sábado, 8 de junho de 2013

Um homem para casar

Um Homem para Casar
Susan Fox
Sabrina 1190
Projeto Revisoras Digitalização: Simoninha
Revisão/Formatação: Evelin Melo
Que tipo de homem seria o marido perfeito? Um homem com um grande coração e braços fortes — alguém firme, porém gentil, poderoso e também apaixonado... E onde esse homem poderia ser encontrado? Tracy tinha certeza de que este tipo de homem não existia... Até encontrar Ty Cameron. Mas como conquistá-lo, se ele a julgava mal-educada, mimada e cheia de vontade?
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Querida leitora, Estar apaixonada é muito bom. Até o problemas ficam mais fáceis de serem resolvidos. O mundo parece bem mais amistoso do que é, e as pessoas ficam mais risonhas, mais felizes. A gente sabe que o fim de uma paixão é sempre dolorido, porém não o suficiente para nos fazer esquecer as alegrias vividas a dois. Quer um conselho? Apaixone-se sempre! Fernanda Cardoso Editora-Assistente UM HOMEM PARA CASAR Susan Fox Copyright © 2000 by Susan Fox Originalmente publicado em 2000 pela Silhouette Books Divisão da Harlequin Enterprises Limited. Todos os direitos reservados, inclusive o direito de reprodução total ou parcial, sob qualquer forma. Esta edição é publicada através de contrato com a Harlequin Enterprises Limited, Toronto, Canadá. Silhouette, Silhouette Desire e colofão são marcas registradas da Harlequin Enterprises B.V. Todos os personagens desta obra são fictícios. Qualquer semelhança com pessoas vivas ou mortas terá sido mera coincidência. Título original: The man she'll marry Tradução: Mariane Pelegrini Editora e Publisher: Janice Florido Editor: Fernanda Cardoso Chefe de Arte: Ana Suely S. Dobón Paginador: Nair Fernandes da Silva EDITORA NOVA CULTURAL LTDA. Rua Paes Leme, 524 - 10° andar CEP: 05424-010 - São Paulo - Brasil Copyright para a língua portuguesa: 2001 EDITORA NOVA CULTURAL LTDA. Fotocomposição: Editora Nova Cultural Ltda. Impressão e acabamento: DONNELLEY COCHRANE GRÁFICA E EDITORA BRASIL LTDA. DIVISÃO CÍRCULO - FONE (55 11) 4191-4633
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CAPÍTULO I A noite em San Antônio estava mais movimentada e barulhenta do que normalmente. Na boate mais badalada, a pista de dança parecia um verdadeiro mar de corpos, movendo-se sensualmente de acordo com a música. Luzes coloridas piscavam enlouquecidas sobre os dançarinos, tornando seus movimentos mais frenéticos do que na realidade eram. Tracy LeDeux assistia a tudo com uma expressão de enfado no rosto. Por alguma razão parecia que todo mundo estava tentando arduamente se divertir. Seus movimentos eram entusiásticos demais, suas risadas altas demais e a animação forçada demais. Exatamente como ela. Relanceou a vista em direção ao seu par, do outro lado da mesa e viu em seu olhar um brilho predatório. Gregory Parker III era bonito como um artista de cinema, e infelizmente ele tinha consciência disso, e aproveitava-se de toda situação que pudesse. Seus bons modos sulistas haviam se tornado apenas um fino verniz. "Não", era uma palavra que ele jamais ouvira em sua vida de privilégios, por isso ficara aborrecido com a recusa de Tracy em ir para casa com ele. Gregory gastara uma pequena fortuna com aquela noitada e estava claro que esperava o retorno do seu investimento. Tracy não conseguia perdoar-se por não haver percebido, antes de aceitar o convite para sair, como ele realmente era. Admitiu que não quisera perceber. Afinal, não conhecia quase ninguém em San Antônio e estava se sentindo aborrecida e sozinha. Sem contar que o fato de passar mais uma noite solitária em sua cobertura acabaria de vez com o seu já tão precário autocontrole. Gregory III tinha sido uma distração bem-vinda. Mas bastaram apenas cinco minutos à mesa de um fino restaurante para Tracy perceber que talvez tivesse sido melhor ficar em casa. Tivera que resistir à urgência de se afastar dele quando sentira o bafo de uísque soprando em seu rosto. — Já está tarde Tracy. Vamos para a minha casa tomar um último drinque. Greg sorriu para ela de um modo vaidoso, com o sorriso que os homens atraentes usam quando estão determinados a ganhar alguma coisa, e têm quase certeza de já ter conseguido. Afinal, o que poderia esperar do seu acompanhante? Ele era um homem mimado, cujo único propósito era buscar o próprio prazer, sem jamais se preocupar com quem quer que fosse. Isso explicava, ele não parecer ter ouvido todas as recusas anteriores de Tracy ao mesmo convite. Ela fez um ar infantil ao responder: — Não é tão tarde, Greg. E eu preciso ir ao toalete. Levantou-se rapidamente e saiu. Havia um telefone no banheiro feminino, ela podia chamar um táxi e voltar para casa. Depois, telefonaria para Greg e se desculparia... Era uma forma covarde de se livrar da situação, mas pelo brilho impaciente que vira nos olhos dele e pela quantidade de bebida que ele ingerira aquela noite, o bom senso a mandava fazer isso. O caubói alto que colidiu com ela na multidão vestia-se como a maioria dos homens
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presentes, mas tinha a estatura mais elevada. Era realmente alto, enorme nos seus quase dois metros de altura, fazendo-a se sentir pequena como uma criança. O impacto contra o corpo forte e musculoso produziu em Tracy um lampejo de fogo e a fez olhar para cima surpresa. Mas, no instante em que reconheceu aquelas feições másculas, sob a aba do chapéu, seu coração gelou. Ty Cameron era um dos mais atraentes milionários do Texas. Seus cabelos louros eram uma brilhante mistura de bronze com reflexos mais claros, conforme o sol incidia sobre ele. Isso combinado com a pele bronzeada e os olhos muito azuis causavam um efeito estonteante. Tracy nunca se sentira tão pequena e feminina quanto naquele momento. Mas assim que se deu conta de que fora reconhecida, um sentimento de extrema vergonha a abateu. Se ele não a tivesse amparado, com o choque de ter sido vista, Tracy teria ido para o chão. Estava tão envergonhada com as coisas que Ty Cameron sabia sobre si, ou do que podia pensar a seu respeito, que queria sumir. A culpa que a torturava constantemente voltou, trazendo junto uma onda de remorso muito grande. Havia pensado que nunca mais o encontraria... Devia saber que para isso precisava ter deixado o Texas. Seu trêmulo pedido de desculpas parecia apenas se referir à colisão acidental. Afastou-se dele, sentindo um alívio imenso por estar distante do toque daquelas mãos e da corrente elétrica que parecia emanar delas. Tracy teria corrido para longe de Ty se pudesse, mas as pessoas se acotovelavam na boate. Só conseguiu interpor entre eles alguns corpos de distância. Por fim alcançou o toalete feminino e deu seu telefonema. Mas as notícias eram desanimadoras, teria que aguardar quarenta e cinco minutos se quisesse um táxi. Quais eram suas chances de sair da boate sozinha e encontrar um táxi na rua? Raramente pegava táxis, muito