que queria.
Deixara claro que estava disponível. Embora Grace quisesse ser
igualmente ousada e atrevida, tudo aquilo era novo demais para ela.
Não estava pronta para revelar que também desejava conhecê-lo
melhor, mas pretendia atender ao pedido dele.
A aura de autoconfiança que ele emanava despertava o desejo de
Grace em sentir o mesmo. Passar algum tempo na companhia
daquele homem poderia fazer muito por sua auto-estima. Além do
mais, ele era uma festa para os sentidos femininos e, com certeza,
também faria muito por sua descoberta sensual. Tal idéia fez o
coração de Grace disparar, enquanto sua mente produzia uma série
interminável de fantasias espetaculares.
Passou a língua pelos lábios e observou, fascinada, os olhos deles
seguirem o movimento. Então, ele se virou. O que, apesar de
incompreensível, foi um alívio, pois deu a Grace a chance de
recuperar o fôlego.
Com as mãos nos bolsos da calça e postura ereta, sem dar sinais de
interesse, Ben passou por ela e olhou em volta.
— Seu apartamento é de um quarto?
— Sim.
Depois de examinar a sala, repleta de tapetes orientais e peças
decorativas de porcelana, elogiou:
— Bonito lugar.
— Obrigada.
Grace havia decorado o apartamento nos tempos em que ainda vivia
com o dinheiro da família, antes de se dar conta de que teria de abrir
mão de tudo aquilo, se quisesse realizar seus sonhos. Embora
quisesse que Ben a conhecesse pelo que era, e não pela sua riqueza,
não começaria a dar explicações, conhecendo-o tão pouco.
Virou-se na direção da cozinha.
— Preciso guardar as compras.
— Grace? Voltou a fitá-lo.
— Algo errado? — ele perguntou.
Além do fato de a atitude dele a confundir? Bem, se os sentimentos
dele eram semelhantes aos seus, ela poderia compreender.
— Nada errado. Apenas me distraí com meus próprios pensamentos.
Foi um prazer conhecê-lo, Ben.
— Igualmente.
Após um instante de hesitação, Ben acariciou-lhe a face, produzindo
com aquele gesto simples uma combinação de calor e eletricidade.
Então, voltou a se afastar, parecendo confuso.
— Até mais, Gracie.
— Até...
Ben saiu com passadas sensuais que Grace não pôde deixar de
admirar. Quando a porta se fechou atrás dele, ela passou os braços
em torno do corpo, ainda chocada com as sensações que ele ins-
pirava.
Ben trouxera à tona o lado de sua personalidade que ela havia
reprimido, enquanto tentara viver sob as regras rígidas do pai. Por
uma única vez, saíra sorrateiramente de casa, para se encontrar com
amigas em um bar da cidade, e se arrependera amargamente. Seu
pai a envergonhara, telefonando para todos os pais, fazendo com
que suas amigas ficassem de castigo durante semanas. Depois disso,
elas haviam passado muito tempo sem falar com Grace.
O juiz atingira seu objetivo. Ela nunca mais sequer pensara em se
rebelar. Agora, porém, ao pensar no vizinho sexy, Grace via a
oportunidade de fazer exatamente o que nunca fizera, sem qualquer
conseqüência dolorosa.
Quando decidira viver sozinha, seu desejo era mudar totalmente a
sua vida. Não imaginara que tais mudanças surgiriam na forma de
um homem sexy e atraente, chamado Ben Callahan
Mas pretendia tirar o maior proveito da situação.
CAPÍTULO II
Gostaria de conhecê-la melhor, Grace. Bem esmurrou a parede.
Onde estava com a cabeça para reagir daquela forma? Passara os
últimos cinco dias observando-a a distância, mas mesmo assim, não
calculara o impacto que ela lhe causaria, quando estivessem frente a
frente. Pretendia ser simpático e começar a ganhara confiança dela.
Em vez disso, praticamente, deixara-se seduzir por aqueles lindos
olhos castanhos. Quando conseguira recuar, era tarde demais. Nem
mesmo um banho frio diminuíra o efeito de Grace Montgomery sobre
ele.
Tinha, ao menos, um consolo: fizera um progresso substancial e,
quando Emma desse o telefonema diário, o que aconteceria dentro
de cinco minutos, Ben poderia dizer-lhe que já conhecera sua neta.
Evidentemente, Emma não precisaria saber que ele ficara fascinado
Grace. E Ben sabia que, se não fosse cuidadoso, acabaria se
apaixonando por ela, uma mulher totalmente fora de seu alcance e,
pior, a quem ele estava investigando.
Talvez por causa do jeito descuidado do pai, Ben possuía um forte
senso de ética. Trabalhava com afinco, sustentava a mãe, poupava
dinheiro para o futuro, e certificava-se de que seus clientes ficassem
satisfeitos a ponto de lhe servirem de referência e fonte de
indicações. Seu senso de ética não incluía envolver-se com a neta de
uma cliente.
Tinha de se concentrar no trabalho. Na verdade, já fizera algum
progresso, e conhecia a rotina de Grace em detalhes. Sabia que ela
trabalhava em período integral em um estúdio fotográfico, e passava
as horas de almoço e fins de semana em um parque, próximo a uma
vizinhança questionável.
Ben sabia tudo sobre bairros perigosos, pois crescera em um deles.
Não teria problemas em tranqüilizar Emma com relação a como
Grace ganhava a vida, mas omitiria parte de suas informações.
Precisava saber mais, descobrir por que ela perambulava por
determinadas partes da cidade, de câmera em punho. Quando antes
obtivesse as informações, antes se veria livre daquela investigação.
Com um pouco de sorte, não haveria tempo para que seu coração se
partisse por uma mulher que, sem dúvida, logo se sentiria entediada
com sua nova vida.
Embora admirasse a tentativa que Grace fazia de viver a própria
vida, sabia que ela acabaria sentindo falta da família e da vida
confortável que deixara para trás. A decoração cara de seu apar-
tamento era prova disso.
E Ben não queria se tornar parte do que, em breve, deixaria de
existir.
Grace emergiu da estação do metro, câmera em mãos, inspirando o
ar fresco e sentindo-se livre. Passou por um edifício em ruínas e
acenou para um grupo de crianças que sempre via no parque. Então,
dobrou a esquina, na direção do playground que tanto adorava.
Como sempre acontecia durante o horário de almoço, as quadras de
basquete encontravam-se apinhadas de crianças e jovens. Grace
parou junto à grade e observou-os. De repente, empertigou-se.
Seria impossível não reconhecer os cabelos negros que atingiam os
ombros largos, nem os movimentos fluidos do corpo atlético, cujas
formas ela havia gravado na memória, na primeira vez em que o
vira. Grace não fazia idéia do que Ben Callahan estava fazendo ali,
mas pretendia descobrir. Mas não antes de registrar aquele momento
com sua câmera.
Não o vira durante uma semana e, agora, não pretendia privar-se da
chance de deleitar os olhos com aquela figura espetacular.
Posicionou a câmera, mas naquele exato momento, os jogadores
pararam para um descanso. Para felicidade de Grace, Ben e mais um
jogador permaneceram junto à cesta, banhados pelo sol.
Ele passou a mão pela testa para remover o suor, um gesto
tipicamente masculino, embora nada nele fosse típico. Seu jeito sexy
e forte distinguiam-no do resto do mundo.
Sem perder tempo, Grace registrava em seu filme cada nuance'
daqueles gestos, percebendo que ele falava com os garotos como se
conhecesse sua linguagem, como se fosse aceito. Ora, ela nunca o
vira por ali, antes. Seria conhecido dos moradores da região por
trabalhar ali, ou talvez, por ter parentes por perto?
Embora tentasse encontrar respostas para suas perguntas, Grace
continuou a fotografar e, à medida que o fazia, seu corpo reagia com
intensidade a cada movimento de Ben, a cada contração de seus
músculos potentes, às manchas de suor que tomavam conta da
camiseta cinza, das mudanças de expressão que se sucediam em seu
rosto. Até que sua própria blusa aderiu à pele molhada, e uma fina
camada de suor cobriu sua testa. Foi então que Grace abaixou a
câmera e respirou fundo.
Durante muito tempo procurara pela verdadeira mulher que se
escondia atrás da delicada e cortês criatura educada pelo juiz e por
sua bem-educada esposa. Agora, sabia que era pura sensualidade
que havia dentro dela, apenas esperando ser libertada. E Ben era o
homem que a conduziria naquela próxima etapa de sua viagem de
auto-descoberta.
Tudo o que ele a fazia sentir era honesto e real, oposto ao mundo
artificial no qual ela havia crescido, um mundo onde as pessoas
escondiam seus sentimentos, casavam-se por conveniência, pouco se
importavam com os filhos e, pior que tudo, reprimiam sua
sexualidade. Exceto quando traíam seus parceiros. Com exceção de
seu irmão, Logan, que desafiara a tradição política da família e se
casara por amor, o mundo dos Montgomery era totalmente falso.
Ao contrário do mundo real em que Ben vivia.
Grace imaginou a força e a beleza contidas nas fotos que acabara de
tirar, e que fariam parte de seu álbum pessoal.
Voltou a olhar para Ben que, com as mãos nos ombros do garoto,
parecia explicar os detalhes do jogo. Não eram muitos os homens
que se dispunham a trabalhar com as crianças daquele bairro,
crianças que precisavam de orientação. Grace admirou, não só o
físico de Ben, mas também a bondade óbvia que ele possuía.
Atravessou o portão e aproximou-se dele.
— Olá, vizinho.
— Grace?
Ele se virou para fitá-la, com surpresa na voz e incredulidade no
olhar.
— Em carne e osso — ela confirmou, entrando na quadra. Ben atirou
a bola para o garoto, dizendo:
— Pratique aquela jogada. Voltarei em um minuto. — Voltando a
encarar Grace, perguntou: — O que está fazendo aqui?
Ora, ele parecia zangado. Grace ergueu uma sobrancelha.
— Ah, eu vou bem, obrigada. E posso lhe fazer a mesma pergunta.
Acontece que estou sempre por aqui. E você?
— Para que a câmera? — ele indagou, sem se dar ao trabalho de
responder.
— Estou trabalhando. Qual é a sua desculpa? Desculpe o que vou
dizer, mas acho uma grande coincidência nós dois estarmos no
mesmo lugar... tão longe de casa.
— Não precisa ficar irritada, Gracie — Ben murmurou com voz suave,
e Grace quase derreteu no meio da quadra de basquete. — Só fiquei
preocupado por encontrá-la em um bairro como este.
— Bem, admito que não é o melhor dos lugares, mas as pessoas que
vivem aqui são reais. E merecem os mesmos pequenos prazeres que
o resto de nós encontra na vida. — Agitou a câmera. — Estas fotos
ajudam a arrecadar fundos para ajudar as crianças deste bairro, e as
mães adoram vê-las. Fotos de seus filhos é o mínimo que posso dar
a elas.
Ben deu um passo adiante.
— Por que isso? Por acaso, teve uma vida mais privilegiada do que a
maioria?
— Como sabe? — Grace inquiriu, desconfiada.
Afinal haviam se encontrado uma única vez, e ela não fizera qualquer
revelação sobre sua família. A decoração de seu apartamento
transpirava dinheiro, claro, mas o tom de voz de Ben carregava a
certeza de quem a conhecia muito bem.
Ele segurou seu queixo, provocando novas ondas de calor que
varreram seu corpo.
— Em primeiro lugar, seu jeito de falar é muito delator; Em segundo,
esses traços delicados falam por si mesmos.
Ora, então, ele havia percebido, desde o primeiro dia. Mas, para Ben,
ela não queria ser a mocinha rica e mimada. Queria ser apenas
Grace. E acreditava ainda ter uma chance.
Respirou fundo e arrependeu-se no mesmo instante, pois o perfume
de Ben invadiu-lhe as narinas, aumentando ainda mais aquela
sensação de calor que nada tinha a ver com o sol que iluminava o
dia.
— O que o torna tão bom no julgamento das pessoas? — indagou.
— Na minha profissão, ser um bom observador é fundamental.
— O que você faz?
— Sou investigador particular.
Grace ficou surpresa, mas a idéia a agradou.
— É o que está fazendo aqui? Trabalhando em uma investigação?
Olhou por cima do ombro para o garoto com quem Ben estivera
falando. Esperava que o menino não fosse o objeto de uma inves-
tigação que fosse lhe causar problemas. Drogas, comércio ilegal de
mercadorias falsificadas... Grace via muitas crianças em perigo é
esperava que o dinheiro da Chances pudesse ajudá-los. Aquele
trabalho não só abriria as portas para a sua carreira, mas também
diminuiria o seu sentimento de culpa por ter tanto, quando tantos
viviam com tão pouco.
— Ora, Grace, está fugindo da minha pergunta sobre a sua vida
privilegiada?
Ela sorriu. Aparentemente, com o interesse mútuo tornando-se cada
vez maior, nenhum dos dois pretendia dar sem receber.
— Não, sr. Investigador Particular. Estou apenas estabelecendo as
regras do jogo. Você responde à minha pergunta, eu respondo à sua.
— Eu não sabia que isso era um jogo, mas vou participar. Como sou
novo no edifício, perguntei ao síndico que regiões deveria evitar, e
ele mencionou este bairro. Alta criminalidade, tráfico de drogas...
crianças carentes. — Apontou para o jogo de basquete que
recomeçava. — E aqui estou eu.
Grace descobrira o lugar da mesma forma, mas era uma moradora
permanente. Ben era um vizinho temporário, o que tornava sua
atitude ainda mais generosa.
Mais uma vez, perguntou-se o que haveria por trás da presença dele
ali.
— Ora, Ben, não me ocorreu que você possuísse uma inclinação
altruísta.
Ele riu.
— Não costumo espalhar isso por aí, mas cresci em um lugar como
este. Sempre que conheço um bairro novo, gosto de rever minhas
raízes. Assim como você, também dou algo em troca.
Grace sentiu um aperto no peito. O homem de seus sonhos não era
só sexy, mas também tinha coração.
— Agora, é minha vez. Sua vida é ou não é mais privilegiada do que
a da maioria? É por isso que sente necessidade de andar por aqui
sem proteção?
Foi a vez de Grace rir.
— Não acho que preciso de proteção. Quem se importaria em mexer
comigo?
— Não se subestime, Grace.
Ela estremeceu, dando-se conta de que ele tocara seu ponto mais
fraco. Embora não pretendesse insinuar que era desinteressante,
esse era, de fato, o maior medo de Grace: que seu valor estivesse
apenas no dinheiro que possuía e no nome que carregava.
— O que eu quis dizer é que ninguém olharia para mim duas vezes.
Veja, estou vestindo trapos! — Apontou para a calça jeans surrada e
a camiseta suja de tinta. — Nada de maquiagem, ou jóias, que
possam atrair atenção.
Deu de ombros, na esperança de ter conseguido disfarçar qualquer
indício da insegurança que não queria revelar.
— Apenas uma câmera fotográfica caríssima e, como já disse, seus
traços delicados.
Ao dizer isso, Ben deslizou a ponta dos dedos pelo rosto de Grace.
Foi um gesto suave, mas carregado de eletricidade.
— Sou perfeitamente capaz de cuidar de mim mesma.
— Sei que acredita nisso, mas...
— Eu sei disso! — ela o interrompeu, segurando-lhe a mão.
Subitamente, foi tomada pelo forte desejo de sentir o calor daquela
mão sobre seus seios. Com esforço, conseguiu recuperar a voz.
— Agradeço a preocupação, mas preciso ir andando. Quero tirar
algumas fotos, antes de ter de voltar ao trabalho.
— Ainda me deve algumas respostas, Gracie.
Ela riu, grata pela distância que se fizera entre eles.
— Tudo bem. Não vou muito longe.
Antes que ele pudesse dizer qualquer coisa, Grace virou-se e foi para
o playground. Ben podia não saber, mas ela não estava brincando.
Ele era a chave para o seu auto-conhecimento sensual, e ela
pretendia chegar muito, muito perto dele... em breve.
Ben sacudiu a cabeça, observando os quadris dela ondularem
graciosamente no jeans apertado. O nome dela era perfeito, ele
pensou. O que já era motivo de sobra para "Grace" não perambular
por aquelas redondezas.
Detestava estar de volta a uma réplica exata de sua infância. Na
infância pobre, as quadras de basquete haviam sido o seu refúgio.
Quanto mais golpeava a bola, mais se convencia de que podia
esquecer que, mais tarde, teria de voltar para o apartamento
deserto. Sem pai, a mãe sempre trabalhando demais, e os vizinhos
gritando uns com os outros.
Pensou nos garotos que conhecera naquela manhã, quando fora até
ali para esperar por Grace. Se pudesse conseguir que um deles,
Leon, mantivesse a atenção no jogo, em vez das ruas, o menino
poderia conseguir uma bolsa de estudos e sair das favelas. O tempo
de Ben seria bem aproveitado, naquela vizinhança. Além disso,
ajudar os garotos seria uma distração de Grace, que ainda não lhe
dera um bom motivo para perambular por um lugar como aquele.
Ben admirava seu desejo de ajudar a quem precisava, respeitava
seus esforços, mas detestaria ver tão boas intenções serem
recompensadas com problemas.
Por que se importava tanto? Ben soltou um gemido baixo. Aquilo era
exatamente o que ele não queria: envolver-se na vida dela. Seu
trabalho era descobrir os- fatos para a sua cliente, mas ele começava
a pensar demais em Grace, usando palavras como respeito e
admiração com freqüência indesejável.
De nada adiantaria negar que começava a se importar de verdade
com Grace, O que colocava seu coração em risco e não o agradava.
Seria melhor concentrar-se nos fatos: conseguira as respostas
pedidas por Emma em tempo recorde. Sabia qual era a ocupação de
Grace e como ela ocupava seu tempo livre. Era evidente que ela
estava feliz, como a avó desejava. Se sua escolha de locais não era
das melhores... Bem, Grace era uma mulher adulta e inteligente,
capaz de se cuidar.
Distância, repetiu para si mesmo, e voltou ao jogo. Leon atirou-lhe a
bola e Ben começou a jogar. A palavra "distância" ecoava em sua
mente, cada vez que a bola atingia o chão. Quando se lançava para a
cesta, ouviu um grito feminino.
Sentiu um aperto no peito e, esquecendo bola, correu na direção da
voz de Grace. Ela estava deitada no chão, para onde fora evi-
dentemente empurrada. Um garoto alto tentava arrancar a câmera
de seu pescoço, enquanto ela se recusava a soltar seu precioso
instrumento de trabalho.
Ao ouvir o grito de Ben, o garoto soltou a câmera e saiu correndo.
Em vez de persegui-lo, Ben preferiu socorrer Grace.
— Você está bem?
— Estou bem, desde que você não diga: "Eu avisei"! — ela
respondeu com um sorriso forçado.
— Não preciso dizer nada. Você já disse por mim. Estendendo a mão,
Ben ajudou-a a se levantar. Percebendo a expressão de dor no rosto
dela, examinou-lhe a palma das mãos. Estava coberta por arranhões.
— Nada que um bom antisséptico não resolva — ela declarou.
— Concordo.
Apesar da voz calma, Ben tremia por dentro. A idéia do que poderia
ter acontecido se ele não estivesse por perto, para socorrê-la era
aterrorizante.
Grace passou as mãos pelos olhos, disfarçando as lágrimas. Ah,
então, não era tão corajosa quanto tentava parecer. Ótimo! Assim,
ele não teria de se preocupar com a possibilidade de ela voltar ali,
depois que ele se fosse. Uma pontada de pesar atingiu-o diante de
tal pensamento.
— Você não ia entregar a câmera, ia?
— É claro que não! Essa câmera custou uma fortuna e eu não
poderia comprar outra. Além disso, ele não tem o direito de pegar o
que não lhe pertence.
Ben riu diante da declaração inocente.
— E como você pretendia impedi-lo de roubá-la?
— Se ele conseguisse tirar a câmera de mim, eu o derrubaria com
meus pés, no instante seguinte. Mas você me poupou da luta. Além
do mais, fiquei agarrada na câmera, não fiquei?
Ela parecia orgulhosa de si mesma.
— Ele poderia ter quebrado o seu pescoço.
— Mas não quebrou. Veja — ela disse, afastando os cabelos para o
lado e exibindo a pele clara.
Ben não se deixou enganar e, puxando a tira que mantinha a câmera
pendurada no pescoço de Grace, descobriu os ferimentos.
— Seu pescoço não está em melhores condições que suas mãos,
Gracie. Já pensou em fazer um curso de defesa pessoal?
— Ainda não tive tempo, mas farei isso... logo.
Evidentemente, ela mentira para a avó sobre as aulas de defesa
pessoal. Que outras mentiras ela teria contado à avó, e o que mais
estava fazendo naquele bairro?
— Obrigada pela ajuda, Ben — Grace murmurou, subitamente
trêmula e abatida.
Então, de maneira inesperada, virou-se e começou a se afastar.
Embora soubesse estar cometendo um erro, Ben alcançou-a com
duas passadas largas e, enfiando as mãos nos bolsos, acompanhou-
a. Queria estar ao lado dela quando o choque, que não demoraria a
chegar, a atingisse.
— Para onde vai? — perguntou.
— Para o metro.
Ele sacudiu a cabeça. Nas primeiras vezes em que a seguira,
misturara-se à multidão, observando-a de uma distância discreta.
Naquela manhã, determinado a fazer com que tudo parecesse coin-
cidência, fora de carro.
— O metro não é seguro.
Grace parou e virou-se para fitá-lo com determinação.
— Tem sido seguro, desde que comecei a vir aqui.
— Assim como o bairro, até hoje. Deixe-me levá-la para casa; Meu
carro está na esquina.
— Não, obrigada, posso ir sozinha — ela recusou a oferta, embora se
mostrasse grata.
— Sei que pode, mas não há nada de errado em aceitar ajuda, de
vez em quando.
Grace sorriu.
— Eu sei.
— Então, aceite a minha ajuda, agora. Prometo deixar que me chute,
mais tarde.
E Ben esperava, de todo coração, que ela o fizesse, pois não sabia se
seria capaz de se afastar por si mesmo.
CAPÍTULO III
Ela entregou as chaves para que Ben abrisse a porta de seu
apartamento. Além de se sentir exausta, suas mãos doíam demais.
Ainda não estava em condições de pensar no que havia acontecido e,
menos ainda, na ameaça que o ladrão fizera, antes que Ben o
assustasse.
Fique longe deste bairro, ou então...
Endireitou os ombros, dizendo a si mesma que não se deixaria
intimidar por ameaças. Vinha de uma família de gente forte que fazia
o que queria e, embora houvesse se rebelado contra eles dessa vez
seria útil tirar proveito daquela qualidade. Isso, depois que houvesse
cuidado dos arranhões nas mãos e se livrado de Ben. A presença
dele tornava difícil não se deixar amparar, não sucumbir à tentação e
perder a pouca independência que começara a conquistar.
Quando Ben abriu a porta, Grace entrou. Embora ele estivesse
despenteado e vestindo roupas suadas, era o homem mais desejável
que ela já vira.
Ora, que a independência fosse para o inferno! Ben tinha razão. Não
faria mal algum aceitar a ajuda dele, o que não seria nem um pouco
desagradável.
— Deixe as chaves e a câmera na prateleira — disse, apontando para
o aparador de vidro.
— Precisa cuidar de suas mãos — ele lembrou. — Onde está o anti-
séptico?
Ter alguém para cuidar dela era uma experiência nova para Grace.
Exceto pela avó, ninguém na família a fizera sentir-se amada pelo
que era. A mãe tentara, mas graças às pressões do pai, não
conseguira. Com exceção de Logan, nenhum homem da família
jamais se importara com ela. Na verdade, o pai, com suas exigências
e padrões impossíveis, diminuíra sua auto-estima e a tornara muito
insegura.
Ben, porém, mantivera um braço protetor em torno de seus ombros,
até chegarem no carro. E, depois de vê-lo com os garotos no parque
e de ser o objeto de sua genuína preocupação, sabia que não era
somente o sexo que a atraía para ele.
Ergueu os olhos e descobriu que Ben a fitava. Foi invadida por uma
torrente de emoções, nenhuma delas platônica.
— Grace, o anti-séptico?
— Na cozinha, no armário ao lado do microondas.
Ben foi até lá e voltou com o anti-séptico, pomada antibiótica e
bandagens. As últimas eram infantis, estampadas com personagens
de desenhos animados. Empunhando a caixa, Ben ergueu uma
sobrancelha.
Grace corou até a raiz dos cabelos.
— Achei que deveria ter esse tipo de coisa em casa, para um caso de
necessidade, mas quando fui à farmácia, só encontrei desses.
Ben riu. Suas feições suavizaram e uma linda covinha apareceu na
face direita. Grace ergueu a mão c tocou-a com a ponta de um dedo.
Ele respirou fundo e ela retirou a mão depressa.
— Não brinque com fogo, Gracie. A menos que queira...
— Me queimar? — ela completou, sustentando-lhe o olhar. — Devo
admitir que a idéia me agrada. Sempre tive de ser a boa menina.
Nunca atravessei a rua sem a companhia de um adulto, nem brinquei
com fósforos. Estou cansada de ser boazinha. Quero brincar com
fogo.
Na verdade, queria brincar com Ben. Nunca fora tão atrevida antes,
mas algo nele fazia com que se sentisse livre para ser ela mesma. E
era bom.
Ele pousou as mãos em seus quadris e, antes que ela se desse conta
do que pretendia fazer, ergueu-a e acomodou-a no balcão da
Cozinha.
— Primeiro, vamos cuidar das suas mãos e do seu pescoço.
Grace sorriu, decidindo deixar que ele cuidasse de seus ferimentos,
primeiro. Teria tempo e oportunidade para interrogá-lo mais sobre
quem era e de onde vinha. A atração que havia entre eles não se
dissiparia tão facilmente.
— Vire as mãos — ele instruiu, precisando desesperadamente de
uma distração, antes que sucumbisse à proposta inocente, porém
tentadora de Grace.
Ela obedeceu e, depois de lavar as mãos, Ben embebeu um chumaço
de algodão no anti-séptico e pôs-se a limpar os arranhões.
— Você é bom nisso. Tem bastante prática?
Ben reconheceu a tentativa de Grace em se distrair da dor, mas
também reconheceu a tática feminina para extrair informações.