menos depois da meia-noite, mas se demorasse muito, Greg daria pela sua falta e sairia em seu encalço. Claro, a última coisa que ela queria era um encontro com aquele playboy lá fora e no meio da noite. Teria que voltar para a mesa, esperar mais alguns minutos antes de voltar para o toalete com outra desculpa. Daí então, poderia ir embora. Talvez pudesse usar isso para reforçar sua história de doença para Greg. Mas tinha outro problema: Ty Cameron. Se voltasse para a mesa poderia reencontrá-lo. A simples idéia fazia seus nervos partirem de ansiedade. Felizmente o lugar estava cheio demais para um segundo encontro. E, além disso, tinha certeza de que Ty, sabendo que ela estava na boate, evitaria um segundo encontro. Resignada com os percalços em seu plano de fuga, Tracy retocou a maquiagem e penteou os cabelos. A imagem pálida do seu rosto no espelho lhe causou outro choque. Seus olhos também estavam sem brilho, rodeados por enormes círculos escuros que acentuavam seu abatimento. Vinha bebendo muito ultimamente, e os sinais disso começavam a aparecer. Havia começado com apenas um copo de vinho para espantar a insônia, naquelas longas noites em que o sono se negava a chegar... Agora, não conseguia mais dormir sem
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ele. Ficava apavorada com a idéia de estar se tornando uma alcoólatra, mas não se sentia capaz de fazer nada a esse respeito. Não tinha certeza que o esforço valeria a pena. A sensação de pânico a levou a sair do toalete e se misturar ao barulho da boate lotada. Foi quase com alívio que alcançou a mesa de volta. Nem sinal de Ty Cameron. Talvez ele estivesse de saída, e não tivera tempo de reparar se estava ou não acompanhado. Ty Cameron olhava para Tracy, pensativo. Ela parecia menor desde a última vez que a vira. Naquele instante, o que chamava atenção em Tracy eram os cabelos louros, aqueles imensos olhos azuis e as pernas... Pernas perfeitas. Estranho, mas ela continuava parecendo vulnerável como uma criança e ainda carregava aquele olhar perdido. Ty ficara sabendo que Tracy havia brigado com a mãe. Conjeturou que talvez a enorme herança que estava para receber, tivesse lhe dado essa opção. Pensar nas coisas terríveis que ela havia feito lhe dava a impressão de que Tracy possuía as mesmas características tristes da mãe, que não valia nada. Naquele momento, ao observar aquela figura frágil, com ar desamparado, retornando para a mesa onde estava Parker sentiu um lampejo de simpatia. Nos olhos azuis podia ler em letras garrafais a preocupação. E tinha razão para tanto. Parker era conhecido pela sua preferência por louras frágeis. Tracy LeDeux estava diante de uma noite de orgia. Talvez, se ela fosse realmente tão promíscua quanto a mãe, pudesse lidar bem com a situação. Estava pronto para desviar sua atenção de Tracy quando a viu derrubar a bebida. O copo caiu sobre a mesa e ela nada fez além de olhar, aparvalhada. Os cílios pareciam pesados demais para se manterem abertos. Em seguida, ela relanceou o olhar para seu par num movimento patético. Não passou despercebido para Ty o brilho de antecipação no sorriso de Parker. Nem a expressão de desconforto no rosto de Tracy. A tontura viera de repente. Tracy sentia-se muito fraca, totalmente sem coordenação... Não conseguia se mexer, não conseguia pensar. O túnel em que a sala se tornara parecia cada vez mais estreito e escuro a cada batida do seu coração. Mas o terror que sentia era superior a tudo. Seu primeiro pensamento coerente foi de estar em segurança. Protegida. A despeito da dor de cabeça, sentia uma estranha paz. Foi essa estranha sensação de segurança e paz que a fez despertar. Afinal, ela raramente se sentia segura, e paz era um sentimento desconhecido para ela. A pesada culpa que carregava dentro de si banira há muito qualquer vestígio de auto-estima. Estaria realmente acordada ou sonhando? Rolou na cama enorme e abriu os olhos. Na mesma hora a sensação agradável desapareceu. Constatou que aquele não era o seu quarto. Aos poucos, os acontecimentos da noite anterior foram voltando à sua memória. A última lembrança que tinha era do rosto de Gregory Parker se aproximando, pegando-a no colo e depois... Nada.
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Um calafrio de terror fez seu estômago se contorcer. Já estava pulando para fora dos lençóis em busca de um banheiro quando se deu conta de outro detalhe, não estava usando seu vestido. O pânico tomou conta de Tracy e sua única reação foi puxar os lençóis sobre o corpo. A voz masculina que ouviu foi a gota d'água: — Pegue! Mal teve tempo de se voltar para a direção da voz e foi atingida por um roupão branco. — Vista isso e vá se lavar, seu vestido está pendurado no banheiro. Ty Cameron estava parado aos pés da cama como um xerife do Velho Oeste que persegue um fora-da-lei. O choque causado pela presença dele foi transformado por outro sentimento: mortificação. A vergonha fez sua voz soar esganiçada. — O-onde eu estou? A boca de Ty se torceu num esgar. — Fique sóbria e descubra. As palavras de Ty tiveram o mesmo efeito de uma bofetada no rosto de Tracy. Ela sentiu uma dor na alma quando viu a indiferença surgir em seu olhar. Era o olhar de quem a julgava não ser merecedora de mais nenhum instante de sua atenção. Para reforçar essa impressão, ele se virou e caminhou para a porta. Bateu-a ao sair com a intenção clara de chocá-la. Aquela atitude além de ferir seu coração como uma estaca de gelo, fez com que Tracy se sentisse desprezível, como se fosse uma pessoa em quem não se pudesse confiar. Com algumas palavras e um olhar, Ty Cameron confirmara suas mais terríveis suspeitas sobre si mesma e sobre como seria sua vida. Era rica, quase obscenamente rica. Tinha quase vinte e três anos, era jovem e ainda possuía a seu favor a aparência bonita e delicada, mas sua vida não valia nada. Não tinha ninguém. Não possuía estabilidade, ambição e nem pertencia a lugar algum. Não havia nada que a fizesse querer viver. Se morresse naquele instante, ninguém além da sua mãe se importaria. Mesmo assim, Ramona apenas se interessaria na morte da filha para saber se estava inclusa em seu testamento. De algum modo Tracy conseguiu dispersar tais pensamentos. Tinha que se arrumar, sair dali e resolver o mistério sobre o que acontecera na noite anterior. Queria saber como fora parar ao lado de Ty Cameron, uma vez que sua presença lhe provocava pavor. Depois do banho e com os cabelos mais ou menos em ordem, Tracy caminhou pela imensa casa da fazenda. Alcançou o imponente hall e começou a tremer. Sabia que estava no Rancho Cameron, e isso significava estar a milhas de San Antônio. Estava sem carro, portanto não havia como partir, a não ser que ligasse para uma locadora de automóveis e pedisse para lhe mandarem um. Precisaria do seu cartão de crédito para tanto e na sua minúscula bolsa social só havia batom, sua identidade e a chave da cobertura.
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A voz profunda vinda da sala ao lado só fez crescer seu pânico. — Entre e coma algo. O convite nada mais era do que uma demonstração de boa educação. Ty Cameron era o tipo de homem que jamais deixaria alguém sair de sua casa sem oferecer comida. Era um gesto de compaixão, mais um gesto nobre da família Cameron. E apesar de todo seu dinheiro, Tracy LeDeux estava em uma situação miserável. Ela parou, relutante. Oh, Deus! Odiaria olhar para aquele rosto másculo e ver a condenação em seus olhos. Tracy sabia que ele a tinha em um conceito muito baixo. Novamente, o desprezo que sentia por si mesma acometeu-a. Isso significava que pelo menos uma coisa eles tinham em comum. Mais fatos da noite anterior lhe voltavam à memória, mas nada depois de ter se sentido tonta e Greg tê-la tomado nos braços. A única coisa que estava clara em sua mente era que Ty Cameron a havia levado para casa e a colocado na cama. De algum jeito ele havia se livrado de Gregory III. Tracy só esperava que isso tivesse acontecido antes que Greg tivesse feito algo irremediável... A lógica lhe dizia que fora a cabeça latejante, as náuseas e os nervos em frangalhos, não havia nenhum indício de violência sexual na noite anterior. Afinal, não precisava de mais uma vergonha para amargar. Pelo menos não da noite anterior. Mas o terror de estar tão vulnerável minava qualquer dedução lógica. Desde que estava claro para ela que Greg a havia drogado, quanto mais ele poderia ter feito? Memórias negras afloraram, e o efeito venenoso delas também. Tonta de medo, Tracy precisou se apoiar no batente da imponente sala de jantar. Se Greg a havia violado, se livrara dela em algum lugar público, onde fora resgatada por Ty. Ele era um homem do mundo, bastaria um único olhar para deduzir o que havia se passado. Oh, Senhor... — Você deveria ver um médico. As palavras amargas de Ty foram uma confirmação velada dos seus piores temores. Ela soltou a mão da porta, os joelhos tremendo tanto que mal podia se manter em pé. — Ele fez... — Tracy não conseguiu pôr em palavras o que estava pensando. Lutou para encarar o rosto de Ty e esperou pela resposta. Ty estava sentado à cabeceira da mesa que estava posta para o almoço. Usava as habituais roupas de caubói, jeans da cabeça aos pés. Provavelmente já deveria estar no meio de um dia de trabalho. Seu olhar afiado percorreu-a da cabeça aos pés, antes de se fixar na face pálida. Ty sabia do que ela estava falando. — Ele fez o quê? Aceitou o que você estava oferecendo? A emoção toldou seus olhos, mas Tracy segurou o choro. — Eu não ofereci. Com cinismo transparecendo em suas belas feições, Ty acrescentou: — E o que você acha que significa beber com um sujeito como Parker? Ninguém é tão ingênuo assim. O coração de Tracy tremeu de dor. Engoliu convulsivamente, lutando para manter
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um fiapo de dignidade. — Preciso voltar para San Antônio. P-posso usar seu telefone? Ela odiou ter gaguejado. Odiou-se por demonstrar um pouco que fosse da mágoa que lhe tinha na alma. — Pode levar um carro. Eu passo para buscá-lo mais tarde. — Com um gesto de cabeça mostrou o lugar que estava posto para ela à mesa — Venha, sente-se e coma um pouco, depois você vai. Tracy sabia que não estava em condições de engolir nada. Nada que viesse da mesa de Ty Cameron, muito menos ao lado dele, e certamente nunca debaixo de seu olhar condenador. A mercê do próximo comentário devastador que ele proferiria. — Preciso ir para casa agora. Tenho que ir a outro lugar. A mentira só fez piorar tudo. Era mais um peso em sua consciência que já vivia pesada demais. E Ty podia dizer que era mentira. O jeito como a olhou não deixava margem a dúvidas. O fato de ele não ter feito isso só queria dizer que não esperava honestidade da parte dela. Recostando-se no espaldar da cadeira, Ty colocou a mão no bolso da calça e tirou de lá um molho de chaves. — O Cadillac prateado no fim da garagem — falou, atirando-lhe as chaves. Tracy as apanhou, surpresa de ainda conseguir fazer isso. Os olhos de Ty a fuzilaram de novo. — Bom. Seus reflexos estão em ordem e sua coordenação também. As pessoas na estrada estão seguras. Naquele instante Tracy se deu conta de que o gesto de Ty fora um teste e não mais um ato de desrespeito para com ela. — Estacione num lugar onde ele fique seguro e deixe as chaves debaixo do banco do motorista. Depois me ligue e diga onde o deixou. Isso significava que Ty não pretendia encontrá-la de novo, nem mesmo queria falar pessoalmente com ela, daí tantas e tão precisas instruções. — Obrigada — embora delicado, o agradecimento de Tracy foi gélido. O olhar vivido envolveu-a impiedosamente e Tracy não conseguiu desviar a atenção. Sentia-se como se estivesse sendo cuidadosamente examinada. Foi fácil perceber que após a busca, Ty parecia não ter encontrado nada que valesse a pena. Tracy deu meia-volta e saiu caminhando com toda a dignidade que conseguiu. Era apenas uma aparente dignidade, claro. Falsa como tudo que costumava mostrar para o mundo. Saiu porta a fora da imensa casa, e então se deixou abater. O sol do meio-dia estava inclemente. Insuportavelmente quente. Quente o bastante para fazer seu estômago embrulhar e o mundo parecer embaçado. Tracy pensou que suas pernas não a sustentariam até chegar ao carro. A temperatura amena no interior da garagem lhe proporcionou um alívio momentâneo na dor de cabeça. Uma vez dentro do Cadillac, ajustou o banco para sua pequena estatura, mas não conseguiu pôr a chave na ignição.