Mesmo assim, respondeu:
— Não tenho irmãos mais jovens, se é o que quer saber. Enquanto
aplicava a pomada sobre os ferimentos foi tomado
pelo impulso de levar as mãos dela aos lábios e beijá-las. Em
seguida, tal impulso transformou-se no forte desejo de tomá-la nos
braços e protegê-la contra tudo e contra todos.
— Filhos? — Grace persistiu.
— Ora, Gracie, se quer saber alguma coisa, pergunte diretamente.
Ela exibiu um sorriso embaraçado.
— Acho que você me pegou!
Ben riu.
— Digamos que suas habilidades de investigadora deixam muito a
desejar.
— Nesse caso, acho ótimo que você seja a pessoa certa para me
ensinar. A menos que exista uma esposa, filhos ou namorada que
seu não saiba.
Um misto de curiosidade e esperança iluminaram os lindos olhos
castanhos.
— Não há esposa, filhos ou namoradas, e nem ex-esposas com
filhos. Mas eu me referia a maneiras mais discretas de obter in-
formação. — Cobriu os ferimentos da melhor maneira possível com
as ridículas bandagens infantis. — Irei até a farmácia, mais tarde, e
comprarei algo melhor — prometeu.
Grace examinou as próprias mãos.
— Não precisa sair só para isso. Conseguirei conviver com esses
bonequinhos, até amanhã.
Ben ignorou o protesto, pois uma ida à farmácia o ajudaria a se
afastar de Grace. Recusou a ouvir a voz diabólica que ecoava em sua
mente, lembrando-o de outros produtos que poderiam ser
comprados na farmácia, para um caso de necessidade.
— Muito bem — disse. — Agora, vamos cuidar do seu pescoço. —
Diante da careta de dor que Grace exibiu ao imaginar o que sentiria,
tranquilizou-a: — Creio que podemos esquecer o anti-séptico e usar
somente a pomada.
Ela respirou aliviada.
— Boa idéia.
— Deixe-me ver.
Ao mesmo tempo em que afastava os cabelos do pescoço, Grace
abriu espaço para que Ben pudesse ver os ferimentos feitos pela tira
da câmera: afastou as pernas e permitiu que ele se aproximasse.
Envolto pelo calor e perfume femininos, Ben deu-se conta de que
estava encurralado.
Cobriu a ponta dos dedos com a pomada e tocou o pescoço dela de
leve. Um tremor sacudiu o corpo de Grace, que fechou as pernas de
repente, tornando-o prisioneiro. Então, foi a vez de Ben estremecer.
Ele teve de limpar a garganta para conseguir falar, mas mesmo
assim, sua voz soou tensa e rouca.
— Acha que podemos dispensar as bandagens, também?
Grace virou-se. Pouco milímetros separaram seus lábios. A razão
ordenou a Ben que se afastasse. O corpo recusou-se a obedecer. Ele
abriu a boca para falar, para impedir o inevitável, mas ela se
aproveitou daquele momento de indecisão e colou os lábios nos dele.
Quentes, doces, exigentes, generosos... Sensações embriagantes to-
maram conta de Ben, ao mesmo tempo em que Grace aprofundava o
beijo e, ignorando os ferimentos nas mãos, apertava-o contra si.
Incapaz de se agarrar ao bom senso, Ben retribuiu o beijo com
paixão. Ao ouvi-la gemer, enroscou os dedos nos cabelos sedosos,
deleitando-se com sua maciez.
Restava-se um fio de sanidade, aquela parte de sua mente que sabia
ser melhor parar imediatamente, antes que a situação fugisse ao
controle. Assim, Ben segurou os punhos de Grace com firmeza.
Ela inclinou a cabeça para trás, fitando-o com olhos embaçados pelo
desejo. Então, o telefone tocou, e Ben aproveitou o momento para
tentar se afastar, mas viu-se prisioneiro das pernas longas e bem
torneadas,
— Deixe a secretária eletrônica atender — Grace murmurou, sem
desviar o olhar do dele.
Três toques depois, Bcn ouviu a voz suave de Grace dando
instruções para a gravação de mensagens. Em seguida, ouviu o bip e
uma voz muito familiar.
— Olá, Grace. Já faz tempo que não ouço a sua voz. Quero saber
como está se saindo nessa cidade grande e solitária. Conheceu
alguém interessante? Sabe que eu adoraria que me desse um
bisneto, antes que eu morra. E, se estou pedindo demais, que tal
algumas notícias sobre como vai a sua vida? Afinal, a mulher que
criou você deveria...
Um bip pôs fim à voz de Emma, indicando que ela ultrapassara o
limite de tempo.
Ben tinha um palpite de que ela ainda estaria tagarelando, se a
secretária não houvesse resolvido o problema. Com esforço, reprimiu
um misto de risada e gemido. Supostamente, não conhecia a avó de
Grace, assim como, supostamente, não deveria estar beijando a neta
de Emma.
As mãos que envolviam sua cintura relaxaram e, aproveitando a
oportunidade, Ben recuou para terreno seguro, longe dos joelhos de
Grace.
Ela apontou para o telefone.
— Sinto muito — murmurou com voz ofegante. — Emma, minha avó,
sempre adivinha os melhores momentos para interferir, mesmo
estando tão longe.
— Ela parece ser encantadora.
— E é! Mas é adorável e se preocupa comigo.
— O que ela ia dizendo sobre ter criado você?
— Ela sempre foi o único adulto da casa a se importar comigo e com
meu irmão, com o que sentíamos, e não com a aparência que
exibíamos para o mundo. Eu a adoro — Grace acrescentou, afetuosa.
O relacionamento de Grace e Emma parecia semelhante ao de Ben
com sua mãe. Por isso, foi fácil compreender o sentimento forte que
as uniam.
— Se foi assim, você teve sorte por tê-la por perto. Grace riu.
— Não acredito que esteja mesmo sentindo isso, agora. Levando em
conta que Emma o trouxera de volta à realidade, lembrando-o de
qual deveria ser o seu trabalho e de como deveria ser a sua relação
com Grace, Ben sentia-se profundamente grato àquele telefonema.
— Ela tem razão para se preocupar, não acha? — voltou a focalizar a
conversa na avó.
— Até hoje, não tinha — Grace retrucou, desviando os olhos. Ben
não se deixou enganar pelo tom casual. O ataque daquela tarde a
perturbara um bocado e, por isso mesmo, ela decidira liberar o
excesso de adrenalina naquele beijo estonteante.
— Por que não faz visitas regulares a ela, para tranqüilizá-la? — Ben
persistiu, embora não o agradasse mentir para Grace.
— Ela mora em Boston.
— Ah, então, você é da Nova Inglaterra, o que explica o sotaque.
— Nasci e fui criada em Hampshire, Massachusetts, mas não quero
falar de mim.
— Sobre o que quer falar, então? Espero que não seja sobre aquele
beijo, pois ele não deveria ter acontecido.
A honestidade seria a única maneira de evitar que o incidente se
repetisse.
— E mesmo? — Grace indagou, cruzando os braços. — Importa-se de
me dizer por quê?
— Eu me aproveitei dos seus ferimentos. Um sorriso maroto curvou
os lábios dela.
— Na minha opinião, fui eu quem se aproveitou de você. Mas, em
vez de perder tempo com essa conversa, talvez seja melhor eu dizer
sobre o que quero conversar. Quero falar de você.
Com isso, apoiou-se nas mãos e saltou do balcão, mas gemeu alto.
— Você está bem? — Ben perguntou, preocupado.
— Sim, mas terei de me lembrar de poupar as mãos, por uns dias.
— Bem, pelo menos, terá o fim de semana para se recuperar. A
menos que tenha algum compromisso.
— Trabalho em um estúdio fotográfico, mas estou de folga neste
sábado e eles fecham no domingo. Aliás, preciso telefonar e explicar
por que não voltei do almoço.
— Faça isso — Ben sugeriu, aliviado.
Não teria de vigiá-la durante os dois dias seguintes, pois ela ficaria
em casa.
— Meu patrão foi muito compreensivo — Grace declarou, ao desligar
o telefone. — Vou descansar, hoje, mas estou trabalhando em um
outro projeto e, por isso, não posso ficar em casa, com pena de mim
mesma, só por causa de uns arranhões.
Apesar de curioso, Ben ficou mais preocupado.
— Não está planejando voltar ao parque, está?
Ela endireitou os ombros e empinou o queixo. O que não era bom
sinal.
— Algum motivo para eu não voltar lá?
— Nenhum, além do óbvio, é claro.
— Nenhum trombadinha vai me fazer acovardar. Não sou uma
fracote e me recuso a ceder a ameaças.
— Ameaças? Que ameaças? Por que não me contou?
Grace abriu a boca, mas voltou a fechá-la com determinação.
Aparentemente, acabara de decidir não revelar qualquer coisa que
ele não soubesse.
— Grace?
Ela mordeu o lábio, o mesmo lábio que estivera colado ao de Ben,
minutos antes. Reprimindo um gemido de agonia, ele tratou de se
concentrar no que era importante: a segurança dela.
— Mais uma vez, você está mudando de assunto — ela apontou. —E
você está fazendo o mesmo.
— Mas estamos falando de você — Grace retrucou com um sorriso.
Ben sacudiu a cabeça, irritado. Emma tinha razão. Grace precisava
de um protetor. Gostando ou não, ele teria de ficar por perto, ao
menos até saber mais sobre as tais ameaças e o que havia por trás
da suposta tentativa de assalto. Começava a lhe parecer que o
incidente não fora casual.
— Muito bem — concordou. — Pode perguntar tudo. Sou um livro
aberto.
— Ótimo. Gostaria de saber por quanto tempo você vai morar no
apartamento em frente ao meu.
— Eu responderia sem pensar, se você não parecesse ter segundas
intenções. Portanto, abra o jogo, Gracie.
Ela se aproximou, até que Ben pudesse sentir seu perfume e o calor
de seu corpo. Então, sussurrou:
— Só quero saber de quanto tempo disponho para seduzi-lo.
Seduzi-lo. Grace pronunciara as palavras com tamanha certeza que,
vinte e quatro horas depois, Ben ainda estava excitado. O problema
era que ele não acreditava que seria capaz de reagir a um ataque
sensual. O que, com toda certeza, aconteceria. Agora, Grace sabia
que teria três semanas para agir.
Depois daquela declaração, Ben respondera à pergunta e batera em
retirada. No entanto, a risada suave de Grace, um som delicioso que
o seguira até o corredor, deixara claro que ela não considerava o
desfecho como sendo uma derrota.
No que tinha razão.
Se Ben se sentisse atraído apenas fisicamente, seria fácil lidar com a
situação, mas estava diante de uma mulher bonita e sensual, a quem
ele respeitava e admirava. Abandonar a família, assim como seu
fundo de pensão, passar os dias no parque, fazendo um trabalho
social sobre o qual ele ainda precisava obter maiores informações,
era, de fato admirável. Grace era generosa, gentil e corajosa. E,
embora houvesse conseguido se afastar na noite anterior, Ben não
sabia se conseguiria fazer o mesmo, de novo.
O que Grace não sabia, nem compreendia, eram os seus motivos
para tal afastamento. E, mais cedo ou mais tarde, ela perguntaria.
Então, Ben não poderia dar uma resposta simples, sem revelar que
estava sendo pago para investigá-la. O sigilo de Emma tinha de ser
colocado acima de seus sentimentos.
Por outro lado, era fácil imaginar a ira que tomaria conta de Grace,
se ela descobrisse que fora enganada. Sentia-se culpado demais, e
culpa era algo que ele nunca sentira com relação a qualquer objeto
de suas investigações. Outro sinal de que estava mais envolvido do
que deveria.
Arrastou a mangueira para fora do edifício, até onde seu velho
Mustang estava estacionado. Felizmente, conseguira a autorização
do síndico para lavar o carro ali mesmo. Precisava da distração muito
mais do que seu carro precisava de uma lavagem.
Quando começou a molhar o carro, foi tomado pela desagradável
sensação de estar sendo observado. Afastou a sensação no mesmo
instante, pois estava no pátio do edifício e seria impossível que
alguém o estivesse vigiando. No entanto, a sensação continuou a
incomodá-lo, tornando-se cada vez mais intensa.
CAPÍTULO IV
Grace abaixou a câmera e colocou-a sobre a penteadeira. Uma fina
camada de suor cobria sua testa e o sangue fervia em suas veias,
resultado de ter observado Ben durante alguns minutos e de sua
preocupação com o dia que começava. Espreguiçou-se e sentiu os
músculos doloridos pela luta com o assaltante, na véspera. Sentindo-
se estremecer, disse a si mesma que teria de ser corajosa.
Não poderia viver com medo de andar por Nova York, nem poderia
evitar o bairro onde fizera amizades e encontrara a fonte de fotos
perfeitas para os folhetos da Chances. Ao mesmo tempo, precisava
enfrentar o problema que tinha, e não procurar por outros. Por isso,
voltaria ao parque sem a câmera. E sozinha.
Quando deixou o edifício, o carro de Ben estava coberto de espuma.
Grace poderia passar por ele com passos rápidos e um aceno. Ele
não poderia fazer nada para impedi-la. No entanto, bastou um olhar
para que ela perdesse boa parte de sua determinação.
Ben havia tirado a camisa e a primeira coisa que Grace viu foram as
costas largas e bronzeadas, os músculos movendo-se a cada vez que
ele esfregava o automóvel com um pano macio. Por mais que
desejasse, ela se descobriu incapaz de se afastar.
Havia um mistério por trás da fachada de "durão". Investigador
particular... Uma profissão interessante para um homem interes-
sante, a quem Grace admirava por voltar a um bairro de baixa
renda, parecido ao que ele conhecera quando criança. Ninguém
melhor do que Grace para saber como era difícil voltar às origens.
Aproximou-se dele por trás e disse:
— Trabalhando duro?
Ben virou-se.
— Não chamo isso de trabalhar. Sinto-me grato pelo dia de folga.
— Sei exatamente como se sente.
— Aonde vai?
Determinada a não discutir, nem ceder às preocupações dele, Grace
respondeu com um sorriso radiante:
— A nenhum lugar com o qual você deva se preocupar. — Deu a
volta no carro, examinando a lataria. — Você é bom nisso. Já limpou
o interior?
— Ainda não.
— Então, deixe-me ajudá-lo — ofereceu, arregaçando as mangas.
— Como estão as suas mãos? — Ben indagou, segurando uma dela
para inspeção.
— Pernalonga está cuidando delas.
Parecendo não se dar conta do que fazia, Ben continuou segurar a
mão de Grace, que foi tomada por uma torrente de sensações
escaldantes. Sabendo que suas oportunidades se ser uma menina
má se reduziam a três semanas, não poderia perder tempo. Assim,
esfregou o polegar de leve na mão dele.
Com um sobressalto, Ben retirou a mão e voltou a se concentrar no
carro.
— Pode me ajudar, desde que tenha certeza de que não vai piorar o
estado de suas mãos.
— Sim, senhor!
Grace abaixou-se e apanhou um pano seco e o limpa-vidros, antes
de entrar no carro. Embora deixasse a porta aberta, foi
instantaneamente envolvida pelo perfume dele. Enquanto esfregava
o pára-brisa, perguntou-se o que faria um homem como Ben perder
aquele controle rígido. Ergueu os olhos e descobriu que ele a
observava, mas ao ser surpreendido, voltou a se concentrar na
lavagem do carro. Grace divertiu-se com á situação. Não era a
primeira vez que o apanhava a fitá-la e, poucos minutos depois,
descobriu que não fora a última.
Quando saiu do carro, disse:
— Está calor, hoje. Embora ainda estejamos na primavera, a
temperatura tem subido muito.
— Perfeito para lavar p carro — Ben declarou.
— Sim, mas já estou toda suada.
Reunindo toda a coragem que possuía, Grace ergueu a bainha da
camiseta e prendeu-a no decote careca. O resultado foi um top,
muito parecido a um biquíni.
— Ah, assim está melhor! — suspirou, abanando-se com as mãos.
Intrigado com tal comentário, Ben saiu de onde estava, deu a volta
no carro e foi observá-la. Seus olhos passearam por toda a extensão
do corpo de Grace, exatamente como ela imaginara que aconteceria.
Então, ele tirou os óculos escuros.
— Para enxergar melhor? — ela indagou com um sorriso maroto. Viu
um músculo, mover-se junto ao maxilar de Ben e teria sido capaz de
apostar que o controle rígido estava por um fio.
— Volte ao trabalho, antes que o síndico revogue minha autorização
para lavar o carro — Ben resmungou.
Missão cumprida, ela pensou, suspirando aliviada. Ser ousada não só
era divertido, mas também muito excitante/Satisfeita, voltou ao
interior do Mustang.
— Fazia muito tempo que eu não tinha a chance de fazer algo assim
— disse. — Quando meu irmão completou dezesseis anos, ganhou
um...
Fechou a boca, furiosa consigo mesma. Falara sem pensar e, agora,
teria de revelar a verdade. Por que todos os fatos de sua infância a
embaraçavam, agora que Ben existia em sua vida? Nem quando
decidira abrir mão de seu fundo de pensão, Grace sentira-se tão
envergonhada de ser quem era. Bem, pensou, a vergonha poderia
ser positiva, pois a ensinaria a ter humildade e a apreciar tudo o que,
agora, tinha de trabalhar para conseguir.
— O que seu irmão ganhou? — Ben indagou, curioso.
— Um Porsche.
— Bom — ele comentou com um assobio baixo.
— E o que a princesa ganhou, quando completou dezesseis anos?
— Princesa? — Grace repetiu com desdém, desejando ser apiedada
como uma mulher de pés no chão.
— Sim, você. A princesa Grace.
Estavam tão próximos, que ela teve de lutar contra o desejo de tocá-
lo, de brincar com o fogo que ele acendia. Mas Grace queria mais do
que um relacionamento físico.
Queria que ele gostasse dela e a respeitasse, assim como ela o
respeitava. Sabia pouco sobre ele, mas já era claro que o caráter de
Ben era admirável. Ele era um cavaleiro de armadura, ajudando os
menos privilegiados e socorrendo donzelas em perigo. Quase riu alto
diante da descrição ridícula, mas não queria ser vista como a
princesa indefesa, presa na torre do castelo.
— E assim que me vê?
Percebendo a decepção na voz dela, Ben sentiu-se um verme por
usar o que sabia ser um ponto fraco nela, em benefício próprio.
— Princesa — repetiu em tom suave. — Não gosta de ser chamada
assim?
Grace ergueu a mão para tocar-lhe a face.
— Se isso me coloca fora do seu alcance, detesto.
— Não foi essa a minha intenção — Ben mentiu.
Usara a palavra "princesa" de propósito, pois tinha de se colocar fora
do alcance dela e, depois de ouvi-la declarar que tinha a intenção de
seduzi-lo, qualquer recurso seria válido.
— Ah, sim, claro — ela murmurou com sarcasmo. — Muito bem.
Como não é a primeira vez que você pergunta, ou faz alusões ao
meu passado, vou lhe contar tudo. Venho de uma família rica da
Nova Inglaterra. É o tipo de clã que segue normas como "não nos
envergonhe", "não traia suas origens". "Nossa tradição política data
do início do século e nunca houve um divórcio na família". Quer
saber por quê?
— Por quê? — Ben indagou, arrependido por tê-la provocado, pois a
dor de Grace era palpável.
— Porque os Montgomery não se divorciam, eles suportam — ela
declarou com amargura. — Há cinco ou seis gerações, os Mont-
gomery fazem o que é esperado deles. Casam-se com as chamadas
"pessoas certas". O resultado é um amontoado de uniões infelizes,
infidelidades, filhos ignorados, mas nada disso importa, desde que as
aparências sejam boas.
Ben permaneceu em silêncio, determinado a não interromper a
explicação que ela parecia precisar colocar para fora.
— Meu irmão, Logan, foi o primeiro a quebrar os padrões, e eu me
orgulho dele. Não por ter traído suas origens, mas por ser feliz.
Quanto mim, estou me esforçando para fazer o mesmo, se bem que
aprendi a arte de ser perfeita em público. Deve ser daí que nasce a
imagem de princesa que você mencionou. Já faz parte de mim e, na
maior parte do tempo, nem me dou conta de como estou me
comportando.
De repente, os ombros de Grace vergarem, como se ao fazer tais
revelações, ela houvesse se livrado de um fardo enorme.
Ben não se deixaria enganar. O fato de Logan haver conquistado a
liberdade não significava que Grace fosse conseguir o mesmo. A
perfeição que ela mencionara era evidente em sua postura, embora
já não tão clara em seus atos. E isso era apenas um dos traços que o
atraíam para ela. Era incrível como o mundo que ele tanto
desdenhava pudera produzir a mulher que ele desejava.
— E não é só isso — ela disse. Ben sacudiu a cabeça.
— Aprecio a sua honestidade, mas não é obrigada a me contar tudo.
— Sou, sim. Faço questão que saiba que todo o dinheiro que
mencionei não faz nenhum bem, quando uma pessoa é infeliz, ou
quando se perde no processo.
Ben conhecia os fatos pelo relato de Emma, mas ouvi-los de Grace
era muito diferente. Sabia que ela acreditava em cada palavra do
que dizia, mas também sabia que, provavelmente, quando ela
finalmente se encontrasse e descobrisse tudo o que queria, voltar
para o dinheiro e para a vida que deixara para trás seria mais fácil do
que ela imaginava.
Porém, naquele momento, esse mundo estava muito distante, e que
Ben via era uma mulher vulnerável, capaz de fazê-lo sentir o que
nunca sentira antes.
O que era mais um motivo para se afastar.
— É melhor voltarmos ao trabalho — sugeriu.
Grace suspirou, mas era evidente que a mudança de assunto a
agradava.
— Alguém já lhe disse que você daria um excelente feitor de
escravos?
Ele riu.
— Posso pensar em coisas piores que um homem pode ser. Como
por exemplo, um mentiroso, pensou. Então, perguntou-se desde
quando fazer o seu trabalho se tornara uma tarefa repugnante.
Durante a hora seguinte, trabalharam juntos, ou melhor, Grace
trabalhou e Ben admirou-a. Mesmo sabendo que cada gesto dela era
calculado para prender a sua atenção, ele ficou fascinado assim
mesmo.
— Chega por hoje — Grace finalmente declarou, saindo do carro,
toda amarrotada e despenteada.
Não se parecia em nada com a imagem de Grace Kelly que Ben
tentara invocar. Grace era tão bonita e charmosa quanto a jovem
princesa de Mônaco fora, mas era real a ponto de fazê-lo esquecer
suas origens, o que só poderia trazer problemas.
— Já terminei — ela disse. — Entre e sinta o cheiro de limpeza.
Então, curvou-se em uma reverência, para que Ben desse uma
olhada no interior do carro. Mas o que ele viu foi um par de seios
redondos, ameaçando saltar para fora do decote da camiseta im-
provisada. Foi com esforço que desviou o olhar e examinou o carro.
— Fez um bom trabalho, Grace — elogiou, em seguida.
— Obrigada.
O sorriso franco dizia que ela estava orgulhosa de seu trabalho e
ainda mais satisfeita com o elogio recebido.
— Quanto tempo faz que ninguém lhe diz que fez algo bem feito?
— Muito tempo. Especialmente alguém de quem... gosto. Ben não
tinha dúvida de que Emma alimentava a auto-estima
da neta o quanto podia, mas nada substituiria o orgulho dos pais.
Pelas insinuações que ouvira, era fácil concluir que o pai de Grace
era incapaz de dar amor aos filhos. Ben tivera sorte. Tanto o pai,
quanto a mãe, haviam lhe dado muito carinho, sempre demons-
trando o seu amor de todas as formas. Aparentemente, Grace não
tivera a mesma sorte.
— Preciso ir — ela murmurou.
— Aonde?
— Ao parque. Mais especificamente, ao playground. Preciso
aproveitar o dia de sol, pois a previsão diz que vai chover, amanhã.
— Certo. Dê-me dez minutos para trocar de roupa e irei com você.
— Não, de jeito nenhum. Preciso ir sozinha. E sei que você
compreende e até mesmo respeita isso. Se puder deixar de lado os
seus instintos de homem das cavernas, e confiar em mim...
— Não posso, Gracie.
Ben gostaria de atender ao pedido, especialmente por saber que era
tão importante para ela. Mas devia satisfações a Emma, em primeiro
lugar, e à sua própria consciência, em segundo. Além disso, desejava
de coração cuidar de Grace.
— Foi o que pensei. Até logo, Ben.
Com isso, Grace virou-se e começou a se afastar. Com um gemido,
Ben lamentou o que estava prestes a fazer, mas ela não lhe deixara
alternativa.
— Grace? — chamou, contando com as boas maneiras que a
forçariam a responder.
E deu certo.
— O que é? — ela indagou, impaciente, — Por favor, entenda, Ben.
Preciso enfrentar os meus medos. E não posso fazer isso
acompanhada por um guarda-costas.
Ela tinha razão, mas ainda assim, ele não poderia deixar que fosse
sozinha.
— Disse que costumava lavar carros com seu irmão?
— Essa conversa tem algum objetivo, senão me atrasar? Ben deu de
ombros.
— Eu só queria lembrá-la dos bons tempos da juventude. Com uma
pontada de remorso, apontou a mangueira para ela e apertou o jato
de água.
Ao sentir o jato gelado no peito, Grace soltou um grito. Então, deu
um pulo, na tentativa de apanhar a mangueira, mas Ben foi mais
rápido. Na luta, a força da água arrancou a mangueira das mãos dele
e a derrubou no chão. Como uma serpente, a mangueira esguichou
água para todos os lados, encharcando os dois.
Grace sabia que deveria estar furiosa, mas não conseguia parar de
rir. Naqueles poucos minutos, sentiu-se jovem e livre, como somente
sentira em suas aventuras com Logan, longe do juiz, de sua mãe e
suas normas sociais imutáveis.
Enquanto torcia a camiseta, declarou:
— Não pense que não sei que fez isso de propósito.
Tendo dominado a mangueira, ele a encarou com olhar divertido.
— Você não me deu escolha.
Então, o sorriso morreu nos lábios dele, ao mesmo tempo em que
seus olhos deixaram os dela e moveram-se para baixo. Seguindo a
direção daquele olhar, Grace descobriu que o sutiã de pura renda
tornara-se inteiramente visível sob camiseta encharcada. Então, uma
brisa agitou o ar, gelando sua pele molhada. Seus mamilos escuros
arrepiaram-se, diante de seus próprios olhos... e dos de Ben. Algo
disse a Grace que o rígido controle dele acabara de se transformar
em fumaça.
E, evidentemente, ela não sentiria a menor falta dele. Havia
conseguido capturar a atenção de Ben, e nada no mundo a faria
cruzar os braços e estragar o momento. Uma menina má jamais
perderia uma oportunidade como essa.
— Todos nós temos escolhas, Ben.
Ambos sabiam que ela se referia mais à eletricidade que os envolvia,
do que à atitude que ele tomara pouco antes. Ben cruzou os braços.
— E vou escolher sair daqui, antes que a situação fuja ao controle.
Com isso, virou-se para o carro, de costas para ela. Mas Grace não
pretendia se render tão facilmente, e agarrou-lhe o braço.
— Do que está fugindo?
Várias pessoas entravam e saíam do edifício.
— Importa-se se discutirmos isso em particular? — Ben perguntou,
fixando os olhos nos seios dela, lembrando-a de que, se ele podia ver
o que via, os outros também veriam.
Recusando-se a permitir que ele a fizesse sentir embaraçada e,
assim, batesse em retirada por ele, Grace empinou o queixo.
— Como quiser — declarou, entrando no carro. No banco de trás.
Ben ficou parado, boquiaberto.
— Vai entrar ou não? Estou parecendo uma idiota aqui, sentada,
sozinha.
O olhar irado deixou claro que ele não estava se divertindo com a
situação.
— Sem problemas — Grace persistiu. — Você pode ir para o seu
apartamento e trocar de roupa. Seguirei para o parque, como
planejei.
Ben estreitou os olhos.
— Vestida assim, você não vai.
— Quer me testar?
Grace não pretendia ir a lugar nenhum naquele estado, exceto ao
seu apartamento, e só se Ben fosse com ela. Más, a menos que ele
cedesse e entrasse no carro para uma conversa mais pessoal e
íntima, ela poderia mudar de idéia.
Furioso, Ben sentou-se ao volante e girou a chave na ignição.
— Para onde vamos?
Ele não respondeu, mas pôs o carro em movimento e foi estacionar
em uma rua sossegada, atrás do edifício.
— Já entendi — ela sorriu. — Privacidade. Talvez eu tenha me
enganado e você não esteja fugindo de mim.
Ben desligou o motor, abriu a porta e saiu do carro, apenas para
voltar a entrar, no banco de trás.
— Muito bem, princesa. Fiz o seu jogo. Conseguiu o que queria.
Estamos sozinhos. E agora, o que vai fazer comigo?
CAPÍTULO V
Grace reconheceu o desafio nas palavras de Ben.
Ele não acreditava que ela fosse capaz de tomar a iniciativa. De fato,
não era do seu feitio, mas se não agisse imediatamente, poderia não
ter outra chance.
Naquele momento, um arrepio percorreu seu corpo, resultado da
roupa molhada.
— Está com frio? — Ben perguntou.
— Sim, mas isso é bom, pois conheço uma maneira infalível de
resolver o problema.
Grace moveu-se rapidamente, colocando-se sobre ele, face a face,
um joelho de cada lado do corpo viril.
Ben respirou fundo, mas não conteve um gemido de prazer.
— Sempre consegue o que quer, princesa? Ela sacudiu a cabeça.
— Boa tentativa, mas não vou cair nessa.
Era evidente que ele tentava distraí-la e criar distância entre eles,
mas não daria certo.
— O que está querendo dizer?
— Que tive uma vida privilegiada, mas raramente consegui o que
realmente queria — Grace declarou com honestidade. — Você, por
outro lado, parece não ter dificuldade em conseguir o que deseja.
— Não foi assim, quando eu era garoto. Minha vida foi muito
diferente da sua.
— Posso imaginar, mas você teve amor? Ben limitou-se a assentir.
— Então, foi muito mais privilegiado do que eu. E devo avisá-lo de
que não tive o que queria, no passado...
— Mas pretende ter agora?
— Exatamente.
Embora a chama que iluminasse os olhos de Ben fosse idêntica
àquela que fazia arderem as entranhas de Grace, em vez de beijá-la,
como ela esperava, ele cerrou os punhos e os dentes.
Grace teria preferido que Ben tomasse a iniciativa, mas ao resistir,
ele estava lhe ensinando como ser ousada.
— Posso fazer isso da maneira mais fácil, ou não. Com a sua
cooperação, ou sem ela. De um jeito ou de outro, vou conseguir o
que nós dois queremos — declarou, pousando as mãos no peito
largo.
O movimento inicial não fora fácil, mas agora, tudo parecia mais
simples. Assim, Grace acariciou-lhe os mamilos com os polegares,
até senti-los rijos sob os dedos. Quando Ben estremeceu, ela se
sentiu tomada pelo mesmo desejo.
As sensações eram todas novas para Grace, além de muito ex-
citantes.
— Antes que eu me torne mais agressiva, você tem de me dizer por
que está resistindo.
Um sorriso curvou os lábios de Ben.
— Está dizendo que é capaz de ser ainda mais agressiva? — Pousou
as mãos nos quadris dela. — Do meu ponto de vista, isso seria
impossível.
Grace baixou os olhos para onde seus corpos se encontravam
praticamente colados.
— Gosta de mulheres dominadoras? — perguntou, satisfeita com a
rapidez com que aprendia.
Antes de responder, Ben deslizou as mãos por debaixo da camiseta
de Grace, parando logo abaixo de seus seios. Ou pretendia assustá-
la, ou proporcionar-lhe alguma sensação ainda mais excitante.
— Mulheres dominadoras me excitam.
Em seguida, acariciou-lhe os mamilos em um gesto suave e breve.
Tentando adivinhar o que ele gostava, Grace projetou os quadris
para a frente, arrancando-lhe um gemido animal. E descobriu que
gostava das mesmas coisas que ele.
— Sou perfeitamente capaz de fazer o seu jogo — declarou,
esperando estar certa sobre isso. — Posso provocá-lo e atormentá-lo
quanto quiser. E é o que vou fazer. Até descobrir por que está
resistindo à atração que sentimos um pelo outro.
— Você não quer muito, quer? — Ben indagou, refletindo que, além
de sua alma, Grace não queria mais nada.
Então, ela começou a mover os quadris, deixando-o atordoado. E
Ben teve de apelar para o que restava de sua razão, para com-
preender a confusão que tomava conta da mente de Grace, bem
como sua necessidade de usar táticas dominadoras. Aliás, era muito
boa nisso. Tão boa que, se Ben não pusesse uni fim àqueles avanços,
logo estaria revelando todos os seus segredos. O que não faria bem
a nenhum dos dois e, ainda, os impediria de ter o que mais
desejavam: um ao outro.
— Quero você, Ben — Grace murmurou, fitando-o nos olhos.
E lá estava a sombra da insegurança, pois embora ela se esforçasse
para agir com ousadia, tudo aquilo era novidade em sua vida.
Sentindo o corpo estremecer pelo esforço de se conter, Ben con-
siderou as implicações das palavras de Grace. Ela o queria, mas não
sabia quem ele era. Queria saber por que ele estava resistindo, mas
Ben não poderia contar a verdade. Assim, optou por uma resposta
segura:
— Não gosto de compromissos.
Bem, até então, não gostara. Nunca tivera uma mulher por mais de
um mês. Entre o trabalho e os cuidados com a mãe doente, Ben não
tinha tempo para se dedicar a qualquer relacionamento. Talvez, a
verdade fosse que nenhuma mulher despertara o seu interesse a
esse ponto.
Grace deu de ombros.
— Já faz muito tempo que não me comprometo com ninguém e,
além disso, não me lembro de ter mencionado compromisso com
você.
Com a ponta de um dedo, percorreu o caminho ao longo do qual os
pêlos negros que cobriam o peito de Ben iam se estreitando até o
umbigo.
Ele engoliu seco.
— Pode não ter mencionado, mas tem direito a isso — Ben
argumentou.
— Creio que devo saber o que quero — Grace corrigiu, desa-
botoando-lhe a calça —, o que preciso — continuou, baixando o zíper
— e o que mereço.
Ben segurou-lhe os punhos com força, enquanto sua mente girava,
tentando avaliar todas as possibilidades. Poderia ceder, permitir que
ambos tivessem o que desejavam e, no final, simplesmente, deixá-
la. Mas sua consciência não lhe permitiria usá-la com egoísmo e,
ainda, mentir para ela.
Poderia enganar a si mesmo, dizendo que ceder lhe traria benefícios
profissionais. Um envolvimento temporário com Grace lhe permitiria
protegê-la. Ela recusaria sua companhia em qualquer circunstância,
mas se fossem um casal, Ben teria a chance de estar ao lado dela,
ao menos, enquanto estivesse trabalhando para Emma. Poderia
descobrir quem fora responsável por aquele ataque, no parque, e por
quê.
Mas, por que mentir? Ben queria protegê-la, independente de seu
trabalho. Quando partisse, algumas semanas depois, gostaria de
saber que Grace estava em segurança. E ceder aos desejos dela,
agora, o ajudaria a ficar perto, durante todo o tempo que teriam
juntos.
— Você merece o melhor — murmurou.
— Então, solte minhas mãos — ela replicou em um sussurro rouco.
Ben obedeceu, mas tinha de tocá-la e, então, soltou os cabelos loiros
que caíram sobre os ombros delicados, emoldurando aquele lindo
rosto.
— Sou todo seu, princesa.
Com isso, reclinou a cabeça no encosto do banco, a fim de observá-
la melhor. As faces de Grace estavam coradas, seus olhos
apresentavam o brilho do desejo e da determinação.
Ela hesitou por um breve instante, mas logo tomou sua decisão. Com
movimentos muito lentos, acabou de baixar o zíper da calça de Ben,
que imaginara saber tudo sobre as preliminares do sexo, mas
começava a constatar que havia se enganado. Pensara ser capaz de
se controlar, mas as manobras deliberadas de Grace o estavam
levando à loucura, como nunca lhe acontecera antes.
— Espero que saiba o que está fazendo — ele murmurou por entre
dentes.
— Está duvidando da minha habilidade?
— Seria uma grande tolice negar o óbvio.
Como se as palavras dele lhe dessem a permissão de que precisava,
Grace deslizou a mão por dentro da calça jeans, arrancando mais um
gemido de Ben.
— Eu só queria ter certeza de que você sabe no que está se
metendo.
— Como você mesmo disse» seria uma grande tolice negar o óbvio.
— Grace iniciou uma exploração minuciosa do novo terreno. — Além
do mais, foi você quem nos trouxe a um beco deserto, atrás do
edifício. Ninguém vai nos ver.
Definitivamente, Grace falava sério. Queria brincar com fogo. E, uma
vez decidido a não recuar, Ben viu o autocontrole abandoná-lo de
vez. Com a ajuda dela, despiu-a da calça jeans e, ao vê-la ajoelhada
no banco, usando apenas a camiseta molhada e uma calcinha
minúscula, assobiou baixinho.
Ela corou até a raiz dos cabelos.
— Devo entender que gosta do que está vendo?
— Você sabe que gosto, só não sabe quanto. Venha cá, Grace.
— Grace? Não sou mais a princesa?
— Quero você, minha vizinha linda e sexy, não algum produto da
minha imaginação. Vai me fazer esperar muito?
Com um brilho de pura felicidade nos olhos, Grace voltou a se
posicionar sobre Ben. A diferença era que, agora, somente uma fina
e minúscula camada de seda separava seus corpos.
— Ah, você é deliciosa!
— Você também não é nada mau.
Ben segurou-lhe o rosto entre as mãos e disse:
— Espero que não se importe se, só desta vez, eu assumir o
comando.
Sem esperar pela resposta, beijou-a com paixão, pois precisava
sentir a maciez daqueles lábios, assim como a promessa do que
ainda viria.
Uma batida na janela assustou-os, e Grace pulou, quase saltando
para longe de Ben. Ele segurou seus quadris com força, mantendo-a
exatamente onde estava. Embora quem quer que estivesse fora do
carro não pudesse vê-la, graças à combinação de vidros embaçados
com o ângulo em que o automóvel fora estacionado, Ben não queria
expô-la ainda mais.
— Vão fazer isso lá dentro! — sugeriu o síndico, com uma
gargalhada.
Tanto Ben quanto Grace reconheceram a voz familiar.
Com um suspiro embaraçado, Grace apanhou a calça. Ben praguejou
baixinho e reclinou a cabeça no encosto do banco. Por mais que
estivesse gostando do que estava acontecendo, não podia negar que
sentia-se grato pela interrupção, pois perdera, definitivamente, o
controle sobre si mesmo.
Grace abriu o chuveiro, perguntando-se se deveria tomar um banho
quente para aquecer a pele gelada, ou frio, para apagar o fogo que
ainda a queimava por dentro. Depois de tentar as duas alternativas,
concluiu que nada a ajudaria e, por isso, terminou o banho e
enrolou-se na toalha.
Seu corpo ainda estava tomado pela torrente de sensações, e
somente Ben poderia mudar tal fato. Infelizmente, ele se refugiara
no próprio apartamento, com a desculpa de precisar de um banho.
Ora, por que não tomarem banho juntos? Seria uma experiência
nova para Grace, que ela adoraria ter com Ben.
Aliás, pensou, havia uma longa lista de experiências que ela gostaria
de ter com ele, mas em sua busca por descobertas sexuais, Grace
estava descobrindo muito mais, tanto sobre si mesma, quanto sobre
Ben.
Ele sabia como proporcionar o carinho e o afeto que ela tanto
desejava encontrar, mas seu tempo juntos era limitado. Um mês,
não mais. Por isso, Grace optara por um envolvimento casual, sem
qualquer compromisso. O que era uma pena, pois Logan e Catherine
adorariam aquele homem charmoso e realista.
Ei! Onde iriam parar seus pensamentos, se continuassem a seguir
esse rumo? Grace repreendeu-se, pois sabia que estava indo longe
demais com suas fantasias. Ben hão tinha a menor intenção de se
tornar parte de sua vida, assim como ela nem sabia se desejaria algo
parecido. Portanto, o melhor seria nem pensar nas possibilidades.
O toque do telefone poupou-a de uma análise mais profunda.
— Alô?
— Finalmente! Faz idéia do que seja tentar encontrá-la?
Grace sorriu.
— Olá, vovó. Desculpe-me por não ter retornado a sua ligação.
Tenho estado muito ocupada com... — A sedução de um homem! —
...o trabalho.
— Ocupada demais para telefonar para sua avó e dizer que está
bem?
— Tem razão. Já pedi desculpas. — Emma suspirou.
— Ora, por essa eu não esperava!
Grace riu.
— Sinto sua falta, vovó.
— Então, venha me visitar.
— Prometo ir... assim que conseguir organizar melhor a minha
agenda.
Assim que Ben sair da minha vida, Grace pensou, vou precisar muito
de sua companhia.
— Vejo que estamos progredindo! Até nossa última conversa, você
não queria sequer considerar a idéia. E não nos vemos desde o
casamento de Logan, há mais de um ano.
— Minha vida está mudando, vovó. Não posso explicar, agora, mas
sinto-me muito melhor com relação a muitas coisas, inclusive eu
mesma.
— Não vejo por que deveria ser diferente. Você é o máximo! Agora,
conte-me o motivo da mudança. Emprego novo?
— Em parte — Grace admitiu.
Ainda não contara à avó os detalhes de sua vida "pós-pensão", pois
queria, antes, ter certeza de que seria capaz de se sustentar.
— Novo namorado?
— Talvez?
A avó resmungou algo incompreensível.
— Muito bem. Continue com a sua rotina silenciosa, mas certifique-
se de que ele a trate muito bem no seu aniversário. E, antes que se
rebele contra mim, não estou me referindo a presentes caros.
Existem muitas coisas que se pode fazer, mesmo tendo um
orçamento apertado. Aliás, ouvi dizer que aqueles sex shops da
cidade grande têm preços bastante razoáveis.
— Vovó!
Apesar de tudo o que fizera com Ben, pouco antes, Grace sentiu um
forte rubor tomar conta de suas faces. Emma riu.
— Quando foi que você e seu irmão se tornaram tão puritanos? Ao
que parece, você não usou os sais de banho e as velas perfumadas
que lhe mandei, no seu último aniversário.
Em vez de responder, Grace soltou uma risada marota. Ela e o irmão
haviam se habituado aos comentários ultrajantes da avó, desde a
adolescência. Era seu pai, o juiz, que jamais compreendera a mãe e
vivia ameaçando interná-la em um asilo. Mas, como Logan e Grace
jamais permitiriam algo assim, ele acabara desistindo. Desde que
Emma não criasse um escândalo em público, o juiz Montgomery
estaria satisfeito.
— Como vão Logan, Cat e a princesinha? — Grace perguntou.
— Perfeitos, é claro. E, como você nunca vem visitá-los, eles estão
pensando em ir até Nova York. Mas, se você está pensando em vir...
— Vamos fazer uma coisa de cada vez, vovó. Preciso desligar, agora.
Amo você.
— Também amo você, minha querida. E, seja quem for esse rapaz,
não banque a moralista puritana com ele. Homens não se excitam
com mulheres assim. Até logo, querida.
Revirando os olhos, Grace desligou. Ao pensar nela e Ben, no banco
de trás do carro, semi-despidos, colados um ao outro, foi sacudida
por um arrepio.
Não, não fora moralista, nem puritana. Ao contrário, fora uma
menina má. E queria ser ainda pior. Era incrível que uma mulher de
mais de oitenta anos estivesse lhe dando conselhos sobre sua vida
sexual. Conselhos que ela já estava seguindo à risca.
Lembrando-se das palavras da avó, Grace sorriu, pois era como se
Emma já conhecesse Ben.
CAPÍTULO VI
Grace era, definitivamente, uma encrenca, Ben pensou. Porém, era
uma encrenca que valia a pena. E aí estava o problema. Ele mal
saíra do banho frio, quando o porteiro interfonara para informá-lo de
que Grace acabara de entrar no elevador. Ben detestava ter de
recorrer àquele tipo de tática, mas ela não lhe deixara alternativa.
Assim, vestiu-se apressado e desceu correndo pela escada.
— Ela foi por ali — o porteiro anunciou com um sorriso largo.
— É bom saber que está se divertindo com a história — Ben
resmungou.
Seguiu-a a uma distância discreta, incapaz de desviar os olhos dos
quadris ondulantes. Esperou na esquina, quando ela entrou na
cafeteria e, assim que a viu desaparecer na estação do metro, fez
sinal para um táxi e foi para o parque.
Como não quisesse confrontá-la, decidira manter-se fora de vista.
Assim, poderia observá-la e a quem quer que tentasse se aproximar.
O fato de Grace não estar levando a câmera deveria fazer com que
ela não fosse um alvo tão claro, mas assim que se aproximou do
parque, os cabelos loiros brilharam e a postura de princesa a fizeram
sobressair-se na multidão.
Sem se dar conta disso, ela entrou no playground e se aproximou de
um grupo de mulheres sentadas em um banco, observando seus
filhos brincarem. Como não houvesse mais lugar no banco, Grace
não hesitou em se sentar no chão, sem se preocupar com a calça
branca que usava.
O que não era de surpreender, Ben pensou. Afinal, eleja sabia que
Grace era o tipo de mulher que se sentia muito mais à vontade
sentada no chão, do que nos luxuosos sofás que ele vira na mansão
Montgomery.
Depois de cumprimentar as mulheres, que a receberam sem
qualquer sinal de reserva, ela esticou as pernas e apoiou-se nos
cotovelos, parecendo totalmente relaxada. Ao contrário de Ben, que
ainda sentia a tensão do desejo a dominar seu corpo.
O grito de uma criança cortou o ar e, sobressaltado, Ben virou-se na
direção de onde viera o som. Viu um garotinho pendurado, de cabeça
para baixo, em uma das barras de ferro do trepa-trepa. No mesmo
instante, uma jovem mãe se levantou, mas Grace segurou-lhe o
braço e foi buscar o menino. Quando o colocou no chão, em vez de
voltar correndo aos brinquedos, o pequeno pulou e agarrou-se ao
pescoço de Grace. Era evidente que já se conheciam, e ela o segurou
no colo por um longo momento, murmurando coisas que Ben não
podia ouvir, mas que provocavam deliciosas gargalhadas do garoto.
Um súbito nó se formou na garganta de Ben, pois ele se lembrou de
incidentes semelhantes em sua própria infância. Aos domingos, o
único dia de folga de sua mãe, os dois iam ao parque para brincar e
almoçar um piquenique preparado por ela. Sua mãe o observava,
ajudava, consolava, como Grace acabara de fazer com aquela
criança. Ora, ela podia não saber, mas seus instintos maternais eram
fortes. Grace estava tão ocupada em fugir da família que,
certamente, ignorava o desejo de ter sua própria família. O mesmo
desejo que Ben possuía, como ele acabara de descobrir.
Definitivamente, aquela mulher representava uma grande ameaça...
à sua vida, à sua sanidade e ao seu coração.
Já vira várias facetas dela: a mulher despenteada, carregando
sacolas de compras, a parceira que o ajudara a lavar o carro sem
queixas, a princesa na torre de marfim e cristal. Mas a Grace
Montgomery com uma criança nos braços era uma ameaça muito
mais perigosa do que a sereia sedutora que o atacara, no banco
traseiro de seu carro.
Sentindo-se como um intruso, Ben virou-se, mas não antes de ver
Grace olhar na sua direção. Não sabia se ela o vira, mas saberia em
breve.
Grace releu o bilhete. Seja esperta. Não volte. Senão... Com mãos
trêmulas, amassou o papel e jogou-o no lixo. Quem quer que
estivesse tentando assustá-la, tivera o desplante de usar uma
criança para fazer sua ameaça. Grace lembrou-se do momento em
que o pequeno Kurt lhe entregara a mensagem de aparência ino-
cente. Fora no mesmo instante em que ela vira Ben.
E era em Ben que sua atenção se concentrava, agora. As ameaças
não deixariam de existir, nem sua necessidade de tirar fotografias.
Mas Grace cuidaria das duas coisas em outra ocasião.
Pensando assim, saiu do edifício. Sabia que não estava jogando
limpo, mas Ben também não jogara limpo quando decidira segui-la.
Não estava zangada como deveria, pois compreendia os motivos
pelos quais ele agira assim.
Ben preocupava-se com a sua segurança, mas não queria tolher sua
liberdade. Assim, em vez de tentar impedi-la de ir ao parque,
mantivera-se distante, para não atrapalhá-la, mas perto o bastante
para que bastasse um grito, caso ela precisasse de ajuda.
Mas, ao receber o bilhete, Grace não gritara por Ben. Ao contrário,
escondera o papel, pois sabia que ele reagiria com exagero, tentando
impedi-la de voltar ao lugar que ela mais amava, onde finalmente
começara a descobrir o seu verdadeiro lugar no mundo.
Mesmo não estando zangada, Grace pretendia ensinar uma lição a
Ben. Assim, depois de mais um banho, desta vez com uso generoso
dos sabonetes e loções que a avó lhe dera, alegando serem afro-
disíacos, Grace vestiu um traje escolhido para deixar Ben sem fôlego
e saiu do apartamento.
De novo! Ben ainda não havia se recuperado da última saída de
Grace, quando o porteiro voltou a interfonar, dizendo que ela estava
saindo novamente. Ele mal podia esperar pela segunda-feira, quando
ela voltaria ao trabalho e aos horários normais.
Repetiu o procedimento de antes e, quando chegou ao saguão, o
porteiro apontou na direção do centro da cidade, como Ben temia.
Saiu atrás dela, perguntando-se o que uma mulher sozinha faria
naquela região da cidade, à noite... especialmente, vestida como
estava.
Respirando fundo ao ver as costas expostas pela blusa diminuta e as
longas pernas descobertas, uma vez que a saia combinava com a
blusa, não só na cor, mas também no tamanho, Ben decidiu que,
onde quer que Grace pretendesse ir, não iria sozinha. E, para o bem
dela, era melhor não estar indo ao encontro de um homem!
Seguiu-a, olhos fixos nas formas espetaculares, a mente ocupada
com fantasias eróticas. Ora, vestida assim, ela só podia ter um
encontro. Bem, fosse como fosse, ninguém se poria entre eles.
Uma vez no vagão do metro, Ben começou a suar, pois não
conseguia parar de pensar nos momentos que haviam partilhado no
banco traseiro do Mustang. O ruído dos freios o despertaram do
devaneio, em tempo de ver Grace sair do vagão e subir a escada que
levava à rua. Mas, para sua surpresa, em vez de seguir para o
parque, ela dobrou a esquina e voltou ao metro, para tomar o trem
que a levaria de volta para casa.
E, no momento em que ela se acomodou em um banco e virou-se
para acenar para ele, Ben soube que fora enganado.
Acenou de volta. O que mais poderia fazer?
Ela sorriu, os lábios pintados de vermelho curvando-se em expressão
divertida. Ben teve vontade de beijar aqueles lábios, mas diante da
brincadeira que ela fizera, dificilmente teria essa oportunidade tão
cedo. Embora soubesse que deveria sentir-se grato por isso, já
aceitara que envolver-se com ela seria inevitável. O problema era
que ainda não conseguira se livrar do sentimento de culpa.
Mas, quando ela se levantou e, como se fosse qualquer outro
passageiro, parou ao lado dele, segurando-se em um pingente, Ben
não conseguiu pensar em mais nada.
— Imagino que você não vá a nenhum lugar em particular — ele
murmurou.
— Não.
— Decidiu dar uma voltinha de metro?
Ela permaneceu em silêncio, como se soubesse que ele a examinava
da cabeça aos pés, lutando contra o impulso absurdo de erguer a
bainha da saia curta, só para ver se as roupas de baixo que ela
usava eram tão sensuais como sua dona.
— Nenhum encontro ardente?
— Depende.
— Depende de quê? — Ben indagou, excitado.
— Você é muito ardente, quando não está me seguindo, como se eu
fosse uma criança, incapaz de me cuidar.
Em vez de discutir se havia ou não saído para segui-la, Ben decidiu
concentrar-se na questão mais importante:
— Então, acha que sou ardente? Grace inclinou a cabeça para o lado.