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A frustração apenas agravou seu lamentável estado de espírito. Sentia-se incompetente. Estaria em condições de dirigir de volta para a cidade? A simples idéia de precisar procurar por Ty novamente e pedir-lhe ajuda, foi o bastante para que ela conseguisse achar um jeito de ligar o carro. O motor possante roncou e Tracy soltou um longo suspiro de alívio. Ela conseguiria... No painel encontrou o controle remoto da garagem, apertou um botão e a porta automática se abriu. Ao se virar para tirar o carro a tontura mais uma vez a atingiu. Ignorou-a e prosseguiu com a manobra. Ajeitou o espelho retrovisor, colocou o controle remoto sobre o quebra-sol, e engatou marcha ré. Mal havia andado alguns metros quando percebeu que o espelho retrovisor não estava bem-ajustado. Nervosa, mexeu no espelho com brusquidão, fazendo cair o controle remoto em seu colo. Virou-se para ver onde estava indo, e com esse movimento acionou o botão do controle remoto sem querer, pois a porta começou a fechar. Tracy só se deu conta disso quando já estava debaixo do batente. Daí em diante tudo deu errado. Ainda de costas, pisou no breque, apertou o botão da porta novamente achando que a faria abrir outra vez. Mas isso não aconteceu. Alarmada, tornou a pisar no breque, mas na pressa o salto do sapato escorregou do pedal. Tracy estava tonta e sem coordenação para fazer qualquer outro movimento. O resultado foi um impacto entre a pesada porta e o chassi do carro. O baque e o conseqüente ruído de metal sendo amassado a levou à histeria completa. Depois disso veio o silêncio absoluto. Dentro do carro, Tracy lutava para compreender o que havia acontecido. O batuque acelerado que lhe chegava aos ouvidos nada mais era do que seu coração batendo aterrorizado. — Estacione num lugar seguro. As instruções de Ty quanto ao carro foram as primeiras palavras que lhe vieram à lembrança, num alarme de perigo iminente. CAPÍTULO II Em estado de terror total, Tracy virou a cabeça e pela janela viu um borrão azul do lado de fora. Era Ty Cameron. Ele estava se esforçando para abrir a porta amassada do carro. Depois de algum esforço, mais alguns puxões e outros palavrões, a porta se abriu com um ruído. No instante seguinte, ela viu Ty surgir à sua frente. Com medo, e por reflexo, Tracy se encolheu dentro do carro e levantou o braço num gesto de autodefesa. As costas de sua mão atingiram Ty no rosto, mas o ataque brutal que ela, histericamente esperava, não aconteceu. Levou um segundo antes de perceber que o avanço de Ty fora apenas para desligar a chave de ignição do carro, e não para atacá-la. No súbito silêncio da garagem, seu olhar horrorizado se encontrou com o não menos
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furioso olhar dele. Foi só então que Tracy se deu conta de que sua atitude de defesa fora tomada como uma ofensa. Agora o azul dos olhos de Ty estava lívido, e seu rosto vermelho de raiva. Sua voz soou áspera e controlada. — Eu nunca levantei a mão para uma mulher em toda minha vida, Tracy. Mesmo que isso fosse tentador. Tracy estremeceu com o tom das palavras. E notou que um filete vermelho de sangue escorria do queixo ferido de Ty. Seu anel fizera aquele estrago, concluiu. O rápido estalo do cinto de segurança libertou-a e foi o único alerta antes de ela se achar fora do carro e apoiada nos próprios pés. Suas pernas estavam muito fracas quando Ty a soltou. Ela cambaleou, correndo o risco de se espatifar no chão de concreto antes de se apoiar na parede atrás de si. No silêncio que se seguiu à inspeção de Ty das conseqüências do acidente com a porta da garagem, Tracy rezou para morrer, mas sua prece foi ignorada assim como todas as outras que fizera anteriormente. Ela se encolheu ao som das imprecações quase inaudíveis de Ty. Tracy não podia culpá-lo pela sua fúria. Afinal seu lindo Cadillac prateado estava destruído. A porta amassara todo o capo, o teto e quase a metade dele estava irreconhecível. — E-eu compro um carro novo para você. — resmungou aos solavancos, enquanto Ty continuava a contornar o carro, como se não tivesse ouvido nada. — Eu s-sinto tanto... Ele continuava sem ouvir. O ar ao redor dele parecia carregado de violência muda. Tracy estava profundamente consternada. Mau humor sempre a aterrorizava. A vida toda sofrerá sendo manipulada e ameaçada. Pensara estar livre disso para sempre quando escapara de sua mãe, mas olhando Ty naquele momento, ouvindo-o praguejar, percebendo sua ira controlada a duras penas, todo o pavor infantil voltou a assolar Tracy. A diferença é que raramente merecia as reprimendas de sua mãe. Fora uma criança boa, uma filha obediente e submissa, ansiosa em agradar. Mas dessa vez não era sua odiosa e volúvel mãe quem estava ali. Era Ty Cameron. E toda a fúria dele era merecida. A culpa que drenara toda a cor, energia e esperança de sua vida a revirava por dentro numa espécie de vingança final. Ty havia superado seus sentimentos em relação a ela, para ajudá-la na noite anterior e pô-la a salvo daquele playboy, não importando o quanto a desprezasse, a resgatara e lhe emprestara o carro. E como Tracy lhe retribuíra as gentilezas? Destruindo seu carro e parte de sua garagem, e conseguira tal proeza dirigindo por apenas alguns metros. Tinha a sensação de que sua vida estava definitivamente se encaminhando para o desastre e qualquer pessoa que se envolvesse, casualmente ou não, com ela acabaria do mesmo jeito. A despeito de estar com os olhos ardendo, Tracy não conseguia chorar! Se o fizesse, certamente seria acusada de usar o pranto para se esquivar de sua responsabilidade no ocorrido. Sua mãe era perita em agir assim, e Tracy preferia morrer a deixar que alguém pensasse que fazia o mesmo. — Então, o que temos aqui, Tracy? — disse-lhe Ty por sobre os destroços — Crise
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de abstinência de drogas ou delirium tremens por alcoolismo? A pergunta chocante vinha da conclusão que apenas um viciado em drogas ou um bêbado poderia ser capaz de um acidente daqueles. Aquele foi o momento em que Tracy descobriu que tremia convulsivamente. Sabia que sua aparência era de doente e isso há semanas. E não podia culpar Ty inteiramente pelas suas suspeitas. Afinal de contas, ela mesma estava apavorada com a possibilidade de ser uma alcoólatra. Uma vez que não poderia negar totalmente o que lhe havia sido perguntado, ela não respondeu. — E-eu sinto muito. Não sei como isso foi acontecer... — Tracy interrompeu a frase e procurou conter o tremor que permeava suas palavras. — Eu pagarei por todos os danos. Vou lhe comprar um carro novo, chamo alguém para consertar a porta. Enfim, pago por todo e qualquer inconveniente que possa ter lhe causado. Ty estava furioso consigo mesmo por ter dado as chaves de um carro para alguém que, obviamente, não tinha condições de dirigir. Pessoas inocentes podiam ter se ferido, ou mesmo morrido por sua imprudência e ele teria tanta culpa quanto a mulher no volante. Demorou o olhar sobre a "mulher" que parecia frágil e vulnerável como uma criança. Tracy estava tremendo, e as sombras cinzentas e fundas destacavam-se sob seus olhos congestionados e secos. Viu sua consternação. E vergonha. A mesma impressão de novo. Tinha a exata