— Não sei se gosto desse sorriso arrogante.
— Ah, pois acho que gosta e muito. Ela soltou uma risada deliciosa.
— Uma coisa não posso negar: você é macho, da cabeça aos pés! Na
parada seguinte, os demais passageiros desembarcaram, deixando-
os sozinhos no vagão.
— Quer se sentar? — Ben perguntou.
— Não, obrigada. Prefiro ficar aqui, bem perto de você. Naquele
momento, o trem entrou em movimento, e Grace deixou que os
quadris roçassem em Ben. Ele fechou os olhos e respirou fundo.
— Onde paramos? — Grace indagou. — Ah, sim! Em você ser macho.
Desde essas sobrancelhas espessas, até os lábios carnudos, você é o
mais sexy dos homens.
Enquanto falava, ela lhe acariciava a face com a ponta dos dedos.
Então, foi deslizando a mão pelo peito largo, até afastar-se e pousá-
la na própria cintura.
Ben voltou a respirar fundo, ao se dar conta de que ela havia pintado
as unhas de vermelho, no tom exato do batom que usava.
— Está se vingando por eu ter seguido você, não está?
— Ora, essa seria uma vingança infantil.
A resposta foi, no mínimo, evasiva. E, como o passeio fora pla-
nejado, Ben não poderia deixar de perguntar-se o que mais Grace
tinha em mente.
— Está insinuando que sou eu o seu encontro ardente? Um brilho
sedutor iluminou os olhos dela.
— É possível... desde que não me trate como a uma criança. Ben
baixou os olhos para o decote profundo, deleitando-se com a visão
dos seios fartos contidos por uma fina camada de renda.
— Você é tudo, menos uma criança, Gracie.
— Fico feliz em saber que percebeu isso.
— Sabe que eu não tinha escolha, senão oferecer-lhe uma re-
taguarda, caso precisasse de ajuda.
Grace desviou o olhar, antes de acariciar-lhe o rosto.
— Sim, eu sei. É um bom homem, Ben. Está preocupado comigo e
sinto-me grata por isso. Mas quero que me trate como mulher. E isso
significa que preciso lembrá-lo de como sou, como mulher.
— Acredite, Grace, eu jamais me esqueceria de como é uma mulher
como você.
— A questão é: acha que é capaz de me satisfazer?
— Ah, acho que não vou desapontá-la. — Como ela estava se
aproveitando ao máximo da situação, por que ele não poderia fazer o
mesmo? — Sinta o que você faz comigo — sussurrou, encostando-se
nela, pressionando sua masculinidade mais do que desperta contra o
corpo macio e repleto de curvas.
Grace respirou fundo, sobressaltada.
— Ainda está em tempo de mudar de idéia — Ben sugeriu com voz
rouca. — É claro que ficarei desapontado, mas vou compreender.
Minha mãe criou um verdadeiro cavalheiro.
— Verdade?
— Sei que é impossível perceber, apenas olhando para mim, mas,
sim, é verdade.
Grace fitou-o nos olhos.
— Bem, diga a ela que fez um bom trabalho.
— Direi. Ela vai gostar de ouvir isso, pois já não recebe muita
informação.
— Da maneira como fala, faz parecer que ela vive em uma prisão.
— O lugar é chamado de comunidade independente, mas ela está
perdendo a visão e, portanto, a independência deixou de existir.
Mamãe quase não sai.
Reconhecendo o amor e o carinho na voz de Ben, Grace descobriu
mais uma qualidade para admirar naquele homem.
— Aposto que ela o vê com freqüência.
— Todos os domingos, e sempre que tenho tempo livre, nos outros
dias.
O coração de Grace se abriu ainda mais para ele. Primeiro, os
garotos do parque. Agora, a mãe.
— Você é especial — ela murmurou.
O homem que escolhera para ajudá-la a se descobrir e se libertar era
muito mais do que um vizinho sexy.
— Você também é especial.
— Por que diz isso?
— Entre outras coisas, aprimorou sua capacidade de investigação em
tempo recorde.
Grace riu, pois fora apanhada em flagrante, bisbilhotando, mas não
se importou.
— O que mais?
Ora, já provara não ter um pingo de vergonha, no que dizia respeito
a Ben. Portanto, por que não mendigar mais elogios?
— É uma mulher incrível — ele murmurou, apertando sua mão. O
gesto simples, somado ao apoio, admiração e respeito que
ele demonstrava, tornaram os sentimentos de Grace mais sólidos.
Ben era exatamente o que ela via e, mais importante que tudo era o
fato de ele respeitar Grace Montgomery, independente do nome ou
do dinheiro de sua família.
De repente, o metro parou, e ela perdeu o equilíbrio. No mesmo
instante, os braços de Ben circundavam sua cintura, deixando-a
temporariamente atordoada.
— Acho que esta é a nossa estação — ele disse.
— Tem razão — Grace concordou, endireitando-se e alisando a
roupa.
Trêmula, saiu para a plataforma e esperou que ele a alcançasse.
Com a barba por fazer, a calça jeans desbotada e a camiseta sem
mangas, era o seu rebelde. A antítese de tudo a que Grace dera as
costas, epítome de tudo o que ela sempre quisera e jamais tivera a
coragem de buscar... até agora.
— Podemos ir — declarou.
— Você já me deu as boas-vindas ao edifício. Portanto, qualquer
celebração desse tipo seria um exagero — Ben replicou, afagando-lhe
os cabelos.
— Bem, nesse caso, acho que só me resta perguntar se está disposto
a me dar as boas-vindas à sua cama.
Quem era aquela mulher desavergonhada que acabara de se
oferecer descaradamente para Ben Callaham? Grace não a reco-
nheceu, mas gostou dela, e muito.
E tinha de agradecer a Ben por despertar aquele seu lado ousado,
por tê-la apresentado a Grace Montgomery, a mulher, E sabia
exatamente como recompensá-lo.
CAPÍTULO VII
O trem partiu atrás deles. Parados na plataforma, Ben tomou a mão
de Grace e descobriu que ela transpirava, um sinal de que se sentia
insegura em sua sedução. A única maneira de convencê-la seria
mostrar a ela o que sentia e, sem a menor hesitação, ele a tomou
nos braços.
— O que pensa que está fazendo? — Grace inquiriu, fingindo
indignação.
— Estou respondendo à sua pergunta. Sim, quero você na minha
cama.
Então, beijou-a.
Os lábios cobertos de batom deslizaram pelos dele em uma carícia
que Ben jamais experimentara antes, e da qual nunca se esqueceria.
Desejara ardentemente saborear aqueles lábios e, agora que o
fizera, não conseguia mais parar. Mas estavam em um local público
e, com certeza, oferecendo um espetáculo e tanto aos passantes. Foi
com esforço que interrompeu o beijo e colou a testa à dela.
— Nada mal — Grace murmurou, ofegante e satisfeita.
— Bem, juro que dei o melhor de mim. Ela sorriu.
— Fique tranqüilo, pois deu certo —- garantiu, examinando-lhe os
lábios com a ponta de um dedo.
— O que está fazendo? — Ben perguntou, intrigado.
— Comprei este batom especialmente para você. O anúncio dizia: “A
cor fica nos seus lábios, não nos dele”.
O toque suave e inocente ameaçava enlouquecer Ben.
— É melhor sairmos daqui — declarou e virou-se para a saída, só
então dando-se conta de que ainda tinha Grace nos braços.
Agora, compreendia os risos abafados e os olhares incrédulos. Afinal,
encarnara o papel de homem das cavernas de corpo e alma.
— Sei andar — Grace lembrou.
— É claro que pode — ele concordou, sem interromper a caminhada.
— Mas você não pretende deixar que eu o faça, não é?
A resposta foi um gemido gutural. Grace já provara sua capacidade
de sedução.
Levando em conta a roupa sexy que ela usava e os olhares que os
outros homens lhe dirigiam, ela deveria se sentir grata por ele não
tê-la golpeado na cabeça e arrastá-la pelos cabelos, como seus
ancestrais costumavam fazer. Sem dúvida, Grace planejara des-
pertar os instintos selvagens de Ben, e conseguira. Agora, poderia
conviver com as conseqüências. Estavam a apenas um quarteirão do
edifício. Quanto antes chegassem em casa, melhor os dois se
sentiriam.
Grace enroscou os dedos nos cabelos de Ben.
— Se insistir nisso, posso começar a gostar.
— Sem problemas. Minha intenção é fazer você gostar de uma
porção de coisas.
Ela enterrou o rosto no pescoço dele e, de repente, Ben descobriu-se
envolto pelo perfume feminino, aquecido pelo contato da pele quente
e macia. Não foi difícil imaginar o que aconteceria, assim que se
vissem sozinhos.
Atravessou a porta do saguão do edifício e passou pelo porteiro
sorridente.
— Não sei se algum dia conseguirei superar essa vergonha— Grace
sussurrou.
Ben riu.
— Mas eu tenho certeza de que minha reputação só poderá
melhorar.
— Vai me pagar por isso — ela afirmou.
— Promessas, promessas.
Ben apertou o botão do elevador. Felizmente, a porta se abriu
imediatamente. Assim que a porta voltou a se fechar, Grace pôs-se a
beijar-lhe o pescoço e mordiscar-lhe a orelha.
Quando, finalmente, chegaram ao seu andar, Ben mal podia respirar.
— Tudo bem para você, se formos ao meu apartamento? — Grace
indagou em um fio de voz.
— Como o meu apartamento não é realmente meu, o seu está ótimo.
Dê-me as chaves.
— A porta está aberta —Grace declarou e, quando notou que ele
pretendia protestar, acrescentou: — Não me venha com sermões,
Ben. Eu não tinha onde esconder as chaves, nesta roupa. Além disso,
você tem vigiado todos os meus passos. Provavelmente, direcionou
as câmeras de segurança para a minha porta.
Aquele era mais um assunto que Ben preferia evitar.
— Está bem, mas não faça isso de novo — ele resmungou, virando a
maçaneta.
— Espere!
Ben fitou-a nos olhos, mas não foi capaz de identificar a emoção que
os iluminava.
— Mudou de idéia? — perguntou, decidido a respeitá-la, se fosse o
caso.
— Não, mas embora seja óbvio que planejei tudo isso, não se trata
de uma coisa que eu faça todos os dias. Eu só queria ter certeza...
Sei que vou parecer tola, mas... Vai me respeitar, amanhã de
manhã?
— Amanhã, sentirei muito mais do que respeito por você, Gracie. Era
o maior medo de Ben: a profundidade de seus sentimentos por ela.
Abriu a porta e entrou, sempre levando Grace nos braços. As velas
acesas o apanharam de surpresa, dispostas em posições estratégicas
na sala preparada para uma sedução perfeita. Um perfume
desconhecido, mas muito excitante, penetrou-lhe as narinas. E Ben
ficou emocionado ao se dar conta do cuidado com que Grace
planejara a primeira vez em que ficariam juntos.
— Incrível — sussurrou ao ouvido dela, colocando-a no chão, fazendo
com que o corpo dela deslizasse pelo seu, mostrando-lhe quanto a
desejava.
— Sim, você é.
Ben riu, mas o riso se transformou em um gemido quando Grace
colou o corpo ao dele, desde o peito até os joelhos.
— Você teve um trabalho e tanto por nós dois, Gracie — murmurou,
retirando os grampos que prendiam os cabelos sedosos e afagando-
os com visível prazer.
Grace sorriu.
— É bom saber que você notou. Pedi ao porteiro que acendesse as
velas, enquanto estávamos fora. Agora, entende por que eu não
precisava das chaves? — Com isso, ela se afastou e foi até a mesa,
onde havia um vaso repleto de rosas vermelhas e uma grande
variedade de cremes e óleos. — Seja bem-vindo ao mundo da
sedução.
Ben sentiu como se houvesse ^esperado por aquele momento
durante toda a sua vida. Sem perder tempo, aproximou-se de Grace
e beijou-a. Então, despiu-a, deleitando-se com a visão da pele clara
e acetinada que envolvia as curvas deliciosas. A calcinha e o sutiã
ofereciam um espetáculo à parte, pois o tecido finíssimo, quase
transparente, permitia-lhe saber o que o esperava, ao mesmo tempo
em que mantinha um toque de mistério.
Pôs-se a acariciar os seios fartos com movimentos suaves e lentos,
observando atentamente a alteração dos mamilos rosados, que se
tornavam mais rijos a cada gesto seu. Então, fitou Grace nos olhos,
satisfeito por ver que as pupilas dela dilatavam em resposta às suas
carícias.
— Gosta disso? — perguntou.
— Muito... e disso, também — Grace acrescentou, pousando a mão
sobre a prova inegável do desejo que despertava nele.
Com um sorriso maroto, tirou a camiseta de Ben e atirou-a longe,
para então iniciar uma verdadeira tortura com seus dedos delicados
e aqueles lábios vermelhos que pareciam determinados a
enlouquecê-lo.
As sensações alucinantes que ameaçavam pôr fim ao controle de Ben
começavam onde Grace o'tocava: nos ombros, no peito, no ventre...
e se transformavam em verdadeiras correntes elétricas que
percorriam o corpo viril, até se alojarem entre as virilhas.
Quando se deu conta de que não suportaria aquele jogo por muito
tempo, Ben despiu Grace do sutiã, livrando-se da barreira que o
separava dos seios tentadores. Acariciou-os e beijou-os, in-
tensificando gradualmente o contato, fazendo Grace suspirar, gemer
e, por fim, perder o controle sobre os joelhos, que vergaram sob o
peso de seu corpo.
— Devagar — Ben murmurou com voz rouca, tomando-a nos braços.
— Isso está se tornando um hábito — ela comentou com um misto
de divertimento e desejo.
— Não posso dizer que me importo. Para onde vamos?
Grace enlaçou-o pelo pescoço, de maneira que sua cabeça pousasse
no ombro largo e os seios ficassem firmemente pressionados contra
o peito de Ben. Só então respondeu:
— Temos proteção sobre a mesa. Podemos ir para quarto, se você
conseguir chegar lá. De minha parte, prefiro não esperar tanto.
Ele soltou um gemido de agonia.
— Você finalmente conseguiu, Gracie! — Em questão de segundos,
estavam deitados no tapete da sala. — Acabou com o controle de
que sempre me orgulhei.
— Ah, já era tempo! — Grace aprovou, já se ocupando de desabotoar
a calça de Ben.
Juntos, despiram-se rapidamente, com gestos impacientes.
Trêmula, Grace mal podia conter a expectativa. Já tivera o corpo
colado ao de Ben, mas sempre com a barreira das roupas a separá-
los, ou no aperto do banco traseiro do carro. Agora, vendo-o
inteiramente nu, intensamente excitado, sentiu o coração disparar.
Nunca antes sentira tamanho desejo por um homem, nem tamanha
felicidade por saber que era igualmente desejada por ele.
Ben apanhou os preservativos de cima da mesa e colocou-os no
chão, ao seu alcance. Então, ajoelhou-se diante de Grace e percorreu
as extremidades da calcinha minúscula e transparente com a ponta
de um dedo.
Se eu imaginasse que era isso o que você estava usando por baixo
da sua roupa sexy, não teríamos sequer saído do metro — declarou,
sentindo mais homem das cavernas do que seus ancestrais.
Ainda não terminara a frase, e sua mão já acariciava o tecido fino,
fazendo Grace fechar os olhos e gemer baixinho. As carícias foram se
tornando mais e mais intensas, até que ela se viu sacudida por ondas
de prazer inesperadas e violentas.
Grace ouviu os gemidos altos, sabiam que eram emitidos por sua
própria garganta, mas não tinha o menor controle sobre eles. Assim
como não tinha controle sobre seu corpo, que sacudia e serpenteava,
arqueando-se contra a mão de Ben, em busca de mais daquele
prazer embriagante.
Lentamente as ondas foram espaçando, tornando-se mais suaves.
Assim que Grace começou a recuperar a capacidade de raciocínio,
Ben despiu-a da calcinha e retomou suas carícias. Para surpresa de
Grace, o desejo voltou com a intensidade de antes e, embora jamais
houvesse imaginado possível, ela atingiu o clímax pela segunda vez,
com a mesma rapidez e paixão que sentira na primeira.
Quando, finalmente, conseguiu abrir os olhos, descobriu que Ben
continuava a fitá-la. A expressão no rosto dele revelava a tensão
provocada pelo esforço que ele fazia para se controlar, mas ao
mesmo tempo, indicava profunda satisfação.
— Você é tão quente — ele murmurou.
— É você quem me deixa assim — Grace corrigiu, mal conseguindo
falar.
Mas já conseguia pensar e, assim, observou aquele homem ma-
ravilhoso, que acabara de lhe dar prazer tão singular. Um nó se
formou em sua garganta, trazendo consigo um sentimento que ela se
recusou a analisar.
A mão dele voltou a pressioná-la e, mais uma vez, Grace foi
apanhada de surpresa por mais uma onda de prazer.
— De novo? — indagou, arregalando os olhos.
— Juntos, desta vez — Ben explicou e se posicionou sobre ela, mas
antes de unir seus corpos, voltou a fitá-la nos olhos. — Você tem
idéia do que faz comigo?
— Mostre-me.
Ben obedeceu. Com rapidez e habilidade, apanhou o preservativo
para proteger a ambos. Em seguida, penetrou Grace em um único
movimento.
Por alguns segundos, permaneceram imóveis, deleitando-se com
uma sensação inteiramente nova e inesquecível para os dois. Então,
seus corpos começaram a se mover no ritmo mais antigo e instintivo.
Sabendo que estava prestes a atingir o clímax, Ben tentou apoiar-se
nas mãos, mas antes que conseguisse mudar de posição, Grace
pediu:
— Sente-se. — Diante do olhar curioso que ele lhe lançou, disse: —
Confie em mim.
Sem se separarem, viraram-se de maneira que Ben ficasse sentado,
com Grace sobre ele, as pernas em torno de sua cintura. Seus rostos
estavam frente a frente, a parte superior de seus corpos, alinhada,
os seios fartos pressionados contra o peito largo. O resultado foi uma
intimidade total, que Ben jamais experimentara antes e, certamente,
nunca esqueceria.
A expressão de Grace indicava que ela também estava fascinada pelo
que sentia.
— Acho que esses artigos não mentem — murmurou.
— Você uma menina má, Gracie — Ben declarou com ternura e
satisfação. — Esteve lendo sobre isso?
— Acreditaria se eu dissesse que encontrei os artigos por acidente?
— De jeito nenhum, querida. Prefiro acreditar que estava se
preparando para mim.
Beijaram-se com ardor, saboreando um ao outro, e às sensações que
criavam juntos. Não demoraram a atingir o clímax. O corpo de
Grace, já se familiarizando com as novidades oferecidas pelo de Ben,
foi o primeiro a estremecer e ser sacudido pelo êxtase.
Ben, que já se controlara mais do que imaginara possível, não foi
capaz de se conter e, juntamente com ela, foi tomado pela maior
explosão de prazer que já experimentara em sua vida.
Quando voltaram à realidade, fitaram-se em silêncio por um longo
momento. Então, Grace falou:
— Foi incrível!
E muito mais, Ben pensou. A posição que ela escolhera era mesmo
fantástica, mas não lhe permitia bater em retirada. E elo não contara
com a ternura que o invadiu, trazendo consigo outros sentimentos
que ele teve medo de enfrentar e identificar.
— E bom saber que você gostou — disse, tentando soar casual, mas
sem sucesso.
Começou a se afastar, mas Grace o manteve prisioneiro entre suas
pernas.
— Não precisa fugir — ela afirmou, compreensiva. —- Não vou pedir
nem forçar nada além do que aconteceu. E devo dizer que foi muito
bom.
— Sim, foi muito bom — Ben concordou, tomado pelo remorso.
— Isso mesmo. E, como meu pai não vai correr atrás de você, de
espingarda em punho, por que não relaxa é aproveita o resto da
noite?
Ele soltou uma risada amarga, pois as palavras de Grace con-
firmavam o que Ben já sabia: não era digno de Grace Montgomery e
sua vida privilegiada e elitista. Claro que o pai dela não o forçaria ao
casamento! Eram pessoas diferentes, de mundos diferentes e, além
disso, Ben entrara na vida dela sob falsos pretextos.
Sacudiu a cabeça, contrariado. Não era do seu feitio pensar tanto.
Tinha de parar/Aproveitaria o que pudesse, enquanto estivesse junto
dela e, então, desapareceria. Nada de análises, ou de remorsos.
— Ben?
Ele a abraçou, deslizado as mãos pelo corpo macio.
— Aproveitar o resto da noite parece ser uma boa idéia — disse.
— Eu sabia que seria capaz de convencê-lo! Ben sorriu e olhou para
os potes sobre a mesa.
— Que tal um banho e mais novidades?
— Boa idéia. Ótima idéia!
Embora notasse que o sorriso de Grace não alcançasse seus olhos,
Ben manteve-se firme na decisão de não fazer qualquer análise.
Tinha de se concentrar no "agora", pois era tudo o que tinham.
CAPÍTULO VIII
A mistura de vapor e jasmim tomava conta do banheiro. Grace não
precisaria de nenhum afrodisíaco, exceto o próprio Ben, para excitá-
la, mas o aroma sedutor e o gel de banho tornariam a experiência
ainda mais extraordinária.
Gostaria que aquilo não tivesse de terminar, mas quando abrira os
olhos e deparara com a expressão de pânico no rosto de Ben,
soubera que não haveria futuro para eles. Embora não soubesse por
que ele temia a intimidade c o compromisso, percebera que, se não
assegurasse imediatamente, perderia até o que tinha naquele
momento.
As palavras bem-humoradas haviam sido as mais difíceis de sua
vida, mas haviam atingido o seu objetivo: Ben continuava ao seu
lado.
Grace pretendia descobrir o motivo da fobia a compromissos que ele
tinha, mas naquele momento, pois tinha outras coisas em mente.
— Pronto! — anunciou da porta do banheiro.
Ben oferecera-se para apagar as velas, a fim de evitar riscos de
incêndio. Quando ele entrou no banheiro, Grace estava debaixo do
chuveiro, mas notou a diferença de pronto: a tensão se dissipara.
— A água está ótima — disse. — Venha.
Ele obedeceu e entrou na banheira, postando-se diante dela e
puxando-a para si.
— Por mais que eu tente, não consigo tirar as mãos de você —
murmurou, a voz já rouca pelo desejo.
— Diga-me, mais uma vez, por que deveria tirar as mãos de mim.
Ben riu.
— Não me lembro de ter dito antes.
— Diga agora.
— Temos coisas melhores a fazer do que conversar.
Grace discordava. Queria respostas e... Mudou de idéia quando Ben
inclinou-se e pôs-se a lamber a água que escorria por seu pescoço e
ombros. E esqueceu-se do que estivera pensando quando as carícias
foram descendo até seus seios.
Entregou-se com abandono aos braços que a sustentavam, con-
centrada apenas nas sensações que se espalhavam a partir de seus
mamilos para todo o seu corpo. De repente, seus joelhos vergaram,
incapazes de resistir à onda de desejo que a invadiu.
Sempre segurando-a, Ben a fez sentar-se e ajoelhou-se entre suas
pernas.
— É sempre assim, tão quente?
Grace apoiou a cabeça na parede. Tivera outros homens, mas só
agora descobria que jamais fizera amor, mas sim, sexo. E suas
reações a Ben eram resultado dos sentimentos que ele despertava.
— Quer uma resposta honesta? Ele pareceu surpreso.
— Claro.
Grace teve de forçar um sorriso diante da disparidade entre o que ele
perguntava e o que se dispunha a dar.
— Acho que já entendi. Eu respondo com honestidade, você não
responde. Na minha opinião, não é uma troca justa.
Ben sacudiu a cabeça.
— Está bem. Vamos fazer um acordo: você me dá uma resposta
honesta, agora, e eu responderei com honestidade, a outra per-
gunta, mais tarde.
Ora, ele só estava tentando ganhar tempo e, mais tarde, encontraria
outra desculpa para fugir às perguntas.
— Preciso de uma resposta, antes que a água esfrie — Ben
comentou, deslizando a mão sobre um de seus seios.
— Muito bem, você venceu. Vou responder. Não, Ben, nunca reagi
assim a outro homem. Ninguém jamais se importou com isso.
— Pois não sabem o que perderam. Ela sorriu.
— Você é o primeiro homem que consegue separar Grace, a mulher,
do nome e do dinheiro dos Montgomery. É o primeiro que não tem
qualquer relação com essa parte de minha vida e que desperta o que
há de melhor em...
O resto foi abafado pelo beijo ardente de Ben, provavelmente porque
ele temia as implicações. E Grace sabia que ele tinha motivos de
sobra para temê-las.
Como já estava se tornando rotina entre eles, as carícias de Ben logo
sufocaram todos os pensamentos de Grace. Assim que notou o
estado de alta excitação em que ela se encontrava, Ben mudou de
posição, sentando-se atrás dela e puxando-a para si, até que ela
sentisse sua ereção contra as costas. Então, segurou-lhe as coxas
com as duas mãos e afastou-as.
— O que está fazendo? — ela indagou, subitamente apreensiva.
— Confie em mim. Feche os olhos, respire fundo... e relaxe.
Lembrando-se de que pedira o mesmo a ele, pouco antes, Grace
obedeceu. E relaxou. E, no momento em que Ben percebeu isso,
moveu o corpo, empurrando-a lentamente.
A água do chuveiro, que caía sobre seus joelhos, foi caindo mais e
mais para cima, até atingir o centro de sua feminilidade.
A primeira reação de Grace foi de choque, mas Ben manteve suas
pernas abertas com mãos firmes, sussurrando-lhe ao ouvido.
— Respire fundo. Relaxe. Sinta...
A cada palavra que pronunciava, aproximava as mãos do ponto em
que a água a massageava. Então, sempre sussurrando e beijando-a,
penetrou-a com um dedo.
Os quadris de Grace arquearam, pedindo mais, e Ben atendeu ao
pedido, movendo-se para dentro e para fora, repetidamente.
— Sozinha, não — ela protestou.
— Os preservativos estão na sala, e nada vai me fazer interromper
você agora. — Continuou com o assalto sensual. — Sinta, Gracie, sou
eu dentro de você, sem preservativo, ou qualquer outra barreira para
nos separar.
Grace ouviu a fantasia, sentiu-a, e foi tomada por um clímax ainda
mais intenso que os anteriores. Quando voltou a si, deu-se conta de
que havia realizado a fantasia de Ben, mas ainda não a sua.
Ora, a noite ainda estava longe de terminar.
Ben envolveu Grace em uma toalha e carregou-a para a cama, onde
ela se aconchegou junto a ele.
Teria mesmo acreditado que, se não visse o rosto dela quando
atingisse o clímax, não seria afetado? Acreditara, de fato, que se não
a penetrasse, conseguiria manter-se distante? Seria possível que
fora estúpido a ponto de se convencer de que não estava per-
didamente apaixonado pela mulher a quem estava enganando?
Depois de acomodá-la sobre os travesseiros, afastou-se.
— Aonde vai? — Grace inquiriu em tom de pânico.
— Vou buscar uma toalha para mim. Estou encharcado. Sem esperar
pela resposta, Ben foi até o banheiro, apanhou
uma tolha e secou o corpo molhado. Então, foi até a sala, onde
vestiu a cueca, na esperança de que a pequena peça o ajudasse a
recuperar parte do seu controle.
Quando voltou ao quarto, Grace estava exatamente como a havia
deixado.
— Desculpe-me. Não tive a intenção de entrar em uma crise de
pânico. Posso pedir uma coisa? Sei que prometi não pedir nada, mas
isso significaria muito para mim.
— Peça qualquer coisa — ele respondeu sem pensar, deitando-se ao
lado dela.
— Fique comigo, esta noite.
Ao menos, Grace não pedira para que ficasse com ela pelo resto da
vida. O que era o que Ben mais desejava.
— Claro.
— Obrigada.
— De nada, mas é melhor você se secar, para que possamos nos
enfiar debaixo das cobertas.
Com isso, Ben pôs-se em ação, abrindo a toalha e deleitando-se,
mais uma vez, com a visão do corpo quente e macio.
— Está frio! — Grace protestou, estremecendo.
— Então, deixe-me aquecê-la — ele sugeriu, retirando a toalha de
debaixo dela e começando a secá-la, a partir dos pés.
— Está me mimando — Grace murmurou.
— Eu sei.
— É bom.
— Não está acostumada a ser mimada? — Ben perguntou, lem-
brando-se da vida luxuosa que ela tivera.
— Não, embora eu tenha crescido em um mausoléu apinhado de
criados, pois Emma estava lá. Graças a ela, Logan e eu aprendemos
desde a infância a cuidar de nós mesmos.
Como quisesse ouvir mais da história de Grace, Ben tornou seus
movimentos mais lentos, secando cada centímetro da pele dela com
cuidado exagerado.
— Você sempre fala de Emma e Logan, mas nunca menciona o resto
da família. E quanto a seus pais?
Grace apoiou-se nos cotovelos para fitá-lo.
— Vou responder às suas perguntas porque, depois do que acabamos
de partilhar, tenho vontade de me abrir com você. Mas não se
engane. A próxima rodada é minha.
Ele riu.
— Está bem.
— Meus pais são meus pais somente no nome. Ou melhor,
especialmente no nome. Nada é mais importante para eles do que o
nome Montgomery, a herança, o dinheiro... nem mesmo os filhos.
Meu irmão e eu fomos criados como animais de estimação, exibidos
em público quando era conveniente ao meu pai, o juiz, ser visto
junto da família. Durante o resto do tempo, éramos ignorados.
— Foi tão ruim assim?
— Foi. Quando eu tinha quinze anos, queria concorrer a presidente
da classe. Decidi não contar à minha família, enquanto não vencesse
a eleição. Era a minha maneira de dar continuidade à tradição dos
Montgomery. Além disso, eu queria desesperada-mente agradar meu
pai. Mas foi apenas mais uma tentativa inútil de chamar a atenção
dele.
— O que aconteceu?
— Alguém contou ao meu pai sobre a eleição e, quando cheguei na
escola, descobri que ele havia conversado com os professores e se
voluntariado para dar uma palestra sobre como conduzir uma
campanha eleitoral. E, quando o juiz Montgomery falava, todos
ouviam.
— Você venceu a eleição?
— Claro, mas não pelos meus méritos, e sim porque meu pai, o juiz,
havia convencido todos os alunos de que os Montgomery haviam
nascido para serem representantes públicos, e votar em Grace seria
o mesmo que votar na Constituição.
Ben sentiu um aperto no peito ao pensar na maneira como o pai de
Grace a diminuíra diante dos colegas e professores. E, também, por
constatar que ela havia passado a vida tentando agradar um homem
que jamais se deixaria agradar, e que acabara se perdendo nesse
processo. Mas Grace dera a volta por cima e, agora, era motivo de
orgulho para qualquer homem, especialmente ele, Ben.
— Tenho certeza de que as pessoas perceberam que você tinha o seu
próprio valor — mentiu.
— Talvez, mas votaram como ele queria. Foi revoltante. O outro
candidato era muito melhor qualificado, e eu queria concorrer e
vencer, por ser capaz de conquistar os votos dos colegas. No en-
tanto, venci pelo meu sobrenome e porque meu pai não hesitou em
mencionar todos os favores que as pessoas deviam a ele. Como seu
eu não tivesse competência para vencer por mim mesma.
— Imagino que saiba que é muito mais inteligente do que todos os
seus colegas de escola.
Ela deu de ombros.
— Mas sinto muito que tenha tido de passar por isso. E sinto mais
ainda por ter feito você reviver uma experiência tão ruim, ao repetir
a história para mim.
Grace fitou-o com olhos cheios de lágrimas.
— Não sinta. Se eu não quisesse que você soubesse, não teria lhe
contado. Além do mais, não foi tão ruim. Tive Logan e Emma, que
sempre me amaram pelo que sou. Se conhecesse minha avó,
compreenderia o tipo de experiência que ela é capaz de
proporcionar. "Excêntrica" é uma palavra que mal começa uma boa
descrição!
Ben sabia disso, mas limitou-se a dizer:
— E você a adora.
Grace assentiu.
Usando as extremidades da toalha, Ben foi subindo pela parte
interna das coxas de Grace, até que ela começasse a tremer.
— Ben...
— Sim, Gracie?
— Sei muito bem o que pretende fazer.
— Exatamente como eu esperava.
— Você está se esquivando às minhas perguntas.
— Não é verdade. Estou apenas me aproveitando desse seu corpo
lindo e nu.
Com isso, ele se posicionou entre as pernas dela e, sempre usando a
toalha, acariciou-a com intimidade. Grace emitiu gemidos suaves,
deixando-o excitado como antes. E ela admitiu que não queria abrir
mão do paraíso que descobrira nos braços de Ben. Encontraria as
respostas mais tarde.
Depois de alguns momentos de total abandono, entre beijos e
carícias, ele se livrou da cueca e apanhou o preservativo. Então,
ajoelhou-se diante dela e ordenou:
— Sente-se. Grace obedeceu.
— Agora, olhe.
Ela olhou, e viu a própria feminilidade pulsante a convidá-lo para
mais uma excursão ao mundo do prazer. Também viu quando ele a
penetrou lentamente.
— É tão erótico — murmurou, fascinada pela visão de seus
corpos unidos.
Voltaram a se deitar e, sem pressa, fizeram amor. E Grace
abandonou-se às sensações, feliz por saber que ele não só a preen-
chia como mulher, mas também preenchia o seu coração.
CAPÍTULO IX
Grace acordou arrepiada e deu-se conta de que havia se afastado de
Ben, enquanto dormia. Haviam caído no sono, exaustos, nos braços
um do outro, sobre as cobertas. No momento em que se afastara do
calor do corpo dele, Grace percebera a diferença.
— Você está bem? — ele perguntou, sonolento.
— Sim, só estou sentindo um pouco de frio.
Melhor do que admitir que sentira falta dele. Passaria por tola, se
dissesse isso, uma vez que ele estava ali, bem ao seu lado. E a única
coisa que queria era assustá-lo com a idéia de uma cobrança.
Na semi-escuridão, Grace examinou o homem espetacular deitado
em sua cama, e deu-se conta de que era uma mulher de sorte.
Afinal, sexy e afetuoso, Ben a aceitara por completo.
— Grace, perguntei se quer entrar debaixo das cobertas.
— Ah, sim, mas quero fazer uma coisa, antes.
Sentou-se na cama e abaixou-se para apanhar algumas fotos
guardadas no criado-mudo.
— Não está mais cansada? Ela sorriu.
— Tenho uma grande reserva de energia. Alguns minutos de
descanso, e já estou pronta para recomeçar. A menos que você
prefira dormir.
— Querida, sou perfeitamente capaz de acompanhar a sua energia.
O que tem em mente?
Grace acendeu o abajur e virou-se para ele.
— Trate de tirar esses pensamentos da cabeça! Ao menos, por
enquanto.
Ben já havia se deitado sob as cobertas e Grace juntou-se a ele,
evitando pensar em como sua cama seria solitária, depois que ele
saísse de sua vida.
— O que temos aqui?
Grace olhou para o álbum em sua mão e sentiu-se subitamente
embaraçada. Na escuridão, parecera boa idéia mostrar a Ben as
fotos que tirava no parque. Acreditara que ele compreenderia o que
levava a dar algo àquelas mães trabalhadoras e seus filhos. Agora, à
luz do abajur, Grace via aquele relacionamento pelo que realmente
era.
Um caso, apaixonado e intenso, mas uma relação passageira. E um
homem que deixava claro não querer qualquer tipo de com-
prometimento, não se interessaria em saber o que dava sentido à
vida de sua parceira.
Mesmo que a parceira houvesse se apaixonado perdidamente por
ele.
Grace arregalou os olhos, chocada. Estava apaixonada por Ben.
Apertou o álbum contra o peito.
— Não é nada importante.
— Duvido — Ben protestou em tom suave, antes de retirar o álbum
das mãos dela, fitando-a nos olhos. — Estas são as suas fotografias.
— Ela assentiu. — Vejo em seus olhos quanto significam para você.
— São uma parte de mim, a prova de que sou capaz de realizar o
que quero. Tolice, não?
— Não, não é tolice. Nada do que você deseja é tolice. E aí está uma
coisa que eu gostaria de saber: o que você deseja.
— Além de você? Ben sorriu.
— Sim, além de mim.
—Já ouviu falar de uma instituição de caridade chamada Chances?
— Vagamente.
— Trata-se de um projeto para ajudar crianças carentes. Fui
contratada para tirar as fotos que ilustrarão o novo folheto e uma
página inteira em revistas de grande circulação. Espero conseguir
mostrar às pessoas com quem cresci o que é a vida real e, ao
mesmo tempo, receber suas doações.
A admiração nos olhos de Ben era nítida e clara.
— Quero ver as fotos.
— A maioria são fotos de crianças. Adoro crianças, e não há nada
melhor do que fotografá-las quando estão brincando, independente
de sua classe social.
— Já pensou em ter filhos?
— Algumas vezes — ela respondeu, desviando os olhos.
A verdade era que Grace adoraria ter uma família unida, totalmente
diferente da sua.
E, agora, sabia que queria ter essa família com Ben, o homem que
não queria compromissos. Engolindo o nó que se formou em sua
garganta, ela voltou a olhar para o álbum e mudou de assunto:
— Veja estas. Dei cópias para as mães, para que pudessem desfrutar
das imagens de seus filhos. É isso, uma visão realista, porém
colorida da vida.
— Minha mãe a compreenderia com facilidade. Ela amava a vida.
Mesmo nos momentos mais difíceis para nós, quando ela trabalhava
o dia inteiro, limpando as casas de outras pessoas, ainda conseguia
apreciar as pequenas coisas, como as borboletas, na primavera, e os
flocos de neve, no inverno.
Ben fez um gesto para que Grace voltasse a se juntar a ele, e ela
obedeceu, aconchegando-se junto do corpo quente e viril. Talvez ele
não houvesse se dado conta, mas acabara de abrir uma janela para
sua alma, e Grace sabia que ele havia escolhido aquele momento
para abri-la por ter percebido sua dificuldade em lhe mostrar as
fotografias.
— E, agora, sua mãe não pode enxergar as coisas que ama.
— Não. Somente sombras — Ben murmurou, sem conseguir
esconder a dor.
— Ben, precisa lembrar de que a vida continua para ela, de outras
maneiras. Ela guarda suas lembranças aqui — bateu no peito —, e
aqui — apontou para a cabeça. — Mesmo que sua mãe nunca mais
veja um pôr-de-sol, a lembrança vai acompanhá-la pelo resto da
vida.
Ben fitou-a por um longo momento, primeiro surpreso, depois
agradecido.
— Eu deveria saber que você compreenderia.
— Sim, deveria. Já que estamos falando de sua mãe, o que
aconteceu ao seu pai? Você nunca fala dele.
— Era um bom homem. Morreu do coração, quando eu tinha oito
anos.
— Sinto muito. E eu me queixando de que meus pais me ignoravam.
Ao menos, os dois estavam lá.
Ben franziu o cenho.
— Não se desculpe por ter ficado insatisfeita com o que recebeu.
Toda criança tem o direito de esperar amor e compreensão de seus
pais.
Apertou a mão de Grace e ela percebeu que não estava partilhando
apenas suas histórias, mas também partilhavam conforto.
E era bom, muito bom.
Fazia muito tempo que não tinha em quem buscar conforto. Quando
era menina, sempre tivera Logan para confortá-la. Seu pobre irmão
passara muitas noites em claro, massageando suas têmporas, para
aliviar as terríveis enxaquecas provocadas pelas intermináveis
discussões de seus pais. Discussões que ocorriam entre quatro
paredes, quando eles pensavam que ninguém os ouviria. Pois os
Montgomery jamais discutiam em público, onde sua imagem tinha de
ser sempre perfeita. Mas Grace crescera e, então, não tivera mais
ninguém para confortá-la.
Agora, tinha Ben. Recostou a cabeça no ombro dele, advertindo-se
para não se acostumar, mas seu coração recusou-se a encarar a
realidade. Enquanto estivessem juntos, Ben lhe pertencia.
— Não estou dizendo que tive uma vida perfeita, mas você deve me
achar ridícula, por falar em mansões e Porsches e, ao mesmo tempo,
ficar me queixando de tudo; Por mais que soe como clichê, o
dinheiro não traz felicidade.
— Não acho que seja ridícula. Acho que teve de percorrer um longo
caminho para amadurecer, mas chegou lá, e deveria orgulhar-se
disso. Sempre pensei que minha vida havia sido difícil, mas agora,
acho que tive muita sorte.
Ben voltou a examinar as fotos, e Grace pôs-se a considerar aquela
conversa. Ben gostava dela e a respeitava. Disso, não havia dúvida.
Sabia tudo sobre ela, e não a diminuíra. Ao contrário, a elogiara.
— O que você acabou de dizer é muito importante — sussurrou.
Ben sabia mais do que deveria sobre Grace, não só o que a excitava,
mas também o que a motivava. As fotos de crianças brincando
provavam que ela era uma criatura meiga, inocente e tradicional.
Queria tudo o que não tivera na infância: uma família afetuosa.
Certamente, também queria uma casinha com cerca branca, filhos e
um cachorro. E não era difícil imaginá-la naquele cenário.
Mas, no momento, Grace esforçava-se para compensar o fato de ter
tamanha riqueza, enquanto outros não tinha nada. Não dava
dinheiro, mas algo muito mais precioso. Dava àquelas pessoas
trabalhadoras, lembranças bonitas que guardariam pelo resto de
suas vidas. O tipo de lembranças que ela jamais tivera.
— Hoje é domingo — Grace murmurou. — Vai visitar sua mãe? Ele a
fitou nos olhos.
— Sim, por volta das quatro horas. Costumo ficar para o jantar. E o
que Ben mais queria era levar Grace consigo, mas não o faria. Se
permitisse que ela entrasse em sua vida pessoal, a decepção e a dor
seriam muito maiores, depois.
E, ainda, tinha de pensar na mãe, que mal podia esperar para vê-lo
casado e até já interrogara suas vizinhas sobre possíveis filhas
solteiras. Ben não poderia levar uma mulher para visitá-la, pois sua
mãe perdera a visão, mas não a inteligência e a sensibilidade. Ela
tiraria as conclusões certas sobre Grace e, então, Ben teria de
explicar por que tinha de deixá-la.
Examinou uma fotografia tirada em um dia ensolarado, quando o
parque fervilhava de crianças alegres. Não havia qualquer sinal de
pobreza ou desilusão.
— É incrível como o parque fica diferente, através dos seus olhos.
Virou-se para fitá-la e reconheceu o orgulho que a fez corar.
— É como os piqueniques que minha mãe preparava. Eu me esquecia
de todas as coisas ruins que haviam acontecido para nós.
Ben sentia a mesma paz e contentamento ao lado de Grace.
Perturbado por tal pensamento, ele voltou a se concentrar no álbum.
Grace fotografara uma criança que acenava para a câmera com um
sorriso maroto e feliz, mas foi a sombra vermelha ao fundo que
chamou sua atenção. Com cuidado, ele retirou a foto do álbum.
— O que está fazendo? — Grace perguntou.
— Quero ver isso melhor. Se eu não soubesse...
— O que foi?
Curiosa, Grace posicionou-se atrás de Ben, para espiar por cima do
ombro dele. Ao sentir os seios dela em suas costas, ele se deu conta
de que estavam nus, conversando sobre suas vidas, partilhando
lembranças do passado. Como seus pais faziam, naquela manhã de
domingo, quando ele entrara no quarto sem bater na porta. Como
um casal casado havia muitos anos.
— E então? O que é? — Grace insistiu.
— O rapaz que atacou você, se não estou enganado. Quando tirou
esta foto?
— No mesmo dia.
— Veja, é a mesma camiseta vermelha, com as mangas cortadas. Foi
a primeira coisa que vi, depois de ouvir o seu grito. — Ben estreitou
os olhos. — Veja o que há nas mãos dele.
Ela olhou de perto.
— É difícil enxergar. Segui Kurt, o garotinho, que saiu do playground.
Ele desaparece com freqüência, quando a mãe não está olhando,
para ir atrás do irmão.
— Conhece o irmão dele?
— Não. Ele raramente aparece e, segundo a mãe, faz o mesmo na
escola. Bem, segui Kurt até um beco. Ele se virou, viu que eu estava
lá e soube que havia sido apanhado em flagrante. Sabia que eu o
levaria de volta para a mãe, mas a expressão em seu rosto foi
impagável. Por isso, acionei a câmera.
— E fotografou muito mais do que o garotinho, Grace. Parece que o
assaltante tinha um pacote de cocaína nas mãos.
— Dê-me a foto. Não consigo ver. Como sabe o que é?
Instinto, Ben pensou. Vira muitas situações parecidas, quando
criança, e tivera sorte de não sê envolver naquele mesmo tipo de
coisa. Felizmente, cuidar da mãe sempre fora a sua prioridade.
— Já lhe disse que cresci em um bairro como aquele. Essa foto traz
problemas.
— Então, isso explica o bilhete — Grace murmurou, pensativa.
— Que bilhete?
Ela respirou fundo, abaixou-se e apanhou o papel amassado do cesto
perto da cama.
— Este.
Depois de entregar o bilhete a Ben, Grace aconchegou-se a ele e
beijou-lhe o pescoço.
— Pare de tentar me distrair, Grace. Quando recebeu isso?
— Esta tarde. Kurt entregou-me, quando eu estava no playground,
com toda a sua inocência.
Ben praguejou.
— E, mesmo assim, você foi ao metro, à noite.
— Se mantiver a calma e a memória, vai se lembrar de que não me
afastei da estação. Além disso, eu sabia que você estava me
seguindo e, portanto, estava segura.
Apesar de satisfeito pelo voto de confiança, Ben ainda estava furioso
com a ousadia dela.
— Sabe o que significa isso? — inquiriu, agitando a foto no ar.
— Sim. O irmão mais velho de Kurt está envolvido com drogas e Kurt
já viu demais, para uma criança da sua idade.
— Sim, mas também significa que você fotografou uma atividade
ilegal. Ou eles sabem disso, ou não querem correr o risco de que
você venha a coletar provas, no futuro. O que a torna um alvo
cobiçado.
Grace estremeceu ao ouvir as palavras ameaçadoras. Ben tomou-a
nos braços.
— Não quero assustá-la. Só quero que tenha cuidado.
— Bem, que tal termos as duas coisas? Preciso tirar as fotografias.
Portanto, acho ótimo ter você para me proteger.
— Lembro-me de você afirmar que não precisava de guarda-costas.
— Sou independente, mas não sou burra. Também conheço minhas
limitações. Derrubá-lo não vai resolver o problema.
Ben sabia o que tal decisão representava para uma mulher que
lutara tanto para conquistar sua independência e, por isso, apertou-a
contra si, beijou-a, para então voltar a fitá-la, dizendo:
— Sabe o que mais gosto em você?
— O quê?
— E uma mulher inteligente.
— Só porque estou admitindo que preciso de você?
— Não, porque está disposta a abrir mão da sua liberdade, até
resolvermos isso. Amanhã de manhã, enquanto você estiver no
trabalho, irei até lá e farei algumas perguntas. Com sorte, quando
chegar, já terei as respostas.
— Sabia que eu iria ao parque, de qualquer maneira?
— Claro. Já conheço você.
— E não vai tentar me convencer do contrário?
— Daria resultado?
— Não — Grace admitiu com uma risada.
— Eu sabia. Por isso, o melhor que posso fazer é chegar antes de
você, para esclarecer as coisas e poder vigiá-la, mais tarde. Leon, o
rapaz a quem estou ensinando basquete, conhece muita gente por
lá. Vou descobrir alguma coisa e encontrar um meio de tornar suas
idas ao parque seguras.
O que havia começado como mera coleta de informações para
Emma, transformara-se em uma questão pessoal: manter Grace em
segurança.
As mãos dela deslizaram pelo seu peito, pousando sobre os mamilos.
Ben gemeu baixinho.
— Grace, o assunto é sério!
— Eu sei. Meu detetive particular vai cuidar de tudo. Enquanto isso,
vou cuidar de você.
Um ruído contínuo despertou Ben, que se descobriu envolvido pelo
calor de Grace. Então, as batidas na porta se somaram ao toque da
campainha.
— Vá embora! — Grace resmungou.
— Não é bem-humorada, pela manhã? — ele indagou com um
sorriso, afagando-lhe os cabelos. —Tudo bem. Gostei do seu humor
noturno.
Ben sentou-se na beirada da cama e, como ela nem sequer
respondesse à brincadeira, vestiu a calça e levantou-se. Ora, gostava
dela, mesmo despenteada e mal humorada!
— Tem certeza de que quer que eu atenda a porta? Os vizinhos
podem comentar...
Grace puxou o travesseiro sobre a cabeça, em resposta.
Rindo, ele foi até a porta, mas o sorriso morreu em seus lábios
quando espiou pelo olho mágico. No corredor, estavam duas pessoas
bem vestidas, que ele vira em fotos no apartamento de Grace. Se já
se sentia hesitante em abrir, antes, agora a idéia era detestável.
— Vamos, Grace!— chamou a voz masculina no corredor. Ben fechou
os olhos. Não tinha escolha.
— O porteiro disse que você está aí! Sou eu, seu irmão — Logan
anunciou, ap mesmo tempo em que Ben abria a porta. — Você não é
minha irmã.
A expressão de preocupação de Logan logo se transformou em
contrariedade. Ele examinou Ben da cabeça aos pés, atento aos
cabelos desgrenhados, a barba por fazer, a calça desabotoada.
Ben gostaria de poder desaparecer no ar. Não tinha irmãos, mas se
estivesse no lugar de Logan, sua vontade seria de matar o homem à
sua frente. Pouca diferença fazia o fato de a irmã ser uma mulher
adulta.
— Bem, esta é uma situação um tanto constrangedora — declarou a
mulher de cabelos loiros, adiantando-se e estendendo a mão. — Sou
Catherine, cunhada de Grace. Este é o irmão dela, Logan. — Atingiu
o marido nas costelas com o cotovelo. — Pare de fazer caretas,
Logan! Grace é adulta e tem o direito de viver a vida dela, assim
como vivemos a nossa. Não vá iniciar o sermão assim que ela
aparecer, e dar a ela mais motivos para se afastar de nós. — Então,
fez uma pausa para se concentrar em Ben. — E você é?
Ele sorriu, gostando dela imediatamente.
— Ben Callahan, o vizinho.
Calculou que o mínimo de informação seria suficiente. Infelizmente,
os detalhes eram óbvios. Depois de apertar a mão de Catherine,
estendeu a sua para Logan, que aceitou o gesto, ainda de cenho
franzido.
— Isso não significa que aprovo — resmungou.
— Ainda bem que não preciso de sua permissão — Grace declarou,
atrás de Ben.
Ele se virou em tempo de vê-la passar correndo, com um largo
sorriso, para atirar-se nos braços do irmão e, depois, da cunhada.
Com um nó na garganta, Ben reconheceu o amor que unia aqueles
três, o que confirmava suas suspeitas de que o melhor para Grace
seria voltar a viver junto daqueles que a amavam. Ben tivera aquela
única noite para amá-la, e o dia amanhecera depressa demais.
— O que estão fazendo aqui? — Grace perguntou.
— Acha que pode passar tanto tempo sem dar notícias e sem receber
uma visita minha? — Logan respondeu.
— Desculpe, mas estou contente que tenham vindo.
— Além disso — Catherine acrescentou —, não perderíamos o seu
aniversário.
— Aniversário? — Ben repetiu, sem pensar.
— Sim, aniversário. Amanhã — Logan informou-o com expressão
irônica.
Ben quase pôde ouvir as palavras que ele não pronunciou: "Dormiu
com minha irmã, mas não sabe que ela faz aniversário amanhã? Tem
certeza de que a conhece?"
Muito bem, Ben pensou. Bem demais, e um pequeno detalhe como a
data do aniversário dela não mudaria o que acontecera, naquela
noite. Porém, ele sabia reconhecer a hora de se retirar, assim como
as batidas descompassadas de seu coração e a fina camada de suor
que cobria a sua testa.
Enquanto Grace convidava a família a entrar, ele desapareceu no
banheiro para acabar de se vestir. Recusou-se a analisar os próprios
pensamentos. Faria isso quando estivesse sozinho.
Quando voltou à sala, os três estavam sentados no sofá. As velas
continuavam espalhadas pelo ambiente, mas os artigos sensuais
haviam desaparecido.