sensação de que Tracy estava perdida. Ela se metera numa confusão colossal. Primeiro se embebedara com aquele canalha do Gregory Parker na noite anterior, e agora aquilo. Naquela manhã dera alguns telefonemas perguntando a seu respeito. A vida não estava tratando Tracy LeDeux muito bem, mesmo com todo seu dinheiro. Subitamente Ty teve a certeza de que se a levasse para a cidade e a deixasse em sua cobertura esquecendo sua existência, algo muito pior poderia acabar acontecendo a ela. Mesmo sua insistência em repetir que pagaria os danos, em se desculpar, soava como um alerta. Como um pedido de socorro. Não era dado a premonições, portanto, ignorou essa sensação. Por outro lado, não era preciso uma bola de cristal para ver que Tracy estava em perigo. Por que estava se preocupando com isso? Ela não significava nada para ele. Se queria jogar sua vida fora, não era problema seu. Quando a ouviu repetir a mesma cantilena outra vez, sua exasperação aumentou. A ansiedade e o nervosismo eram ainda maiores em Tracy ao repetir: — Eu pago tudo, juro. É só dizer quanto é... O desespero dela lhe soou patético de repente. Então se lembrou da mãe de Tracy, aquela criatura desprezível e manipuladora, e se perguntou se não estaria sendo alvo de uma representação. Se estava, ficaria sabendo logo. — Pode estar certa de que vai pagar sim — rosnou ele, vendo o olhar apavorado de Tracy em sua direção. Ela assentiu aparvalhada. — Diga o valor. Não me importa o quanto. Tracy tentava sustentar o olhar que tinha sobre si. Ela se esforçou para juntar um
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resto de coragem, mas a rigidez que vinha de Ty indicava que o silêncio era apenas um preâmbulo antes da explosão final. Seu tom de voz era ríspido, quando voltou a falar: — Você quer fazer a coisa certa, hein? Ty não alterara tanto o tom de voz, mas para os nervos a flor da pele de Tracy, aquilo soou como um tiro. Ela assentiu enfaticamente. — Sim, não importa como. Ty abaixou um pouco a cabeça como se para estudá-la sob um ângulo mais preciso. — Você é uma moça rica que pensa que pode resolver tudo simplesmente preenchendo uma folha de cheque. E o que você tem a mais para oferecer em pagamento, em reparação, Tracy? O que você está tentando comprar? Tracy o encarou sentindo seu horror crescer. — Quero ser perdoada, ou tentar ser. Eu realmente sinto muito... — Sua voz quase desapareceu diante da expressão inflexível dele. — Eu nunca sonharia que isso pudesse acontecer, mas não sou descuidada. Não posso explicar como isso aconteceu, não faz sentido. Não sei mais o que dizer, o que fazer... — Pois eu sei exatamente o que você pode fazer para saldar sua dívida comigo... — O tom de sua voz não escondia o sarcasmo. As palavras de Ty deveriam trazer algum alívio para o tormento de Tracy, afinal ele iria apontar os meios para que as coisas se ajeitassem. Talvez ela até conseguisse que ele a odiasse menos. Mas algo no tom de voz e no azul ártico dos olhos dele a puseram em guarda. — O que você quer de mim? Ty ficou em silêncio por alguns instantes. Foram apenas alguns segundos, mas para Tracy pareceram uma eternidade. Quando, por fim falou, as palavras a princípio não fizeram sentido para ela. — Você vai trabalhar para mim, pagamento por hora, até que o valor do conserto seja atingido. Quando isso acontecer, vai continuar trabalhando até me ressarcir do inconveniente. Tracy o encarou perplexa, enquanto mentalmente repetia a frase que acabara de ouvir. Ele queria que ela pagasse os estragos trabalhando para ele?! O terror que a acometeu foi imensurável. Quantas horas levaria até conseguir pagar um estrago de milhares de dólares? E Ty a desprezava. Não era preciso ser um gênio para concluir que isso transformaria sua vida num inferno ainda pior que o atual. Talvez fosse essa a compensação pelo inconveniente a que ele se referira, transformar sua existência num martírio. Não conseguiria viver, hora após hora debaixo de sua animosidade e desaprovação. E que espécie de trabalho ele lhe ofereceria? Não possuía nenhum talento ou habilidade, pelo menos nenhum que pudesse ser útil para um rancheiro ou um homem de negócios. Uma idéia revoltante e perversa lhe ocorreu então. A lembrança de Gregory Parker e do que ele pretendia na noite anterior veio-lhe à mente. Certamente Ty não estava pensando... Não, isso era impossível. Ty a detestava e esse sentimento a deixava a salvo. De mais a mais ele não era o tipo de homem que exigisse qualquer favor sexual. Essa idéia só
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lhe ocorreu por causa de velhos temores que a assombravam. O medo a assolava desde a fatídica noite anterior. E ficou ainda pior a partir do momento em que descobrira o quão vulnerável ela podia ser para predadores como Greg Parker. O mau humor de Ty se traduziu em palavras. — Você já teve um emprego na vida, Tracy? Alguma vez aprendeu quanto vale um dólar? Alguma vez aprendeu quanto vale um dólar"? A pergunta trouxe um travo amargo à boca de Tracy. Ela aprendera sim o valor de um dólar, não de uma maneira que Ty Cameron pudesse considerar decente ou honesta. Esse era seu mais íntimo e devastador segredo. Se algum dia ele viesse a descobrir isso, certamente a olharia com desprezo ainda maior que o atual. Mas talvez existisse uma chance mínima que fosse, de conseguir ajeitar as coisas horríveis que tinha feito. Talvez pudesse consertar os danos no carro e na garagem. Se aceitasse o emprego e fizesse um bom trabalho, talvez conseguisse melhorar sua imagem diante de Ty. Podia até se redimir diante dele, pelo menos nesse sentido. Não se permitiu pensar demais em porquê era tão importante que Ty Cameron deixasse de odiá-la. Era uma idéia bem original, a chance de pagar por algo que tinha feito com seu tempo e trabalho. Por um momento quase se deixou levar pela fantasia, antes que o bom senso a trouxesse de volta à realidade. Os padrões de Ty Cameron deviam ser absolutamente altos, provavelmente de propósito. A única coisa certa era que jamais conseguiria alcançá-los e acabaria por se magoar tentando. E quando não conseguisse agradá-lo, teria que suportar o escárnio dele. Essa era a maior razão para que ela recusasse. Melhor sofrer seu escárnio agora do que arriscar seu coração numa causa perdida, que estava fadada ao fracasso por que Ty assim planejara. Tracy tentou soar firme: — Avise-me quando souber do montante. Ele se voltou rapidamente e disse: — Quer dizer que você aceita trabalhar para mim? Tracy nada pôde responder diante da expressão cruel dele. A covardia a deixou muda. Seria bem mais fácil quando estivesse a salvo, no aconchego de sua casa em San Antônio, ligar para ele e dar sua resposta. Se ele reagisse mal, ligaria para o seu advogado para interceder no caso e convencer Ty a aceitar seu cheque. O olhar de Tracy titubeava à medida que o silêncio se prolongava. O terror fez sua voz se apequenar como se ela quisesse aparentar candura. Começou a tremer novamente como se precisasse fazer um esforço extra para enfrentar Ty e lhe dizer que recusava sua oferta. — Que espécie de tolo eu seria se aceitasse trabalhar para um homem que mal suporta a minha presença? Não sei quem você imagina que eu seja, mas ainda não estou tão atolada a ponto de pedir para ser maltratada.