— Ben, venha conhecer Cat e Logan. Se tiver sorte, eles vão contar
como acabaram juntos. Minha avó escolheu Cat e, então, trancou-os
em um quarto de vestir, no meio de uma festa.
— Sua avó deve ser interessante — Ben comentou.
— Você não sabe de nada — Catherine disse com uma risada. —
Agora, consigo rir do que aconteceu.
Grace pousou a mão no sofá.
— Sente-se aqui. Logan já terminou a encenação do irmão mais
velho protetor.
Logan continuava de cenho franzido, mas Grace fingiu não notar, e
sua risada encheu o ar.
Ben sentiria falta daquele som, mais do que tudo.
— Preciso ir — murmurou.
— Não, não precisa. Ao menos, não antes das quatro. Que tal eu me
vestir e descer para comprar o café da manhã?
Ben respirou fundo. Era muito difícil dizer não a Grace.
— Que tal eu descer para comprar o café da manhã, enquanto você
fica com sua família?
Ela concordou com um sorriso radiante, certa de que ele partilharia o
desjejum. O que não aconteceria.
Ben entrara na vida de Grace através de uma mentira. E dormira
com ela, sabendo que a estava enganando. Dentro de uma hora,
estaria ao telefone, dando informações sobre ela para a avó.
Portanto, não tinha o direito de socializar com a família. Grace não
gostaria nem um pouco da verdade, se a conhecesse. Assim como
seu irmão.
— Onde está o bebê? — Grace perguntou, assim que a porta se
fechou atrás dele.
— Em casa, com Emma, e não mude de assunto. — Logan foi
implacável. — Quem é esse homem?
— Quer fazer o favor de deixá-la em paz! — Catherine queixou-se.
Logan fitou a esposa com olhar cínico.
— Por acaso, você deixou sua irmã, Kayla, em paz, quando ela
começou a sair com Kane?
Grace acomodou-se na cadeira, divertindo-se com a discussão bem-
humorada do casal. Sentira muita falta deles e estava feliz por vê-
los. Era uma pena que houvessem escolhido um momento tão ruim
para aparecer. Pela expressão no rosto de Ben, ao trazer o café da
manhã e sair imediatamente, a visita inesperada destruíra o clima de
intimidade que haviam conquistado naquela noite.
Ele havia se afastado de novo e, dessa vez, não seria tão fácil trazê-
lo de volta.
Depois de uma visita breve demais, Grace deixou Logan e Catherine
em um hotel. A cunhada alegara estar com o sono atrasado, por
causa dos dentinhos que estavam nascendo no bebê. Também
insistira em não querer atrapalhar Grace, dormindo na cama dela.
Mas Grace percebeu que Logan e Cat precisavam passar algum
tempo sozinhos.
Quando se viu sozinha, Grace descobriu-se inquieta. A adrenalina
resultante da noite com Ben ainda circulava em suas veias. Seria
impossível ficar parada. Além do mais, precisava conversar com á
mãe de Kurt, antes que o garotinho seguisse os passos do irmão.
Grace não sabia exatamente até que ponto o irmão estava envolvido
em atividades criminosas, mas não poderia se preocupar em
comprometê-lo e, menos ainda, com a própria segurança, pois era a
vida de uma criança inocente que estava em jogo.
Assim, apanhou a câmera e saiu.
CAPÍTULO X
O telefone começou a tocar no momento em que Ben entrou no
apartamento. A visita à mãe lhe fizera bem, pois a velha senhora não
se deixava abater por nada. O toque estridente se repetiu. Saber
que, provavelmente, era Emma quem ligava, ameaçou estragar seu
humor, mas por que adiar o inevitável?
— Callahan — atendeu.
— Boa tarde! — Emma cumprimentou-o com entusiasmo.
— Olá, Emma.
— Chegou tarde em casa, ontem à noite?
— Imagino que tenha tentado falar comigo pela manhã.
— Claro. Eu queria avisar que o irmão de Grace ia fazer uma visita-
surpresa, mas creio que você descobriu isso da pior maneira
possível.
— O que disse?
Ben foi tomado pelo sentimento de culpa. Seria possível que Emma
soubesse do que se passava entre ele e Grace? Se fosse assim, ele
estava prestes a ser demitido. Evidentemente, uma vez sabendo que
Ben dormira com a irmã, Logan contaria isso à avó, a menos que
quisesse poupar a sensibilidade delicadas da pobre velhinha. Diante
do pensamento absurdo, Ben teve de reprimir uma gargalhada.
Afinal, não havia nada de delicado na sensibilidade de Emma que, a
propósito, estava longe de ser uma pobre velhinha.
— Estou tentando ligar desde nove horas. Você não estava em casa
ontem à noite, nem hoje de manhã, e passou a tarde inteira fora.
Deve estar muito ocupado. E, claro, sabe que Logan e Cat visitaram
Grace... pois está vigiando cada passo de minha neta, certo?
— Sim, sim... sei que seu neto está aqui.
Ben sentira-se livre para visitar a mãe, por saber que Logan e Cat
manteriam Grace ocupada pelo dia todo. Assim, ele não precisara se
preocupar com a possibilidade de ela ir sozinha ao parque e se meter
em novas encrencas com o irmão de Kurt.
— Logan é um homem maravilhoso — Emma murmurou, orgulhosa.
— Não foi fácil aproximá-lo de Catherine, mas não me deixo
desanimar com facilidade.
— Não duvido.
— E Grace?
Ben sentiu um aperto no peito. Não queria contar nada sobre a vida
de Grace à avó dela, sua cliente, a pessoa a quem ele devia sua
lealdade. Não queria informar Emma de que Grace tinha amigos de
todas as classes sociais, que estava fazendo um trabalho admirável,
tirando fotos para um folheto de caridade, um trabalho que serviria
de trampolim para coisas melhores. Não queria sequer revelar que
ela estava feliz. Qualquer coisa que dissesse soaria como traição.
No entanto, já recebera dinheiro pelas despesas daquela missão,
morava em um apartamento alugado por Emma, e já pusera o nome
de sua mãe na lista de espera de uma instituição onde ela viveria
entre amigos, com a melhor qualidade de vida possível.
Em termos profissionais, prometera a Emma que faria o melhor. Em
termos pessoais, prometera muito mais que isso à sua mãe. Devia às
duas. Recusando-se a pensar em que posição isso deixava Grace em
sua vida, concentrou-se na conversa.
— Já estou praticamente no final do meu trabalho. Tenho todas as
informações de que a senhora precisa para ficar tranqüila com
relação à sua neta. Só preciso de mais dois ou três dias.
Ainda tinha de investigar o rapaz que atacara Grace e informar a
polícia sobre suas atividades suspeitas. Quando tivesse certeza de
que a polícia estivesse vigiando o assaltante e que os garotos do
parque estivessem vigiando Grace, Ben daria seu trabalho por
terminado.
— Telefonarei quando tudo estiver resolvido e mandarei um relatório.
Emma emitiu um som abafado, antes de começar a tossir.
— A senhora está bem?
— Sim. Desculpe. Eu só queria dizer que estou impressionada com
sua rapidez.
Ben pensou em Grace nua, o corpo colado ao seu. Ora, a pobre
velhinha não sabia de nada!
— Obrigado — forçou-se a dizer.
— Não preciso de um relatório. Confio na sua palavra.
— Agradeço a confiança, mas é assim que costumo encerrar minhas
missões.
— Bem, foi um prazer trabalhar com você, e estou ansiosa para ver
com meus próprios olhos... Ou melhor, para ler com meus próprios
olhos. Adeus.
Desligou o telefone e começou a arrumar o apartamento, mas não
conseguia tirar os olhos da porta, como se pudesse ver o que
acontecia no corredor. Sentiu-se dividido entre o desejo de ver Grace
de novo e a certeza de que conhecer melhor a família dela só
tornaria a separação ainda mais difícil.
O telefone voltou a tocar.
— Pensei que havíamos terminado — ele disse, ao atender.
— Pessoa errada, amigo.
— Leon! Como vai?
Ben ouviu o motivo pelo qual Leon decidira telefonar e praguejou.
Mais uma vez, foi tomado pela culpa. Deveria ter adivinhado que
Grace não esperaria por ele para resolver os assuntos pendentes. A
maldita independência dela ainda o mataria... especialmente se algo
houvesse acontecido a ela.
Desligou o telefone e deixou o apartamento às pressas.
Quando Ben chegou, deparou-se com a cena descrita por Leon. Uma
pequena multidão cercava um carro da polícia, estacionado diante de
um edifício. Ele começou a transpirar, aflito, mas logo avistou Grace,
sã e salva. Mas somente por que ele ainda não a apanhara.
— Ei, amigo.
Ben virou-se para o jovem alto e magro, cujo talento no basquete
era inigualável, e a quem devia sua eterna gratidão.
— O que aconteceu?
— Sua garota sabe como se meter em encrenca. Ela apareceu com a
câmera pendurada no pescoço, perguntando se alguém viu Bobby,
quando todos sabem que Bobby não quer ser visto. Então, ela levou
o irmãozinho dele para um passeio, quando todos sabem que Bobby
usa Kurt para pequenos serviços. Sabe do que estou falando, não
sabe?
Ben assentiu com expressão sombria.
— Ao que parece, nem todos sabem que o melhor a fazer é ficar
longe de Bobby.
— Isso mesmo, amigo — Leon concordou. — Como eu estava
dizendo, ela ficou sozinha com Kurt e, então, Bobby ficou sozinho
com ela.
Ben sentiu um calafrio na espinha.
— E então?
— Para sorte de todos, a sra. Ramone conhece o filho que tem e
chamou a polícia.
— Antes que alguém se ferisse?
— Isso mesmo. E antes que alguém me veja tagarelando, vou
embora.
— Esteja na quadra, amanhã — Ben instruiu-o.
Então, virou-se para Grace. A multidão se dispersava e os policiais
entravam no carro para ir embora. Ben jamais passaria um sermão
em Grace em público, mas ela não sabia o que esperava por ela,
quando ficassem sozinhos.
— Olá, Gracie — cumprimentou-a, cerrando os punhos junto ao
corpo.
— Ben! O que está fazendo... Esqueça.
Era óbvio que ela estava surpresa por vê-lo, e era ainda mais óbvio
que havia percebido o estado de espírito de Ben, pois tentou recuar
um passo e acabou caindo sentada nos degraus da entrada do
edifício. Exibiu um sorriso maroto, ao qual ele não teria resistido, se
o medo ainda não tomasse conta de todo o seu corpo.
— Conhece a sra. Ramone? Ela é mãe de Kurt, o garotinho lindo da
foto que mostrei...
— Lembro-me da foto — Ben interrompeu-a, falando entre dentes. —
É um prazer conhecê-la, sra. Ramone — cumprimentou a mulher,
notando os olhos vermelhos e inchados, além da tristeza que a fazia
parecer mais velha do que era.
Olhando para ela, Ben viu o que temera ser o fim de sua mãe.
Felizmente, graças ao otimismo dela e à sua própria determinação de
sair do bairro onde viviam, sua mãe se dera bem melhor. Mesmo
afetada pela cegueira e já idosa, parecia mais alegre e mais jovem
do que aquela pobre mulher jamais teria a chance de ser.
A sra. Ramone contou como Grace batera em sua porta, com a
fotografia incriminadora nas mãos, alertando-a de que o filho mais
velho estava envolvido com drogas, e que o caçula corria sério risco
de enveredar pelo mesmo caminho. Então, Grace levara Kurt para
tomar sorvete e, na volta, havia se deparado com Bobby.
— Mas eu havia avisado a polícia e entregue uma cópia da foto —
Grace continuou. — Eles levaram Bobby e só nos resta esperar que
não seja tarde demais para Kurt. Estive me informando sobre um
programa educativo, extra-escola. Se conseguirmos manter Kurt
ocupado com seu aprendizado, talvez ele tenha um futuro melhor
que o do irmão.
Ela tagarelava rapidamente, ainda amedrontada e nervosa, e
visivelmente aflita pela possibilidade de que Ben abrisse a boca para
dizer qualquer coisa.
Levando em consideração que ele ainda tinha vontade de esganá-la,
não poderia culpá-la por isso. Porém, Ben acabara de descobrir outra
coisa: Grace tinha um coração enorme e generoso, e ele a amava
por isso.
Ele a amava e, de jeito nenhum, seria capaz de se afastar dela,
quando encerrasse a sua missão.
Estudou a expressão apreensiva no rosto dela e concluiu que tinha
tanta vontade de sacudi-la por ter se arriscado tanto, quanto de
tomá-la nos braços para sentir que ela estava mesmo segura. Então,
poderia dizer quanto se orgulhava dela, mesmo que seu coração
ainda batesse descompassado pelo medo.
Mas não faria nada disso, pois não tinha o direito de sequer pensar
em Grace como sendo sua, uma vez que tudo o que existia entre
eles baseava-se em uma grande mentira. Uma mentira contada por
ele... que somente ele poderia corrigir.
E ele corrigiria. Tinha de fazê-lo, se pretendia ter alguma chance de
futuro. E era tudo o que Ben desejava.
Sabendo que não conseguiria dizer nada a Grace enquanto não se
livrasse do nó em sua garganta, que ameaçava sufocá-lo, virou-se
para a sra. Ramone.
— Se precisar de qualquer coisa, procure-me.
Retirou a carteira do bolso, apanhou um cartão e entregou-o a ela.
Costumava trabalhar para os mais privilegiados, pois o pagamento
era melhor, mas sempre ajudava amigos em necessidade, no bairro
onde crescera, tão parecido àquele onde estavam.
— Tenho contato com alguns serviços sociais que poderão ajudá-la.
E, se seu filho sair da prisão e quiser se recuperar, diga a ele que me
telefone, pois posso arranjar-lhe um emprego e, ao mesmo tempo,
vigiá-lo.
A mulher abraçou-o, agradecida, e Ben sentiu um misto de aromas
familiares: mofo dos velhos apartamentos, comidas simples e
tradicionais. O cheiro que sua mãe exalava, no passado. As lem-
branças já não eram dolorosas, e Ben sabia que devia isso a Grace,
pois ela o compreendera e o aceitara, mesmo depois de saber quem
ele fora, antes.
Estendeu a mão para Grace.
— Vamos?
Ainda apreensiva, ela pousou a mão na dele e deixou que ele a
ajudasse a levantar.
— Se está pensando em gritar, devo avisá-lo de que meus ouvidos
são muito sensíveis.
Ele riu.
— Você tem várias partes sensíveis, em seu corpo, e eu não
esperaria que os ouvidos fossem diferentes. Mas não se engane, pois
vai ouvir tudo o que tenho a dizer.
Ela revirou os olhos, mas ficou calada.
— Apanharam Bobby Ramone com cocaína. Entre as acusações de
posse de drogas e tráfico, ele deverá ficar um bom tempo, fora de
circulação — Grace declarou.
A expressão dele ainda era ameaçadora. Ben não dissera uma
palavra no metro e, agora que já chegavam no edifício, ela esperava
fazer as pazes, antes que se separassem. Não tinha ilusões. Ben
ainda não se recuperara da visita, de Logan e ainda estava furioso
demais para oferecer-lhe conforto e a segurança de seus braços.
— Não tente se enganar — Ben falou. — Se Bobby delatar os
traficantes maiores, estará de volta às ruas, e você estará de volta
ao ponto de partida.
— Se você estivesse em casa, eu teria avisado que ia ao parque —
Grace disse, cruzando os dedos atrás das costas.
Não contaria a ele que precisava ter resolvido o problema sozinha,
pois tinha de provar a si mesma que era capaz de se cuidar e de
mudar a vida de alguém para melhor... sem a influência do nome ou
do dinheiro dos Montgomery... sem a ajuda de Ben.
— Não minta para mim — Ben ordenou, ainda segurando a mão dela
com firmeza, quando entraram no edifício. — E não se convença de
que está tudo acabado, enquanto eu não houver investigado e me
certificado a respeito.
— Está bem — Grace concordou, percebendo a necessidade dele em
assumir o controle.
No elevador, o silêncio foi total. Grace não conseguiu pensar em
nada para dizer, enquanto Ben não se acalmasse.
Ainda agitado pelo medo, Ben sabia que só conseguiria conversar,
depois que queimasse ao menos parte da adrenalina despejada em
sua corrente sanguínea. Ao sair do elevador, ficou petrificado. Havia
um desconhecido diante da porta do apartamento de Grace, com
uma maleta na mão e, junto aos pés, um aparelho de som portátil e
uma maca dobrável.
— Marcus! — Grace exclamou em um misto de surpresa e prazer,
antes de correr para abraçá-lo.
— Não me diga que esqueceu a surpresa de aniversário que sua avó
faz todos os anos! — ele protestou, fingindo-se ofendido.
— E que surpresa seria essa? — Ben inquiriu. O outro homem virou-
se e estendeu-lhe a mão.
— Marcus Taylor, mestre em massagem, ao seu dispor — apre-
sentou-se.
Ben não permitiria a intromissão de um massagista naquele
momento, especialmente porque mal podia suportar a idéia de
qualquer outro homem tocando o corpo de Grace. Pouco importava
se o sujeito ganhava a vida com aquilo e fosse extremamente pro-
fissional, dessa vez, não seria ele o responsável pelo relaxamento
dos músculos de Grace.
Ben apertou a mão dele e retirou a carteira do bolso.
— Quanto recebeu por essa "surpresa"?
— Ben! — Grace protestou, indignada.
Mesmo assim, Marcus não hesitou em recitar uma quantia que
somente Emma Montgomery seria capaz de pagar por uma hora de
massagem.
— Adiantado — acrescentou.
— Vou lhe dizer uma coisa — Ben falou, contando todo o dinheiro
que tinha. — A srta. Montgomery e eu queremos ficar a sós. Creio
que esta quantia cobre o uso do seu equipamento. Tire a noite de
folga. Deixarei o equipamento com o porteiro, pela manhã.
Grace assistiu à conversa e ao pagamento boquiaberta. Ben tocou-
lhe o queixo, forçando-a a fechar a boca. Ela ficou ali, parada, braços
cruzados, olhos arregalados, mas nem tentou protestar. Ben
experimentou uma pontada de satisfação perversa por saber que ela
preferia o tipo de massagem que ele faria.
— Grace? — Marcus indagou.
Como incentivo adicional, Ben colocou a última nota de cem dólares
que possuía na mão do massagista. Marcus agarrou-a e, com um
sorriso tímido, explicou:
— Vai me ajudar a pagar pelo anel de noivado que minha namorada
pediu.
— Ao menos, será um dinheiro bem gasto — Ben aprovou. Olhou
para Grace, cujos olhos já exibiam o brilho do desejo, e viu os lábios
tentadores se curvarem em um sorriso satisfeito. Ainda tinha um
sermão a fazer, Ben pensou, mas conhecia métodos de persuasão
bem mais eficazes do que gritar. Quanto à sua carteira vazia, alguns
sacrifícios valiam a pena.
Ben expulsara Grace de seu próprio quarto, para cuidar dos
preparativos. Esperando na sala, ela já sentia o desejo crescer
dentro de si, embora soubesse que Ben continuava furioso. Ao
menos, sentira ciúme de Marcus, a ponto de pagar para que ele
fosse embora. Estremeceu, constatando que, por mais que adorasse
sua liberdade, também adorava o jeito dominador de Ben.
Mal podia acreditar que havia se esquecido do ritual de Emma. Desde
que completara dezoito anos, a avó lhe dava uma massagem como
presente. Cuide do corpo, e o espírito o seguirá. Grace tivera
enxaquecas desde a infância, resultado da vida estressante junto dos
pais. Por isso, Emma insistira para que ela se cuidasse e, o que se
iniciara como uma terapia, acabara se transformando em presente
de aniversário.
Quando vivia do seu fundo de pensão, a massagem de Marcus era
um compromisso semanal, incluído em seu orçamento. Agora, mais
velha e mais sábia, Grace sabia que não precisava de tamanho luxo.
Mas também sabia que o presente de Emma tinha um significado
muito mais profundo.
Assim como o de Ben.
— Pode entrar — Ben chamou. — Tire a roupa e cubra-se com o
lençol. Voltarei em um instante.
Ansiosa, ela entrou no quarto e descobriu que Ben se fechara no
banheiro, para lhe dar privacidade, como Marcus teria feito. Despiu-
se, deitou-se de bruços na maca e cobriu-se, para então anunciar:
— Estou pronta!
A porta do banheiro se abriu e Ben aproximou-se.
— Música?
— Sim, a da cachoeira — ela escolheu, pois nenhum som era tão
relaxante como o ruído da água caindo, com o violino ao fundo.
Ele encontrou a fita e colocou-a no aparelho. Então, fechou a janela
e diminuiu a intensidade das luzes. Em seguida, o delicioso aroma do
óleo de massagem invadiu as narinas de Grace e, em questão de
segundos, ela se transportou para um cenário exótico.
Mesmo assim, a expectativa não parava de crescer dentro dela e,
quando Ben, finalmente, deu início à massagem, foi quase como
atingir o clímax.
Com movimentos lentos e suaves e, ao mesmo tempo, firmes e
vigorosos, ele começou pela sola dos pés, fazendo com que a tensão
e o estresse fossem abandonando gradualmente o corpo de Grace.
Então, os dedos longos foram deslizando pelas pernas, sempre em
movimentos circulares e ascendentes, passaram pelos joelhos e
subiram pelas coxas. Até alcançarem um ponto além do qual um
massagista comum jamais iria.
— Não sei se continuamos dentro da definição de massagem.
— Achei que poderíamos mudar as regras, só um pouco — Ben
explicou, deslizando a mão ainda mais para cima. Especialmente,
considerando que amanhã é o dia do seu aniversário. — Inclinou-se
até que seus lábios roçassem na orelha de Grace. — A menos que
você tenha alguma objeção.
— Já disse que fui uma boa menina por tempo demais. Como se as
palavras fossem a permissão que Ben esperava,
ele voltou a passar óleo nas mãos, e prosseguiu com sua massagem,
tornando-a cada vez mais erótica.
A certa altura, Grace espiou por cima do ombro e, por um breve
instante, seus olhos fixaram-se nos dele. Estaria imaginando coisas,
ou havia algo mais que desejo a iluminá-los? De onde viria aquele ar
de desespero?
Sabia que nada daquilo fora planejado. Na verdade, desde a chegada
de Logan, Ben havia se distanciado. Provavelmente, aquela era a
maneira que ele encontrara para se livrar da tensão que sentira
antes. Assim como acontecia com ela. Evidentemente, no caso de
Grace, o desejo também era despertado pelo amor que sentia por
Ben e pela necessidade de ser amada por ele.
Virou-se para fitá-lo novamente, mais ousada do que antes,
determinada a tornar seus momentos com ele inesquecíveis.
— Só fui uma má menina com você — confessou. Sustentando-lhe o
olhar, Ben penetrou-a com um dedo
— Que tal?
— Bom — ela respondeu, estremecendo —, mas você pode fazer
bem melhor do que isso.
CAPÍTULO XI
— Tem razão. Eu posso — Ben concordou e tomou-a nos braços para
levá-la até a cama. — Como eu não sabia que amanhã é o seu
aniversário, não tive tempo de me preparar. Não quero que fique
desapontada.
— Você jamais me desapontaria, Ben. Ah, se ela soubesse!
Ben sentiu o coração disparado no peito. Talvez seu tempo juntos
estivesse chegando ao fim, mas ele não abriria mão dela sem antes
lutar. No momento, nada podia fazer, mas a primeira coisa que faria
na manhã seguinte, seria livrar-se daquela teia de mentiras.
— Não quero presentes — ela disse. — Só quero você.
— Nesse caso, estamos quites, querida, pois o que tenho para lhe
dar vem do meu coração. Mas preciso da sua cooperação e da sua
confiança.
— Você tem as duas coisas. Ah, se fosse tão simples!
Ben queria fazer daquele aniversário o mais inesquecível da vida de
Grace.
— Aconteça o que acontecer, lembre-se de que você me forçou a
isso.
— Do que está falando?
— Não posso permitir que essas mãos deliciosas me distraiam. Além
disso, já está na hora de você saber como é se sentir indefesa, como
me senti hoje, quando soube você havia desaparecido.
Embora continuasse não entendendo onde ele pretendia chegar,
Grace esperou, paciente e curiosa.
Então, Ben abriu a gaveta do criado-mudo e retirou os lenços que
guardara lá.
— Quero que se sinta bem com isso — disse.
— Não há nada que você faça que possa me deixar mal — ela
garantiu.
Ben pôde ver a si mesmo através dos olhos dela e desejou ar-
dentemente ser tudo o que ela imaginava. Usou um dos lenços para
amarrar a mão dela à cabeceira da cama. Então, repetiu o processo
com a outra mão.
— Confortável?
— Excitada.
— É essa a idéia.
Grace fitou-o nos olhos, sabendo que estava dizendo a mais pura
verdade. Nunca antes confiara em qualquer ser humano de maneira
tão completa, a ponto de entregar seu corpo, seu coração e sua
alma. Então, estudou-lhe as roupas folgadas, que pareciam torná-lo
ainda mais sexy.
Ah, amava aquele homem mais do que a si mesma. Deixá-lo partir
acabaria com ela, mas estava disposta a manter sua promessa e
permitir que ele fosse embora, caso Ben assim escolhesse.
— Precisa fazer uma coisa para mim.
— Não me parece que esteja em posição de pedir qualquer coisa —
ele lembrou com uma risada.
— Tire a roupa, Ben. Então, poderá fazer comigo o que bem
entender.
Com um suspiro trêmulo, ele obedeceu.
Ao vê-lo nu, Grace descobriu-se incapaz de desviar os olhos daquele
espetáculo de virilidade. Instantaneamente, seus mamilos
enrijeceram. Mesmo que quisesse, não haveria como disfarçar sua
reação a ele, mas Grace não queria esconder nada. Abrir-se para ele
por inteiro era a sua única chance de mantê-lo ao seu lado, quando o
fogo da paixão se dissipasse.
A mão grande e forte acomodou-se com familiaridade entre suas
pernas.
— Ah, você está tão quente, tão pronta para mim — ele murmurou.
Grace fechou os olhos e entregou-se às sensações, a Ben. Sentiu os
movimentos do colchão quando ele mudou de posição, mas foi
apanhada de surpresa pelo contado dos lábios quentes com a parte
interna de sua coxa. E ficou ainda mais surpresa quando aqueles
mesmos lábios depositaram beijos nos recantos mais íntimos de sua
feminilidade.
Ben deu início a uma tortura sensual, lenta e cuidadosa, explorando,
testando, provocando, levando-a até quase os picos do prazer, mas
nunca permitindo que ela o alcançasse.
Grace descobriu que cada reação sua resultava em uma ação dele.
Aquele não era um homem que conhecia as mulheres, mas sim um
homem que se dedicava de corpo e alma a conhecê-la muito bem.
Quando já não podia suportar nem mais um minuto daquela tortura,
Grace implorou:
— Por favor! Ah, Ben, por favor!
Seus olhos continuavam fechados, as mãos agarravam a cabeceira
da cama com força, seu corpo encontrava-se prisioneiro da tensão do
desejo que ameaçava sufocá-la.
De repente, Ben estava sobre ela, penetrando-a, preenchendo-a,
dando exatamente o que ela pedira. Então, recuou.
— De novo! — Grace ordenou com uma voz que ela mesma não
reconheceu.
E como reconheceria, quando todo o seu corpo não se parecia em
nada com o corpo que ela conhecia como sendo seu? Abriu os olhos
e deparou com os de Ben. Reconheceu neles o mesmo fogo que a
incendiava, mas ele permaneceu imóvel, como se esperasse por
alguma coisa.
— Ben! — Grace praticamente gritou, erguendo os quadris. A
satisfação tomou conta das feições de Ben e, então, ele voltou a
penetrá-la. Àquela altura, nada mais poderia impedir o clímax que
ele havia adiado por tanto tempo. Enquanto Ben movia-se dentro
dela, Grace perdeu totalmente o controle sobre si mesma, tomada
por um orgasmo violento, que parecia interminável, provocando uma
verdadeira explosão em suas entranhas, deixando-a mais vulnerável
e exposta do que nunca.
Mas não estava sozinha. Ben estava com ela, abraçando-a, aca-
riciando-a, e explodindo em êxtase no mesmo instante, com igual
intensidade.
Quando os tremores finalmente cederam, deixando-os exauridos,
Ben deixou-se cair sobre Grace, que recebeu seu calor e seu peso de
bom grado.
— Feliz aniversário, Gracie — ele sussurrou ao seu ouvido. Eu te
amo, ela pensou, mas guardou as palavras para si, temendo que ele
não as quisesse ouvir.
Ben soltou o tecido que prendia as mãos dela e puxou-a para si,
massageando-lhe os punhos delicados. Só agora dava-se conta da
magnitude da confiança que Grace depositara nele. Ali estava uma
mulher que valorizava a sua liberdade, mas que lhe permitira
prendê-la, sem fazer perguntas.
— Você está bem?
— Nunca estive melhor.
Com Grace nos braços, relaxou debaixo das cobertas, tomado por
uma felicidade tão grande que chegava a assustá-lo.
Ele, um homem que nunca precisara de ninguém, precisava daquela
mulher assim como precisava de oxigênio para respirar. Não era uma
admissão fácil. E não havia solução fácil.
Exceto a verdade.
O que ele não estava pronto a revelar. Ao menos, não antes de
resolver algumas coisas, e não em um aniversário que ele prometera
a si mesmo tornar inesquecível para Grace.
— Grace, precisamos conversar.
A mão dela deslizou pelo seu ventre, deixando-o pronto a possuí-la
de novo.
— Conversas nem sempre são importantes — Grace argumentou.
— São, quando se trata da sua segurança. Você se arriscou demais,
hoje.
— Eu sei, mas não queria perder tempo.
— Respeito a sua independência, mas da próxima vez que tentar
algo parecido, terei de usar isso — Ben advertiu-a, sacudindo os
lenços no ar.
— E acha que isso vai me deter? — ela provocou, mas logo
recuperou a seriedade. — Tem razão. Eu me arrisquei, sim. Sinto
muito se o deixei preocupado e estou agradecida por ter ido me
ajudar.
— Não está zangada? Ela deu de ombros.
— Tenho pensado muito, ultimamente. Consegui me libertar da
minha família, do dinheiro e da dependência. Para isso, precisava
provar a mim mesma que era capaz de me cuidar sozinha. Lamento
ter assustado você, com isso.
— Acho que posso perdoá-la — Ben concedeu, beijando-lhe a testa.
— Você é muito generoso. — Grace soltou uma gargalhada. — Acho
que não há nada de mau em ter você como protetor, quando for
necessário. Na verdade, é bom ter alguém que se importa comigo a
ponto de querer cuidar de mim. É melhor do que alguém que. faça
isso porque meu pai pagou.
Ben respirou fundo. Detestava viver aquela mentira. Mais algumas
providências, e tudo estaria terminado. Era uma pena ele não saber
como a história terminaria.
— Você precisa esquecer os costumes dos Montgomery e deixá-los
para trás.
Grace aconchegou-se nos braços dele.
— É mais fácil, com você por perto.
Percebendo que ela bocejava, Ben apagou a luz. O silêncio tomou
conta do quarto. Não imaginara que encontraria tamanha paz junto a
uma mulher. Especialmente, uma mulher como Grace, neta de sua
cliente, vinda de uma família tão diferente da sua.
No início, acreditara que ela não demoraria a sentir falta do luxo que
abandonara. Agora, porém, conhecendo-a tão intimamente, sabia
que isso não aconteceria.
E só lhe restava enfrentar a batalha que estava por vir, e lutar até a
última gota de sangue para não perdê-la.
Grace não saberia dizer o que a fizera despertar, mas simplesmente,
não conseguia mais dormir. Levantou-se e acendeu um pequeno
abajur no canto do quarto. Sorriu ao ver que Ben continuava
dormindo, pois sabia que o deixara exausto.
Estudou p homem adormecido em sua cama, sua beleza máscula,
sua virilidade. Se desejo fosse tudo o que sentisse por ele, a vida
seria bem mais fácil. Mas, por trás da fachada dura e resistente,
havia um homem gentil e generoso, que enfrentara uma infância
difícil, que amava e cuidava da mãe doente, que ajudava crianças
pobres e que desconhecia limites para proteger Grace e seu bem-
estar. Aquele era o homem que ela amava.
Sem produzir ruídos, Grace atravessou o quarto, apanhou a câmera
e pôs-se a tirar fotografias. Já fotografara bem realizando inúmeras
atividades, mas o homem em sua cama era o homem de seus
sonhos. Se não captasse em filme aquele momento, talvez nunca
mais tivesse uma oportunidade. E algo lhe dizia que, muito em
breve, fotos seriam tudo o que ela teria de Ben Callahan.
CAPÍTULO XII
Dar a Grace a liberdade para ir ao trabalho e ao parque, no dia
seguinte, foi uma das tarefas mais difíceis que Ben já enfrentara.
Não porque estivesse preocupado com a segurança dela, mas porque
isso representava o fim.
O fim do trabalho para Emma era, na verdade, uma bênção. Por
definição, Ben fizera tudo o que sua cliente pedira e sua missão fora
cumprida. Ele tentou falar com Emma durante toda a manhã, mas
segundo os criados, ela não estava disponível para atender
telefonemas. Ben não sabiá o que isso significava, exceto que teria
de adiar seu relatório final, um relatório que ele já não queria
apresentar.
Consultou o relógio. Eram quase cinco horas e ele ainda não levara o
equipamento de massagem à portaria. Retirou do bolso das chaves
que Grace lhe dera ç entrou no apartamento.
Mal pisou no quarto, sentiu o aroma do óleo de massagem que
sempre o faria lembrar dela, os punhos amarrados, os olhos fe-
chados, o corpo serpenteando. Aproximou-se do criado-mudo para
recolher os produtos de Marcus, mas algo sobre a cama chamou sua
atenção.
Só então, deu-se conta de que Grace não dissera que iria
diretamente ao estúdio, pela manhã. Essa fora uma conclusão que
ele havia tirado por si mesmo. Agora, via que ela estivera ocupada
com a revelação de fotos, também.
Sobre a cama, havia um álbum ainda sem uso, e uma porção de
fotos. Fotos de Ben retirando sua bagagem do Mustang, jogando
basquete no parque, lavando o carro, dormindo na cama de Grace.
Foi um choque. Pela primeira vez na sua vida, teve um vislumbre do
que era ser investigado, em vez de investigador, de ser observado
sem saber. Nunca antes considerara os sentimentos das pessoas que
investigava, mas agora sabia. Teria se sentido violentado e invadido,
se a autora das fotos não fosse Grace.
Sentou-se na beirada da cama e examinou cada fotografia. Já sabia
que Grace era excelente fotógrafa, mas aquelas fotos revelavam as
diferentes facetas de sua personalidade. Todas elas mostravam
sentimentos e emoções. Grace dissera que suas fotos refletiam seus
sentimentos pelo mundo ao seu redor. Vendo a si mesmo através
dos olhos dela, Ben deu-se conta de que Grace estava tão envolvida
quanto ele.
E ele estava apaixonado.
Por mais que houvesse contemplado os próprios sentimentos, não
ocorrera a Ben que Grace poderia estar apaixonada, também.
Estivera absorvido demais pela impossibilidade daquele relacio-
namento e pelas diferenças que os separavam.
Diferenças que ainda existiam.
Com o coração disparado, deu-se conta de que não haveria como
não magoá-la profundamente. Amava Grace, respeitava-a e admi-
rava-a, mas seria ela capaz de perdoá-lo, quando descobrisse a
verdade? Quando descobrisse que, enquanto estivera lutando para
construir uma vida independente do nome Montgomery, fora en-
ganada por um homem contratado por sua avó para investigar sua
vida?
Devolveu as fotos ao seu lugar e levantou-se. Olhou pela última vez
para a cama onde passara os melhores momentos de sua vida e
saiu. Não queria estar lá quando Grace chegasse, pois precisava de
tempo para pensar.
A verdade que poderia dar a eles um futuro, também poderia
destruí-los. Mas, mesmo que quisesse ser honesto com Grace, a
ética profissional e seu respeito por Emma exigiam que ele falasse
com ela, primeiro, antes de revelar a mentira criada por ambos.
Se Emma ficasse furiosa, e tinha todo o direito de ficar, poderia
exigir que ele lhe devolvesse o dinheiro que ela lhe pagara. E Ben
tinha de pensar na situação de sua mãe, antes de tomar uma decisão
egoísta. Se fosse somente ele, estaria pronto a devolver cada
centavo, mas era responsável pelo bem estar de sua mãe, também.
Sua mãe compreenderia, pensou. Podia retirar esse fardo de sobre
os ombros. Tendo conhecido o amor, ela não negaria ao filho a
mesma bênção, mesmo que para isso tivesse de adiar a sua
mudança.
Mas Ben gostava demais da mãe e de Grace, e teria de encontrar um
meio de fazer as duas felizes. Trataria de encontrar outra maneira de
pagar pelos cuidados que a mãe necessitava, aceitaria mais casos e
seria menos exigente para com seus clientes. A chance de ter Grace
ao seu lado valia qualquer sacrifício.
Porém, ainda havia o maior risco de todos, o que mais o ater-
rorizava. Quando soubesse de toda a verdade, Grace poderia não
querer vê-lo de novo.
Grace deixou o estúdio apressada. Não sabia por que, mas sentia
uma compulsão de chegar em casa, como se temesse que Ben
pudesse desaparecer, se ela não chegasse logo. Por isso, correu,
prometendo a si mesma que, assim que o visse, diria aquela palavra
que os homens temiam, que ela mesma temia.
Mas Grace cansara de se esconder. Antes de conhecer Ben, sabia
que tinha de sair de sua concha, deixar a proteção oferecida pelo
nome e pelo dinheiro dos Montgomery. E conseguira livrar-se de
tudo aquilo, mas fora somente depois de ter se envolvido com Ben
que ela descobrira sua verdadeira essência como mulher.
Grace Montgomery não se deixava impressionar por dinheiro ou
posição social e, menos ainda, por aparências. Importava-se apenas
com o que existia no coração das pessoas.
Embora a beleza de Ben a houvesse atraído, no início, o que a
aproximara dele fora sua honestidade. Mesmo enquanto admitia ter
uma aversão a compromissos, ele lhe confiava a verdade.
Por isso, antes que se separassem, Grace sentia que devia a ele a
verdade. Amava-o e tinha a intenção de dizer isso a ele, mesmo que
a declaração o afastasse de vez.
Entrou no apartamento, surpresa por ter encontrado a porta aberta.
Deixara as chaves com Ben, para que ele devolvesse o equipamento
de Marcus, mas não podia acreditar que ele fosse descuidado a ponto
de deixar a porta destrancada.
— Ben? Ainda está aqui? — chamou.
— Ainda? Acabei de chegar. Foi a viagem mais longa de minha vida!
Se eu ainda tivesse minha carteira de motorista, teria vindo a cento
e vinte por hora, mas seu pai se certificou de que eu jamais possa
me sentar ao volante de um carro de novo. Imagine passar três
horas, sentada em uma limusine, com um motorista que não passa
de oitenta!
— Vovó? — Grace largou a bolsa e correu para a sala.
— Quem mais tem a chave de seu apartamento? — Emma indagou,
abrindo os braços.
No instante seguinte, Grace estava nos braços da avó, sentindo-se
segura e amada.
— Primeiro, Logan e Cat. Agora, você. O que está fazendo aqui?
— Acha que eu deixaria mais um aniversário passar, sem visitá-la? —
Emma afastou a neta e inspecionou sua aparência. — Você está
linda. Poderia engordar um pouco, mas ainda é a minha Gracie.
Com um nó na garganta, Grace pensou que fazia muito tempo que a
avó não usava o seu apelido de infância. Tanto tempo, que nem
mesmo quando Ben a chamara assim, ela se lembrara do fato.
Também examinou a avó. Embora parecesse mais velha, continuava
forte, a postura imponente, as roupas e cabelos impecáveis, mesmo
depois de uma longa viagem.
— Você também está ótima, vovó.
— É claro que estou — Emma confirmou com um sorriso. — Ainda
bem que você saiu a mim. Mas está fugindo à minha pergunta.
Quem mais tem a chave do seu apartamento?
Grace puxou-a até o sofá e as duas se sentaram.
— Temos muito o que conversar — declarou.
De repente, os meses de silêncio se tornaram um fardo, e ela queria
contar tudo à única pessoa que a compreenderia e aceitaria. Emma
não faria julgamentos, pois havia criado Grace para ser dona de si,
mas quando conhecesse Ben, faria tantas perguntas, que ele
imaginaria estar sendo interrogado por uma agente da CIA. E Grace
tinha de tentar evitar isso.
— Conheci um homem — começou, decidida a não omitir nada — e
estou apaixonada por ele.
Naquele exato momento, ouviram uma batida na porta, seguida pelo
ruído da chave na fechadura. Era Ben. Ele não poderia ter chegado
em pior hora. Grace não tivera tempo de dar as informações
necessárias a Emma, nem de avisá-lo sobre o que o esperava. Além
disso, a visita de Emma a impediria de confessar seus sentimentos a
Ben.
Ainda assim, Grace não lamentava a presença da avó, pois sentira
tanta falta dela quanto do irmão.
— Imagino que seja ele — Emma murmurou.
— Sim, e trate de se comportar!
— Eu sempre me comporto. É ele o vizinho que Logan conheceu?
— Ele mesmo — Grace confirmou, na esperança de que o irmão
houvesse sido discreto.
— Grace? — Ben chamou, enquanto se adiantava para a sala. —
Precisamos conversar.
Emma riu.
— Parece que todos estão precisando conversar, por aqui —
comentou.
— Quieta, vovó!
— Espero que seja uma boa hora... — Ben parou de falar quando se
deparou com Grace e sua visitante.
— Olá, Ben — Grace cumprimentou-o.
Ele balançou a cabeça em resposta, visivelmente chocado, e Grace
calculou que eram surpresas demais em tão pouco tempo.
— Quero apresentar-lhe minha avó. Já falei tanto dela, que deve
sentir como se já a conhecesse.
O sorriso de Ben foi forçado.
Claro, pensou Grace, que ele não ficaria feliz diante da perspectiva
de ser apresentado à família tão cedo. Mesmo assim, era bom ver as
duas pessoas a quem mais amava, frente a frente.
— Ben, esta é minha avó, Emma Montgomery. Vovó, este é meu...
novo vizinho, Ben Callahan.
— Muito prazer — Emma declarou comum sorriso radiante,
estendendo a mão.
— Igualmente — Ben murmurou, apertando-lhe a mão com
suavidade.
— Ora, eu esperava um aperto de mão mais vigoroso do homem
escolhido por minha neta.
Grace não conteve uma risada.
Corando, Ben apertou a mão de Emma com mais força.
— Assim é melhor. Agora, sentem-se e contem-me todos os
detalhes. Na minha idade, raramente tenho a oportunidade de ouvir
histórias interessantes e picantes. Com seus pais dormindo em
quartos separados, a vida em casa mais parece a de um convento.
Grace revirou os olhos. Todos sabiam que seus pais dormiam em
quartos separados havia muitos anos, mas o comentário carregado
de insinuações sexuais deixou Ben visivelmente embaraçado. Com
um suspiro, Grace concluiu que, se não tivesse cuidado,
Emma assustaria Ben muito antes de as palavras "eu te amo" serem
pronunciadas.
— Comporte-se, vovó.
Á avó fez um gesto insolente.
— Está bem, mas sentem-se e contem-me tudo.
— Sra. Montgomery...
— Emma — ela corrigiu. — E estou muito satisfeita por encontrá-lo
aqui. Se minha neta o escolheu, eu aprovo. Gracie, abra uma garrafa
de vinho.
Grace estreitou os olhos. Esperava que Emma aprovasse sua
escolha, mas não antes de bombardear Ben com perguntas inter-
mináveis. Era, definitivamente, estranho que a avó agisse de ma-
neira tão incomum.
— Por que não tentam se conhecer melhor, enquanto procuro por
uma garrafa de vinho? — sugeriu, na esperança de que, se os
deixasse sozinhos, Emma começaria a falar e acabaria com aquela
apreensão desagradável que tomara conta de seu peito.
— Boa idéia — Emma concordou. — Sente-se, Ben.
Com um suspiro, Grace disse a si mesma que tudo daria certo.
Percebendo a hesitação de Ben, disse:
— Não a deixe intimidá-lo, Ben. Então, desapareceu na cozinha.
Depois de procurar e descobrir que não tinha nenhuma bebida em
casa, Grace espiou pelo vão da porta, e viu Ben e Emma sentados
muito próximos, conversando baixinho, como dois conspiradores.
A estranha apreensão voltou a tomar conta dela. Voltou para a sala,
que mergulhou em um silêncio ainda mais preocupante.
— Não temos vinho — declarou. Emma deu de ombros.
— Sei que vocês duas devem ter muito o que conversar... — Ben
falou, começando a se levantar.
— Por favor, não vá — Grace pediu, pousando a mão em seu ombro.
Ele voltou a se acomodar no sofá.
— Sua avó disse que gostaria de ver o meu Mustang.
— Disse?
— Sim, adoro carros velhos. Grace estreitou os olhos.
— Desde quando? Sempre gostou de carros novos, quanto mais
novos, melhor. Não foi o que disse, quando o juiz se recusou a trocar
o velho Lincoln? Chegou a falar em enterrá-lo no carro.
— Ah, sim, mas seu pai é um sujeito insuportável. O carro velho de
Ben deve ter personalidade.
— Você mal conhece Ben, portanto, não pode saber disso — Grace
declarou, de mãos na cintura. — E não fez nenhuma pergunta
embaraçosa, desde que ele entrou por aquela porta. Isso não é do
seu feitio, mesmo com pessoas que já conhece. E, como nunca viu
Ben antes, ele é o candidato perfeito para as suas... — a voz de
Grace sumiu no ar.
Lembrou-se de como a avó aproximara Logan e Cat... Impossível!
Emma e Ben jamais haviam se encontrado, antes.
— Meus instintos não me enganam, querida — Emma dizia. — Ele me
parece ser um bom rapaz e eu confio no seu julgamento.
Mas Grace também se lembrou das palavras zombeteiras da avó, na
festa de casamento de Logan: "Grace, você é o meu projeto final. Eu
me recuso a partir dessa terra, antes de vê-la casada e feliz. Acho
que está na hora de eu fazer uma viagem a Nova York."
Grace sacudiu a cabeça, repetindo para si mesma que aquilo era
impossível. Mas, então, por que os dois pareciam tão culpados?
— O que estão escondendo?
— Não estamos escondendo nada. Estou apenas satisfeita por saber
que tudo deu certo, como eu esperava.
— O que você esperava?
— Ora, você sabe, querida. Quero vê-la feliz — Emma respondeu,
ligeiramente constrangida.
— E o que você fez para que isso acontecesse? É evidente que vocês
dois estão escondendo algo.
— Bobagem — Emma declarou, mas não a fitou nos olhos.
— Ben? O que minha avó está escondendo de mim?
— Grace, podemos falar sobre isso mais tarde, quando estivermos
sozinhos?
Grace sentiu a boca seca.
— Até agora, era só um palpite, mas você deixou claro que há algo
que não sei. Portanto, tratem de me contar tudo. Agora!
— Prefiro deixar para depois — Ben insistiu^ relutante. Emma
pousou a mão no braço de Ben.
— Acho que ela nos encurralou — murmurou, nem um pouco feliz
com a situação.
— Do que estão falando? — Grace inquiriu com voz trêmula.
— Dessa farsa — Ben esclareceu, aproximando-se e tentando
acariciar-lhe o rosto.
Grace recuou um passo.
— Então, vocês se conhecem.
— Nós nos vimos uma vez. Grace cruzou os braços.
— Não tente ser evasiva, vovó. Como se conheceram? Onde?
Após um longo momento de silêncio, durante o qual Ben e Emma
fitaram-se, como se tentassem decidir qual dos dois contaria a
verdade, Ben falou:
— Nós nos conhecemos na mansão Montgomery, há algumas
semanas, quando sua avó me contratou.
— Contratou?
Tal cenário jamais ocorreria a Grace.
— Por favor, Grace, vamos conversar mais tarde — ele implorou.
— Contratou para quê?
— Para investigar você e informá-la sobre as suas atividades.
As palavras pareciam estar sendo arrancadas dele, provocando-lhe
dor intensa. Mas nem tal reconhecimento aliviou o golpe para Grace.
— Mas você precisa compreender os motivos de Emma — ele
continuou. — Você não dava informação alguma, e ela estava muito
preocupada.
— É muito gentil de sua parte tentar defender minha avó, mas isso
não muda nada.
Grace sentou-se em uma cadeira, tomada por uma agonia terrível. O
homem que ela pensara não ter qualquer relação com os
Montgomery, fora pago para lhe dar toda aquela atenção. Não se
interessara pela vida dela, nem cuidara do seu bem-estar, porque se
importava com ela, de verdade. Não havia se apaixonado por Grace,
simplesmente.
O sentimento de traição tornou-se maior, formando um imenso nó
em sua garganta. Não era de admirar que ele não pudesse prometer
nada, além do breve período que tinham juntos. Quando Emma
deixasse de pagar suas despesas, Ben partiria.
Grace ergueu os olhos e não se surpreendeu por descobrir que os da
avó mantinham-se fixos no chão. Os de Ben, porém, estavam fixos
nos dela. Grace já vira aqueles olhos iluminados pelo riso e pela
paixão. Agora, via um misto de sentimentos e emoções, ao qual
queria se agarrar com unhas e dentes.
Ah, como era patético, ela pensou. Só porque queria encontrar um
raio de esperança, estava disposta a ver sentimentos onde eles não
existiam. Acreditara conhecer Ben, mas olhando:o, naquele
momento, dava-se conta de que não sabia quem ele era. E isso doía.
— Grace...
Ela sacudiu a cabeça. Não queria ouvir nada. Que desculpa poderia
haver para uma mentira tão colossal? Fazer o seu trabalho
justificaria o relacionamento de bons vizinhos, mas quando haviam
se tornado amantes, ele poderia ter lhe contado a verdade, mesmo
que não quisesse assumir qualquer compromisso.
— Se me deixar explicar — Emma falou pela primeira vez, soando
frágil.
Grace compreendeu o que a avó sentia, pois também se sentia
prestes a se partir em mil pedaços. E era o que aconteceria se
ouvisse mais alguma coisa. Tinha de sair dali, afastar-se das duas
pessoas a quem mais amava, e que a haviam traído.
CAPÍTULO XIII
Grace saiu do apartamento e bateu a porta atrás de si. Ben não
tentou impedi-la, pois a dor nos lindos olhos castanhos era mais do
que; ele podia suportar. Se afastar-se ajudaria, então, seria melhor
deixá-la ir.
Virou-se para Emma, que parecia vinte anos mais velha.
— Tinha de haver uma maneira melhor de contar a ela — ela
murmurou.
Ben não sabia se Grace teria ficado menos abalada se houvesse
sabido por ele, quando estivessem a sós, mas jamais saberia. A
chegada inesperada de Emma destruíra qualquer possibilidade de
uma explicação gentil.
— Tive a melhor das intenções, mas acabei magoando minha neta.
Ben pousou a mão no ombro de Emma.
— Não foi sua culpa.
Se ele houvesse se limitado a fazer o seu trabalho, sem se envolver
com Grace, nada disso teria acontecido. Evidentemente, não teria
vivido os melhores momentos de sua vida, mas ele não contava. Só
Grace importava.
— Sente-se, Benjamin.
Surpreso pelo uso de seu nome, que nem a mãe usava, Ben sentou-
se.
— Não vou permitir que você assuma a culpa pelas minhas
armações. Ouvi excelentes referências suas, no campo profissional,
mas assim que pus os olhos em você, soube que era o homem certo
para Grace. Foi instinto feminino, eu acho.
— Está dizendo que me contratou para fazer o trabalho de
investigador, mas queria que eu me envolvesse com sua neta?
Emma assentiu.
Ora, ele fora tão manipulado quanto Grace, mas Ben duvidava que
ela fosse se sentir melhor com isso. E, considerando que ele tivera a
chance de escolha, durante todo o tempo, ainda era culpado por suas
ações e pelo sofrimento que causara.
De punhos cerrados, encarou Emma.
— Não me agrada ser feito de tolo.