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Um riso amargo marcou os lábios duros de Ty. Tracy podia dizer que o ofendera. Mais uma vez. Ele retaliou, sua voz soou baixa e calma, as palavras dolorosamente atingindo seu alvo. — Claro. Por que pedir para ser maltratada quando você mesma pode fazer isso tão bem? O coração dela se confrangeu com o peso daquelas palavras. Ty fez um gesto de cabeça indicando o carro parado na vaga ao lado do Cadillac. — Eu a levo até San Antônio. Era simples assim. A prova estava terminada. Tracy, vacilante caminhou até o outro veículo, entrou pela porta do passageiro, e sentou-se rígida, ao lado de Ty. A viagem até San Antônio transcorreu em silêncio pesado. Quando chegaram ao destino, todos os músculos do corpo de Tracy doíam de tanta tensão. Assim que o carro estacionou na calçada em frente do seu prédio, ela saltou para a rua. Apoiou-se por um segundo na porta até que sentiu suas pernas se firmarem e então correu para dentro. O porteiro estranhou a pressa com que Tracy se atirou em direção aos elevadores. Tracy sentia-se tão mal que pensou ser capaz de dormir o resto do dia. Seu corpo todo doía, a cabeça latejava tanto que pensou não ser capaz de andar nunca mais em sua vida. A situação de seu estômago não era melhor, pois mal conseguiu engolir duas bolachas de água e sal. Estava tão exausta que mal conseguia caminhar em linha reta, porém estava perturbada demais para dormir. Os minutos daquela tarde e começo da noite passaram tão lentamente que pareceram horas. Quando deu por si, Tracy estava na cozinha de seu apartamento, olhando para a prateleira onde se enfileiravam algumas garrafas de vinho. Fizera tudo errado com Ty Cameron. A lembrança daqueles olhos azuis a examinando, julgando e condenando não a deixavam em paz. Com certeza, Ty jamais emprestara um carro seu para outra pessoa. Num rompante de cavalheirismo, entregara as chaves de um deles para Tracy... Ela não se conformava com o acidente, uma vez que nunca tivera problemas em dirigir qualquer modelo. E estava tão desesperada em sair de perto dele que aceitaria qualquer meio para escapar. Então reuniu todos os seus outros "pecados" usando-os como desculpa para se recusar a trabalhar, ressarcindo com isso os danos que lhe causara. Teria sido mais prudente se tivesse dado uma chance para Ty. Teria sido muito dura em seu julgamento? Que piada, pensou com amargura. A simples idéia de alguém como ela ter o descaramento de julgar Ty Cameron era a melhor definição para "audácia". Os pensamentos iam e vinham atormentando Tracy cada vez mais. A culpa por ter amassado o carro e outros dilemas morais e emocionais se agitavam em seu cérebro. Tracy só conseguiu parar de pensar naquilo quando percebeu que estava parada diante dos vinhos. Se conseguisse dormir, pararia de se atormentar. Por fim percebeu que não havia esperança para o seu caso. Pegou uma garrafa e partiu para o inevitável.
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O banheiro de Tracy era grande como seu quarto. Ela adorava a grande plataforma de mármore em que ficava a banheira, onde podia ficar sentada diante da janela envidraçada olhando para as luzes de San Antônio. Podia se deitar na banheira repleta de água quente, olhar para as luzes e bebericar seu copo de vinho. O CD de música clássica estava muito baixo para que pudesse ouvir a música distintamente, mas o borbulhar da água já era o bastante para quebrar o silêncio. Embora estivesse ao alcance de sua mão, Tracy ainda não provara do vinho. Por um momento julgou ter ouvido a campainha, mas logo se convenceu de que fora só sua imaginação. Não conhecia muita gente em San Antônio, e ninguém freqüentava sua casa. Sozinha em seu santuário, Tracy se concentrou no barulho da água e fechou os olhos. Seu corpo cansado e dolorido começou a relaxar. Até os ruídos externos foram ignorados por ela. Até o momento em que os ruídos que só podiam ser de passos a alertou. Alguém estava caminhando pela sala! A sonolência fez com que seu cérebro demorasse a reagir. Seu corpo parecia pesado demais para se levantar. Tracy se enrolou numa toalha o mais depressa que pôde, assustada com a aproximação dos passos. Virou-se para a porta e lá estava ele... Ty Cameron em pessoa, encarando-a da soleira. — Saia daqui!! — ela gritou ao vê-lo se aproximar. — Como ousa entrar aqui sem minha permissão? — Está tentando beber e se afogar? — Saia!! — Podia tentar atender ao telefone ou a campainha. E o porteiro do seu prédio concordou comigo, você podia estar com problemas. Parecia doente quando chegou e não atendia ao telefone... — Como pode ver estou bem. Agora saia! — Tracy estava tão desesperada para vê-lo partir que nem se deu conta de que estava à beira da histeria. Ty se voltou como se fosse atender a ordem, mas só deu alguns passos antes de dizer: — Enxugue-se e vista uma roupa. Estarei esperando na sala. Tracy apenas ficou olhando-o, em silêncio, ainda chocada com a invasão. Ele se comportava como se pudesse dar ordens ali. Antes que pudesse pegar a garrafa e o copo, viu Ty fazê-lo. Nesse movimento brusco Tracy deixou escorregar a toalha que a envolvia. Quase morreu quando viu o olhar de Ty recair sobre seu corpo. Seus olhos azuis a fitaram longamente. Latejantes. Luxuriantes. Como se só naquele momento ele tivesse se dado conta de que estava diante de uma mulher. Mulher... E tão vulnerável. Nua e acuada, apenas com uma toalha para se proteger. Ty era grande e forte. O coração de Tracy disparou.