— Vi o brilho em seus olhos, quando lhe mostrei a fotografia de
Grace. E não pode negar a atração que os envolveu, nem que se
apaixonou por ela, pode?
Ben sentiu um aperto no peito. Admitir a verdade para si mesmo e
ouvir as palavras pronunciadas e voz alta eram coisas muito
diferentes. Mas ele não poderia mentir para a avó que Grace tanto
amava. Mesmo que Emma houvesse manipulado os dois, mesmo
diante da possibilidade de ter perdido Grace para sempre.
— Já não sei se meus sentimentos fazem alguma diferença, agora.
Não creio que ela vá perdoar tantas mentiras e, francamente, não
posso culpá-la por isso.
Olhou em volta, pensando que até mesmo a decoração cara e
elegante do apartamento fazia parte da personalidade de Grace, que
ele tanto adorava. De repente, Emma deu-lhe um forte tapa no
ombro.
— O que foi? — ele indagou, sobressaltado.
— Você é muito parecido com Logan, em certas coisas. Não fique
sentado, esperando que tudo aconteça. Tem de lutar pelo que quer.
Se está sem idéias, posso ajudá-lo...
— Não, obrigado. — Ora, ela já havia interferido demais. — Posso
cuidar disso sozinho.
Embora duvidasse que pudesse alterar o desfecho da história,
poderia ao menos conversar com Grace, antes que ela o expulsasse
de vez de sua vida. Ela merecia saber e compreender o que motivara
o seu comportamento, mesmo que a explicação não compensasse a
dor causada pela mentira.
Ben levantou-se.
— Quer alguma coisa, antes que eu vá embora? Emma ergueu olhos
preocupados.
— Quero saber se minha neta está bem. Ben tomou as mãos dela
nas suas.
— Grace está bem. Ao menos, estava, até esta noite. Não haverá
outro relatório, nem escrito, nem falado.
Emma assentiu, compreensiva.
— Não quero mais saber detalhes, pois sei que estava errada.
— Isso é bom, pois não posso dar mais qualquer informação sobre
Grace e, depois, conviver comigo mesmo. Mas posso devolver o
'dinheiro que a senhora gastou comigo. Na pior das hipóteses,
pagarei em prestações.
— Não diga bobagens! Você fez o seu trabalho e costumo pagar
pelos serviços que contrato.
Aquele era o maior dos problemas. Se Ben aceitasse o dinheiro de
Emma, Grace jamais acreditaria que ele estava interessado somente
nela, e não no seu nome, ou no seu dinheiro. Se não aceitasse, ela
não acreditaria nele. Afinal, Ben destruíra o valor que ela demorara
tanto a provar para si mesma que possuía.
— E inútil falarmos em dinheiro, agora.
— Tem razão. Seu tempo seria melhor aproveitado se estivesse
tentando encontrar Grace. Portanto, sugiro que faça isso, agora.
— Antes que eu vá, diga-me uma coisa. Por que está disposta a
aceitar alguém que não tem a posição de sua família, alguém que vai
deixar o pai de Grace furioso?
Emma exibiu um sorriso largo.
— É simples. Você faz minha neta feliz.
Fizera, Ben pensou, mas não fazia mais.
No entanto, era impossível guardar rancor ou mágoa de Emma, por
mais problemas que ela houvesse causado. Ela tinha um coração de
ouro.
Assim como Grace.
E Ben havia partido aquele coração. Só esperava poder desfazer ao
menos parte do que fizera. Do contrário, teria de viver com as
conseqüências e o vazio... pelo resto de sua vida.
Ben encontrou Grace no parque, sentada na beirada do tanque de
areia. Parecia uma criança que havia perdido seu melhor amigo,
quando na verdade, era uma mulher que acabara de perder o
amante, o homem em quem depositara toda a sua confiança.
Ele se aproximou e sentou-se ao lado dela.
— Olá.
Ela não ergueu os olhos.
— Imagino que essa seja apenas uma das desvantagens de você ser
investigador particular. Consegue encontrar pessoas que não querem
ser encontradas.
— Se não quisesse ser encontrada, você não teria vindo para cá. Não
a encontrei devido à minha habilidade profissional, mas sim porque
conheço você.
— E uma pena que eu não possa dizer o mesmo.
Grace riu, mas o som não se pareceu em nada com a risada alegre e
despreocupada que ele passara a gostar de ouvir. Ben sentiu um
forte aperto no peito, ao pensar que havia tirado aquilo dela.
Tudo o que poderia fazer era explicar.
— Quando aceitei o caso, eu não a conhecia. Trabalhar para Emma
era apenas mais uma missão.
— Muito bem paga, sem dúvida.
— Faria diferença se eu dissesse que precisava do dinheiro para
instalar minha mãe em um local adequado às suas limitações?
— Não estou zangada por você ter aceito o trabalho. Só não entendo
como pôde dormir comigo, sabendo que estava recebendo dinheiro
para se aproximar de mim. Não entendo como pôde partilhar tudo o
que partilhou comigo, sem sequer pensar em me contar a verdade.
Grace fez uma pausa, para secar uma lágrima que escapara de seus
olhos. Então, fitou-o com aqueles lindos olhos castanhos, que haviam
perdido o brilho que os iluminava.
— E, acima de tudo, não entendo como pode deixar que ele
acreditasse que nosso relacionamento era a única coisa em minha
vida que não tinha qualquer ligação com o nome e o dinheiro do
minha família. Você conhecia a importância da minha liberdade...
Mas você... Acreditei que você não podia ser comprado, nem por
mim, nem por ninguém. No entanto, foi exatamente o que acon-
teceu. Emma comprou você para mim.
— Grace...
— Ela contratou os seus serviços de investigador particular, somente
para aproximá-lo de mim. Tinha esperança que você se apaixonasse
por mim, pois não acreditava que eu possuía o valor necessário para
conseguir isso sozinha.
A idéia que Grace fazia dele quase o deixou doente. Nem por um
instante, ocorrera a Ben que fora comprado para se apaixonar por
Grace.
— Posso falar, agora? — perguntou.
— À vontade, mas saiba que é tarde demais.
— Talvez seja, mas não irei embora, enquanto você não ouvir tudo o
que tenho a dizer.
— Ah, sim, liberdade de expressão! Não posso negar esse direito a
você.
— Ora, obrigado, mas a questão é bem mais séria. Grace fitou-o por
um momento.
— Mais séria do que os direitos constitucionais? Nesse caso, acho
melhor você falar tudo.
Ben segurou-lhe a mão com firmeza.
— Não sei se vou conseguir me expressar com clareza. Estou muito
confuso, mas vou tentar. — Sabendo que aquela era a sua última
oportunidade de conquistar a mulher que amava, estava disposto a
lutar até o fim. — Nunca foi um simples trabalho. Desde o momento
em que vi a sua fotografia...
— Viu a minha fotografia? Ora, Emma exibe a minha fotografia para
todos os homens solteiros que conhece! Continue.
— Desde o momento em que vi a sua fotografia, fiquei envolvido.
Disse a mim mesmo que deveria desistir do caso, mas não fui capaz
de fazê-lo.
— Pelo dinheiro.
— Por minha mãe, pelo dinheiro e por você. As três coisas se
misturaram. Minha mãe precisa de mais cuidados do que posso lhe
proporcionar. Eu precisaria de seis meses a um ano, aceitando
missões que rejeitaria em circunstâncias normais, para poupar o
suficiente para instalá-la no lugar mais adequado.
Grace pousou a mão no braço dele, em um gesto inesperado.
— Você a ama, e eu compreendo isso.
— Não sei se compreende, Grace. Você cresceu em uma mansão, e
eu, do outro lado da escala. Sei que, mesmo sem o dinheiro, eu me
saí melhor que você, pois tive amor, e você, não. Passou a sua vida
tentando agradar a seu pai e, nem assim, recebeu o amor que
merecia. Mas tinha dinheiro. E criados. Minha mãe era uma criada.
Sabe como é viver assim? Imagine uma mulher que passou a vida
como mãe e dona de casa, que se vê viúva, sem dinheiro, e tem de
fazer a única coisa que sabe: cuidar da casa... dos outros. E esses
outros não eram tão gentis cornos criados, como imagino que Emma
seja.
Grace estremeceu, lembrando-se dos berros do pai com os criados,
por erros mínimos.
— E eu sabia como ela era tratada e que suportava aquilo para me
sustentar. Mas não pude fazer nada para mudar a situação, até anos
mais tarde.
Grace reconheceu a dor no rosto de Ben e lamentou por ele e pela
mãe, uma mulher que ela nem conhecia. Compreendeu a frustração
do jovem impotente diante do sofrimento da mãe. E também
compreendeu que tudo o que ele fazia agora, era para compensar a
pobre mulher por tudo o que fizera por ele.
Mas isso era passado e Grace era presente. E não era justo ela ter de
pagar pelo que acontecera de errado na vida de Ben.
— Compreendo por que aceitou o trabalho, mas não compreendo por
que, no momento em que nossa relação se tornou íntima, você não
me contou a verdade.
— Foi aí que as coisas se complicaram. Eu havia prometido sigilo a
Emma. Como profissional, tenho de colocar a ética em primeiro
lugar. Sei que soa como desculpa, mas é a pura verdade. E,
também, surgiram o assalto e as ameaças. Se eu lhe contasse que
trabalhava para Emma, você me expulsaria da sua vida, não
permitiria que eu a protegesse. E eu não podia colocar a sua vida em
risco.
— Por que Emma o estava pagando para garantir a minha
segurança?
— Não! Porque já estava envolvido demais para aceitar a idéia de
deixá-la correr perigo!
Por um longo momento, fitaram-se nos olhos. Grace sustentou-lhe o
olhar, desejando que Ben a tomasse nos braços e, ao mesmo tempo,
sabendo que se afastaria se ele o fizesse. Por mais que quisesse
acreditar, não poderia esquecer o fato de que ele recebera dinheiro
por cada demonstração de interesse que fizera. Levado ao extremo,
Ben fora pago por um membro de sua família para dormir com ela. E
isso doía.
— Deixe-me ver se entendi. Não me contou a verdade porque devia
sua lealdade a Emma e porque queria me proteger das ameaças no
parque.
— Certo.
— Não, errado. Vamos encarar os fatos. Você aceitou dinheiro da
minha avó e se sentiu responsável por ela. Aceitou o dinheiro por sua
mãe, por quem também se sente responsável. Você, sua mãe e
minha avó. Cada pessoa nessa história foi levada em conta, menos
eu.
Ben não escondeu a mágoa provocada pelas palavras dela.
— Não foi assim, Grace. Resumindo, tomei uma decisão errada em
nome da ética.
— Respeito a sua ética. Não respeito as mentiras.
— E eu não respeito o fato de não ter sido capaz de ficar longe de
você! — Com isso, Ben segurou-a pelos ombros e puxou-a para si. —
E ainda não sou capaz.
— Não sei se isso é um elogio, ou não.
— Acredite em mim. E muito mais que um simples elogio. Se não
pode acreditar em mais nada, acredite ao menos nisso: o que
aconteceu não teve nada a ver com você, mas sim, comigo. Eu
deveria ter me controlado e mantido o relacionamento em um nível
platônico. Não deveria ter me envolvido com a neta de uma cliente, o
objeto de minhas investigações.
— Mas foi o que você fez — Grace retrucou, furiosa. — Fui uma
mulher de quem você não conseguiu ficar longe, mas a quem você
não respeitou a ponto de contar a verdade.
Com um suspiro, Ben recuou um passo, aceitando a barreira que
Grace erguia entre eles.
— Entendo que esteja magoada, Grace, mas a mágoa não muda os
sentimentos que tinha, antes de descobrir a verdade.
Ela empinou o queixo.
— Que sentimentos?
— Você me ama.
Sentindo-se como se houvesse recebido um forte golpe físico, Grace
passou os braços em torno do corpo, como se para sustentar-se de
pé, até que Ben se fosse.
— Não seja arrogante! Ele sacudiu a cabeça.
— E um fato. Vi as fotos que tirou de mim. Ninguém jamais se
aproximou tanto de mim, ninguém foi tão fundo. Ninguém jamais se
importou tanto comigo. Por isso, embora esteja se sentindo magoada
e traída, o que acontecerá ao amor, quando tudo isso passar?
Grace abriu a boca, mas voltou a fechá-la. Ben exibiu um sorriso
triste.
— O que aconteceu? O gato comeu a sua língua?
— Não. Ao contrário de você, não sei mentir.
— Isso é bom, pois é uma das características que mais adoro em
você.
Ben ergueu a mão um aceno, virou-se e, respeitando o pedido
silencioso, afastou-se. Deixou-a sozinha, como ela fora até ele entrar
em sua existência solitária.
Como ela seria pelo resto de sua vida.
Ben colocou seus pertences no porta-malas do Mustang. Devia estar
contente por deixar o apartamento alugado e voltar para o seu,
onde: se sentia mais à vontade. Mas, morar tão perto de Grace
valera a pena.
Na verdade, ter tido Grace em sua vida, mesmo que por pouco
tempo, fora uma bênção que ele não merecia. Se houvesse revelado
a verdade antes, talvez estivesse se mudando para o apartamento
dela, e não de volta ao seu. Mas, se houvesse dito que a amava, na
véspera, poderia ter sido atirado na areia.
Ben tinha de enfrentar o fato de que um futuro com Grace era
impossível. Ao aceitar o dinheiro de Emma em troca de seu trabalho,
selara tal impossibilidade. Mesmo que houvesse contado tudo, no
início, ela teria se sentido traída. Aos olhos de Grace, Ben a usara e,
ainda, recebera dinheiro para isso.
Fora por isso que ele não contara que pretendia devolver o dinheiro
de Emma e não confessara o seu amor. Sabia que não teria feito a
menor diferença.
Com um gesto desanimado, fechou o porta-malas e virou-se. E foi
tomado pela sensação de estar sendo, observado. Lembrando-se da
última vez em que sentira ô mesmo e das fotos que descobrira,
depois, Ben riu consigo mesmo.
Grace não queria vê-lo. Não havia a menor chance de ela estar na
janela, observando-o, agora. A menos que estivesse acenando um
adeus.
Grace colocou a câmera sobre a penteadeira. Tirar fotografias de Ben
se preparando para partir fora uma tortura, e ela jamais saberia
explicar por que imaginara que ao fazer isso encontraria alguma paz.
Agora, parada junto à janela, descobria-se incapaz de conter as
lágrimas, enquanto acusava a si mesma de ser covarde, por não
confrontar Ben pela última vez.
— Tudo o que tem de fazer é descer e impedi-lo de partir. Grace
cruzou os braços e virou-se, para encarar a avó. Devido à idade de
Emma e ao amor que tinha por ela, Grace a perdoara. Se não
houvesse omitido deliberadamente informações sobre sua vida, a avó
não teria contratado um investigador particular. Grace aceitara o fato
de que estava pagando pelo seu abuso da própria independência. Na
verdade, fora ela quem acendera o estopim que culminara naquela
explosão de mágoa e infelicidade.
Voltou a olhar pela janela. Recostado no carro, Ben conversava com
o porteiro. De calça jeans desbotada e camiseta surrada, era o
homem sexy por quem ela havia se apaixonado.
— Não é a mentira que impede você de ir atrás dele, é? — Emma
perguntou. — Afinal, você e Logan me contaram muitas delas, e
continuo falando com os dois. Também não dei palmadas nos seus
traseiros por isso. Mas, talvez, essa seja uma boa punição para o seu
Ben.
Apesar da dor'que sentia, Grace não conteve uma risada.
— Pare com isso, vovó. Não é a mentira que está me segurando.
Havia superado isso na noite anterior. Deitada no quarto escuro,
lembrando-se dos momentos que partilhara com Ben, chegara à
conclusão de que ele continuava a ser o homem decente e honesto
que ela acreditara. Um homem com responsabilidades demais e
pessoas demais em quem pensar.
Emma o colocara em uma posição insustentável. Fizera o mesmo
com Logan e Catherine, antes, mas não sabia que Ben tinha uma
mãe doente a considerar acima de seus próprios sentimentos. Agora,
Grace conseguia até mesmo respeitar a decisão que ele tomara de
permanecer em silêncio, a fim de garantir a saúde e o bem-estar da
mãe.
Também se lembrara da intimidade que haviam partilhado e,
enquanto ela lhe entregara o corpo e o coração, ele não sentira o
mesmo.
— Ele não me ama, vovó. Ben importa-se comigo, gosta de mim,
mas não me ama.
— Como pode ter tanta certeza disso?
— Ele sabe que o amo, mas não me disse o mesmo.
Só então, Grace deu-se conta de que também não havia declarado
seu amor. Sentiu o coração acelerar.
Emma ergueu uma sobrancelha, um gesto que Grace conhecia bem.
Significava que a avó possuía todas as respostas, quando Grace ou
Logan não as tinham.
— Desde quando os homens expressam seus sentimentos com
palavras? — Emma indagou.
— Continue — Grace encorajou-a.
Olhou pela janela e viu que Ben continuava conversando com o
porteiro. Não o perdera... ainda. E, mesmo sem ouvir o que mais a
avó tinha a dizer, decidiu ir atrás dele, pois não havia expressado
seus sentimentos em palavras e, agora, sabia por quê.
Era Covarde. Poderia deixar Ben partir e culpá-lo pelas mentiras pulo
resto da vida, ou poderia aceitar a explicação que ele lhe oferecera e
seguir adiante. Antes de descobrir os planos da avó, Grace
prometera a si mesma que diria a Ben que o amava. Se ele
preferisse partir, depois de ouvi-la, ela teria deixado, sem mais
nenhuma palavra, pois ele se colocara contra compromissos e ela
prometera não cobrar nada. Mas não tivera a chance de falar, assim
como Ben não tivera a chance de rejeitá-la.
— Nem todo mundo é franco com relação aos próprios sentimentos,
como eu — Emma declarou.
Grace riu.
— Eu já desconfiava.
— E nem todo mundo é frio e calculista como seu pai. Ele nunca
disse que ama você, mas ama, ao seu modo arrogante e dominador.
O que não é desculpa para ele agir como um idiota, mas ele a ama. E
se você o confrontasse, talvez ele acabasse admitindo. Talvez não.
Grace reprimiu as lágrimas. A avó acabara de resumir o seu maior
medo: que Ben a rejeitasse como os pais haviam feito. Por isso, em
vez de perdoar a mentira, Grace a usara como desculpa. Seria mais
fácil culpá-lo do que expor-se a uma possível rejeição.
Mas, graças a Ben, ela descobrira a verdadeira mulher que havia
dentro dela. Aprendera que era sensual, que sabia amar e que tinha
um profundo senso de honestidade. Ora, como poderia exigir a
verdade de Ben, quando ela mesma lhe negava o mesmo? Além
disso, muito antes de conhecer Ben, Grace decidira parar de se
esconder da vida.
— O sexo oposto é conhecido por esconder seus sentimentos. Eles
não querem correr o risco de sofrer. Depende de nós, mulheres,
tomar a iniciativa. Onde estaríamos, se Eva não houvesse comido a
maçã? Certamente, não estaríamos nos divertindo tanto. — Com
uma piscadela, Emma acrescentou: — Bem, o que está esperando?
Grace abraçou a avó e disse:
— Preciso ir.
— Já era tempo!
Quando Grace correu do apartamento, ouviu Emma gritar:
— Eu lhe disse que ele se recusou a aceitar o meu dinheiro? Grace
riu, sentindo-se mais esperançosa do que nunca, e continuou a
correr.
Ben lançou um último olhar para o edifício e virou-se para entrar no
carro. De nada adiantaria ficar se torturando com remorsos e
perguntas sem resposta. A história chegara ao fim.
— Vai a algum lugar?
Ao ouvir a voz de Grace, Ben virou-se depressa. Ela vestia short e
camiseta, mas prendera a bainha da camiseta entre os seios, como
fizera para lavar o carro. Ben sentiu a boca ressecar só de olhar para
ela.
— Perguntei se vai a algum lugar — ela repetiu, cruzando os braços.
Ele não sabia se ela pretendia provocá-lo, mas o resultado era
inquestionável.
— Ia voltar para casa. Grace assentiu.
— Você nunca me disse onde fica a sua casa.
— No Village.
Ben não queria ficar ali, parado, conversando com Grace como dois
desconhecidos. Vê-la e não poder tocá-la era doloroso demais e
trazia de volta a lembrança amarga dos erros que ele havia
cometido. Por isso, voltou a se virar para entrar no carro, mas foi
surpreendido pela mão dela em seu braço.
— Vai fugir de novo?
Reconhecendo o desafio na voz dela, Ben tomou coragem. Se ela o
estava impedindo de partir era porque tinha algo a dizer, e ele
estava disposto a ouvir cada palavra.
— Que tal conversarmos em um lugar onde possamos ter um pouco
de privacidade? — sugeriu, determinado a fazê-la lembrar-se dos
jogos que haviam partilhado e como haviam terminado.
Grace sorriu.
— Boa idéia.
Girando nos calcanhares, ela foi até o carro, abriu a porta, afastou o
banco do motorista e sentou-no no banco traseiro.
Aquela, sim, era a Grace que Ben conhecia: alegre, divertida e
esperançosa.
Depois de fitá-la nos olhos por um breve momento, ele se sentou ao
volante, deu a partida e conduziu o carro até o beco atrás do edifício,
onde haviam estacionado, uma vez. Em tempo recorde, desligou o
motor e saltou para o banco traseiro.
— Talvez eu tenha me enganado e você não esteja fugindo de novo
— Grace murmurou.
Ben segurou-lhe o queixo entre os dedos com ternura.
— Chega de jogos, Grace. Estou aqui e não vou a lugar nenhum. Ao
menos, não até que diga o que tem a dizer e, talvez, nem depois
disso.
Ela assentiu, com os olhos cheios de lágrimas. Tocado por aquela
demonstração de vulnerabilidade, Ben inclinou-se, até que seus
lábios estivessem muito próximos dos dela.
— Estamos sozinhos, princesa. O que vai fazer comigo, agora?
— Falou sério quando disse que não queria compromissos?
— Na ocasião, falei sério. Eu não sabia que...
— Não sabia o quê? Eu te amo, Ben, e não é nada agradável amar
sem ser correspondida.
Ben não se dera conta de quanto precisava ouvir aquelas palavras.
Só agora sentia seu mundo de volta ao seu lugar, o coração batendo
no ritmo certo.
— Eu não sabia que me apaixonaria por você... Quero dizer... Bem,
na verdade, eu sabia, desde o momento em que vi a sua fotografia.
Mas não podia me permitir tais sentimentos, assim como não podia
lhe contar a verdade. E foi aí que eu errei, pois você foi mais
importante do que meu trabalho, desde o primeiro dia. Foi mais
importante que Emma, que minha mãe...
Grace o fez calar com um beijo.
— Por falar na sua mãe, vai aceitar o dinheiro de Emma. E nem
pense em discutir. E, também, quero saber quando vou conhecê-la.
Em vez de responder, Ben segurou-a pela cintura e acomodou-a em
seu colo.
— Temos de cuidar de algumas coisinhas, antes — disse, por fim.
— Se não me engano, você disse que não ia a lugar nenhum.
— Querida, nada, nem ninguém, me afastaria de você, nem agora,
nem nunca.
Secou uma lágrima que rolava pelo rosto de Grace com um beijo.
— Você me faz feliz.
— Sempre chora, quando está feliz?
— Fique comigo e descubra.
EPÍLOGO
Emma espiara pela janela e vira Grace atrair Ben para dentro do
carro e, juntos, desaparecerem. Então, suspirou aliviada.
O papel de casamenteira era estafante para uma mulher da sua
idade. Se, ao menos, os jovens de hoje não fossem tão difíceis, seu
trabalho seria bem mais simples.
Porém, atingira seus objetivos, c com grande sucesso. Logan estava
feliz em seu casamento, e Grace dera o passo mais importante, na
mesma direção. Satisfeita, Emma sentou-se o ajeitou os cabelos. Se
Ben fosse bom como ela imaginava, os dois não voltariam tão cedo.
Lembrando-se da própria juventude, ela sabia que um carro podia
ser um lugar excelente para se exercitar a imaginação.
Esticou as pernas, que doíam pela longa viagem da véspera, mas
nunca se sentira tão feliz e rejuvenescida. Sua presença era o que
faltava para aqueles dois jovens darem o passo final: admitirem seus
verdadeiros sentimentos.
Com Logan e Grace bem encaminhados, ela podia descansar em paz,
sabendo que sua família estava bem cuidada. Mas não poderia ficar
ali, parada. Não, uma mulher com o seu talento... Ora, seria uma
pena desperdiçar um precioso minuto do tempo de que ainda
dispunha na terra.
E Emma planejava ficar por aqui por muito tempo, ainda. O bastante
para segurar os filhos de Grace e Ben nos braços. Mas o que a
manteria ocupada, enquanto esperava?
Continuar fazendo o que sabia fazer melhor! Estalou os dedos,
quando a idéia cruzou sua mente. Tinha sobrinhas e sobrinhos e,
dentro de poucos anos, estariam à sua disposição. Enquanto isso,
seu círculo social estava repleto de viúvos, viúvas e divorciados.
Todas aquelas pessoas precisavam desesperadamente de compa-
nhia, mesmo que ainda não soubessem disso. A maioria tivera
primeiros casamentos infelizes, mas não haviam contado com Emma
Montgomery para escolher seus parceiros.
Apanhou o telefone e discou, satisfeita quando Alice Farnsworth
atendeu ao primeiro toque.
— Alice, estou em Nova York, visitando minha neta, mas estarei de
volta amanhã, em tempo de ir ao evento beneficente, no Wild Acres
Country Club. Meu motorista está doente, e eu gostaria de saber se
você poderia me apanhar em casa. — Ouviu a resposta. — Sem
problemas? Ah, obrigada! Já ia me esquecendo de mencionar que
prometi levar o pobre Ralph Nadelson comigo. Ele não é o mesmo,
desde que a esposa faleceu...
Sim, Emma pensou, nascera para juntar pessoas. Consultou o
relógio. Afinal, Ben e Grace ainda não haviam retornado, e já fazia
mais de meia hora que haviam desaparecido.
Ah, como era bom ser jovem e poder fazer amor quanto se tivesse
vontade, vinte e quatro horas por dia, sete dias por semana...
Grace e Ben eram, definitivamente, jovens de sorte.

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