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Ty era forte e másculo. Poderia esmagar seus ossos com uma só mão. — Tracy? — O timbre da voz de Ty foi estranhamente gentil. De algum modo isso penetrou em seu íntimo. A usual ironia e condenação sumiram dos olhos de Ty. Ele apenas pegou a garrafa e o copo e saiu, fechando a porta atrás de si. Tracy ficou ali parada, sentindo que de repente, já não temia mais aquele homem. CAPÍTULO III Ty provou do copo de vinho enquanto ia até a cozinha do apartamento de Tracy. Lá viu as garrafas de vinho enfileiradas na prateleira. Em seguida procurou pela lata de lixo. Como já suspeitava, encontrou duas garrafas vazias dentro dela, e nada mais. Bastou abrir a geladeira para ter certeza de que comida não era um dos itens presentes naquela casa. Não era de se espantar que Tracy fosse tão magra. Colocou a garrafa que tinha em mãos dentro de um armário e fechou a porta. Já que estava invadindo, achou por melhor ir ao extremo. Foi até o telefone, discou o número e pediu uma entrega. Feito isso, dirigiu-se para a sala, escolheu um lugar para se sentar e passou a saborear a taça de vinho. Os aposentos generosos do apartamento de Tracy eram imaculados. Tudo era decorado em branco com tons vividos de pastel aqui e acolá, e nas paredes pinturas de excelente gosto. O resultado era um ambiente de classe, feminino e mais acolhedor do que ele poderia supor com todo aquele branco. A poltrona em que estava sentado era macia e confortável. O tempo que Tracy levou para se aprontar não foi curto, mas Ty não se aborreceu com isso. O instinto que o fizera voltar para a cidade e vir à procura de Tracy não se mostrara em vão, soubera disso no instante em que vira a garrafa e o copo de vinho. As pessoas que bebem dentro de uma banheira podem facilmente desmaiar ou adormecer... E daí para um afogamento é um passo. Tracy ficara estarrecida e furiosa no primeiro momento, mas depois se assustara. O motivo para isso era o fato de ter visto o olhar de desejo de Ty, e pior, ele saber disso. A palavra não era assustada, mas apavorada. Estava apavorada. Ele não podia ter se enganado. Talvez ela não fosse nada parecida com aquela sua mãe promíscua e "vamp". Seria uma surpresa e tanto para Ty, se descobrisse que Tracy era tão virginal e pura quanto realmente parecia. Tracy enxugou os cabelos e aplicou uma ligeira maquiagem. A intenção disso não era a de parecer atraente aos olhos de Ty, mas sim se ocultar sob os cosméticos. Apesar dos cabelos à altura dos ombros bem cuidados e da maquiagem lhe darem um ar natural, era como se de algum modo estivesse tentando negar e esconder o que lhe acontecera há muitos anos atrás. A calça caqui e a blusa amarela de mangas compridas que escolheu para vestir
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pareciam excessivamente comportadas, especialmente pelo modo como a blusa estava abotoada, dando-lhe um ar de pureza afetada. Uma vestal glamourosa. Sua mãe a chamava assim e a menosprezava por isso. Por que quando dizia a frase, na verdade queria chamá-la de hipócrita. A lembrança quase a fez perder o controle diante de Ty. Já bastava o fato de ele tê-la visto nua no seu próprio banheiro. Agora possuía mais essa vergonha para atormentá-la. Vergonha e medo. Ty Cameron era tão dominador. Para um homem como ele a vida não apresentava obstáculos, pelo menos, nenhum que ele não pudesse transpor. A invasão de sua cobertura era prova disso e agora seu confortável refúgio do mundo não lhe parecia mais tão seguro. Ficou chocada com a recordação de como se sentira segura ao acordar na casa dele. A memória vivida fez seu coração disparar. E agora percebia que Ty, mesmo podendo fazê-lo, não a ferira. Apesar das terríveis ameaças que lera em seus olhos nada de efetivo fora feito contra ela. Apenas levara o vinho embora, mas não a tocara nem fizera menção disso. Não atendera ao telefone nem a campainha, e isso era motivo sim para preocupação. Duvidava que essa preocupação fosse real ou honesta, vinda de Ty era difícil de acreditar. Há muito, muito tempo, que ninguém se preocupava com ela. O truque era não levar a sério a preocupação que ele demonstrava. Tracy deu uma última olhada no espelho, respirou fundo e saiu em direção à sala. Ty achou que Tracy parecia impecável como uma figura saída das páginas de uma revista de moda. Ela caminhava rígida e teve dificuldade em encará-lo enquanto caminhava sala adentro. Não se sentou. Ao invés disso, ficou de pé atrás do sofá que estava do outro lado da mesa de centro. Como se precisasse colocar entre eles uma barreira de móveis para se sentir segura. E a blusa abotoada até o pescoço era sinal que Tracy estava chocada. A aparência dela era um pouco mais saudável do que a que apresentava na casa de Ty pela manhã. Sua pele clara estava corada pelo calor do banho ou talvez de embaraço. Fora rude de sua parte invadir o banheiro daquele jeito. Claro, tivera razões para agir daquela maneira, mas suas razões provavelmente não deixaram Tracy muito satisfeita. Essa dúvida chamou sua atenção. Desde o começo tomara como certo que Tracy fosse tão imoral e sem valor quanto sua mãe, o que o surpreendia agora era que nada sabia sobre ela e, no entanto, a julgara tão severamente. Tracy LeDeux era bem mais complicada do que ele esperava, e quanto mais o tempo passava desde que a encontrara na boate na noite anterior, mais tinha certeza disso. — Perdoe-me por invadir sua casa, Tracy... — começou ele e franziu o sobrolho quando percebeu que ela desviava o olhar. — Como deve saber sou do tipo que espera por um convite antes de ir tão longe. A sutil referência sexual fez Tracy ficar rígida como uma estátua. — Você não tem nada para fazer aqui. Vou pedir que entre em contato com meu advogado para tratar do ressarcimento dos danos que causei. — Como se para reforçar suas palavras olhou-o diretamente nos olhos como se dissesse: "Se não atendi aos seus telefonemas ou quando bateu em minha porta é por que não tinha intenção de falar ou
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ver você." Tracy viu quando Ty arqueou as sobrancelhas. — Temos negócios a tratar. Você parecia ansiosa para me ressarcir dos prejuízos, agora se recusa a aceitar minhas condições. Imaginei que tivesse tempo para reconsiderar, então achei que deveríamos nos falar novamente. Erguendo o queixo, Tracy retrucou: — É costume de sua família usar de chantagem para fazer com que as pessoas trabalhem para você? Ele entendeu o tom irônico, e sua boca perdeu um pouco da rigidez. — As pessoas gostam muito de trabalhar para mim. Eu pago salários justos e dou generosos benefícios. Valorizo bons empregados e mostro isso lhes dando bonificações em dinheiro de quando em quando. Ty tirou um papel do bolso da camisa. — Mandei avaliar os estragos esta tarde. Tracy olhou para o papel, depois, relutante deu a volta no sofá e o pegou. O montante em dólares a deixou nauseada. Era muito dinheiro. Bem mais do que havia imaginado. Fez um esforço e o encarou. — Por favor... Não há motivo para eu deixar de fazer um cheque deste valor e resolvermos este problema imediatamente. Ty já meneava negativamente a cabeça. Sua fisionomia voltara a endurecer. — Você pediu, ou melhor, implorou para saber como poderia consertar seu erro comigo. Eu respondi. A tenacidade dele a desnorteou. Tracy não compreendia por que não podia apenas preencher um cheque e encerrar o assunto. — Eu estava histérica e apavorada com o que havia feito. Não sei por que não pode aceitar o dinheiro... Por que está fazendo isso? Com olhar perscrutador ele respondeu: — Se eu soubesse... Talvez um de nós descubra a razão enquanto estivermos juntos. — O olhar de Ty tornou-se arguto. — O que mais você tem para fazer atualmente Tracy? A pergunta pegou-a de surpresa. Era apenas mais um truque de Ty para fazê-la aceitar sua proposta. Seu primeiro impulso foi de mentir, fazer parecer que tinha uma vida importante e ocupada. Produtiva. Porém apenas o olhou e já soube que não faria sentido algum mentir. Provavelmente Ty passara o dia obtendo informações a seu respeito. Para um homem com seus contatos e dinheiro seria fácil. Se ainda não o fizera, algo lhe dizia que não demoraria a fazê-lo. Tentou uma nova abordagem. — O que você vai ganhar com isso? Vingança? — A intenção de Tracy era provocá-lo, porém Ty levou a sério a pergunta. Quando respondeu, o fez com voz calma. — Se você recusar, nada. Mas se aceitar o emprego, terei uma funcionária temporária para cumprir algumas tarefas necessárias, mas que não justificam uma contratação efetiva. — Mas vou levar meses até pagar esse montante — argumentou Tracy cautelosa. — Tempo suficiente para você empregar alguém. Mais uma vez a calma de Ty ao responder provou que ele sabia o que estava
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fazendo. — Não estou procurando ninguém permanente. Quando você atingir o valor da dívida, nosso contrato acaba. Não fico obrigado a manter ninguém empregado, e você poderá voltar à sua vida normal. Tracy virou-se e atravessou o aposento tentando aplacar sua frustração. Ele não havia dito: Você me deve isso porque, além de abusar da minha confiança e boa vontade, destruiu o meu carro. Se tivesse dito, poderia refutar tal acusação. Mas Ty era muito mais astuto do que ela podia imaginar. Não proferira aquelas palavras por que sabia que ela devia estar se remoendo pela culpa. Assim, fazia parecer que com um trabalho para o qual necessitava de ajuda, Tracy poderia pagar o conserto do carro e redimir-se perante a ele. — Você mencionou vingança. Por acaso isso significa que teme que eu a maltrate caso venha a trabalhar para mim? Tracy hesitou, depois se voltou para ele: — Você não faz segredo dos seus sentimentos em relação a mim. Não seria essa uma chance ideal para me diminuir e embaraçar? — Tracy engoliu seco ao ver as feições de Ty se fecharem, mas se obrigou a prosseguir até que as coisas ficassem claras entre eles. — Sei que você me despreza pelo que fiz a Rio e Kane. Provavelmente você pensa que eu não fiz o bastante para reparar o mal que lhes causei, ou que não fui punida o suficiente, mas acredite ou não, concordo com você. Deixaram que eu me livrasse muito fácil. Ela tremia tanto que seus dentes batiam uns nos outros. Tentou controlar a emoção antes de prosseguir. Seus olhos queimavam, mas ainda conseguiu segurar mais um pouco as lágrimas. — Jamais serei capaz de compensá-los, mas não é da sua conta julgar ou punir meus pecados. A simples referência aos eventos ocorridos um ano antes, e ao nome de Kane e de Rio foram suficientes para que uma onda de ansiedade varresse o interior de Tracy. A culpa que ela sentira ao olhar para o outro lado enquanto sua mãe maquinava contra Rio, e por ter se calado quando deveria ter contado tudo que sabia, ainda a fazia gritar de dor como há um ano atrás. Quando finalmente denunciara sua mãe e fizera com que Rio e Kane reatassem, agiu com semanas de atraso. Deveria ter exposto as artimanhas de Ramona no instante em que tomara conhecimento delas. Mas um senso de lealdade para com sua única parente e a habilidade de Ramona em retaliar, a fizeram ficar em silêncio e assim se tornar cúmplice de sua mãe. Tracy nunca se perdoaria pela dor causada a Kane e Rio. Tracy ainda não podia entender a facilidade com que eles a haviam perdoado, e como eles haviam insistido que ela era e continuaria sendo um membro da família Langtry. Subitamente a sala começou a girar sob os pés de Tracy. Ela se agarrou ao espaldar de uma poltrona. Estava no limite de suas forças. Como se não bastassem os acontecimentos da noite anterior e daquele dia, a simples admissão de sua culpa no episódio de Kane e Rio, sem contar, e isso só Tracy sabia, no que Ramona ainda podia fazer contra ela, era bem mais do que podia suportar.
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Rapidamente Ty postou-se ao seu lado, amparando-a pelos braços até que seus joelhos se mostrassem capazes de sustentá-la de pé. — Quanto tempo faz desde que você comeu pela última vez? — ele perguntou bruscamente. As mãos dele em seus braços estavam tão quentes, davam-lhe uma sensação... Tão bem-vinda. O choque ajudou Tracy a se recuperar. Há muito que nenhum contato masculino era realmente bem-vindo, nenhum toque vindo de um homem seria seguro novamente. Ergueu os braços para manter Ty à distância. A rigidez e o calor de seu peito o fizeram parecer maior e mais poderoso do que nunca. O batimento compassado de seu coração contra sua palma enfatizava o fato de que ali estava um homem forte, viril e de carne e osso, não um super-herói de mentirinha... Impressionante. Sua masculinidade era impressionante. E naquele momento em que o corpo de Ty fazia uma demonstração assustadora de poder, algo débil e inegavelmente feminino respondia no corpo de Tracy. Ela gostava do seu toque, e gostava de tocá-lo também. Tal percepção a assustou, fazendo-a dar um passo para trás. O que aquilo significava? O olhar de Ty perscrutava sua face pálida e ela se esforçou para ocultar a confusão em que seus pensamentos se encontravam. — Eu perguntei há quanto tempo você não come. Tracy balançou a cabeça. — Eu comerei algo... Mais tarde. — Vai mesmo. Eu pedi para entregarem. Como se as palavras tivessem um poder mágico, no mesmo instante tocou o interfone. Ty a deixou e foi atender a chamada. Viu-o autorizar a entrega, tirar duas notas altas da carteira. Ele estava no comando. Tracy se ressentiu disso imediatamente. Mas havia uma outra parte nela que estava grata e aliviada por ter alguém tomando conta de sua vida, alguém tão interessado em seu bem-estar que era capaz de se intrometer dessa maneira. Ty Cameron era um homem que sabia exatamente o que e como obter tudo que desejava. Sim, era dominador e agressivo quando ia atrás do que queria. Mas provavelmente nunca em sua vida se sentira perdido. Era alguém seguro de si e do seu lugar no mundo. Não acordava de manhã e se perguntava como iria preencher seu dia. E não precisava beber à noite para conseguir dormir por que se sentia sem valor e mergulhado em culpa. Tracy admirava isso, e ansiava por poder ser do mesmo jeito. Para ter um propósito, uma direção, para sentir-se valorizada perante as outras pessoas. Para ter valor para si mesma. Vendo Ty abrir a porta para o entregador do restaurante, pagar e pegar as caixas com comida, admirou sua segurança. Ty fechou a porta atrás do homem e trouxe as caixas para a sala de jantar. Tracy o seguiu, subitamente preocupada por estar se sentindo bem. Sabia que aquela sensação de bem-estar e esperança era perigosa. Com amargura lembrou-se do quão fácil era se decepcionar.
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Mas assim que as caixas foram abertas e o aroma delicioso de alho se espalhou pela sala, Tracy se deu conta que já era tarde demais. Se não podia impedir a si mesma de ter esperança, ao menos podia tentar se controlar para não esperar demais. Correu até a cozinha para buscar talheres, pratos e guardanapos. Ty a seguiu e trouxe copos e chá gelado. Quando se sentaram para comer, Tracy já estava salivando antevendo as delícias que iria saborear. Ela murmurou um rápido "Obrigada", que Ty respondeu pegando o garfo. — Eu gosto de comida italiana, mas raramente como em minha casa. Pensei que seria melhor pedir este frango do que um prato com molho de tomate. O Frango à Alfredo estava delicioso, mas Tracy continuava em guarda. — Comida sempre fica melhor quando há alguém para nos fazer companhia. Tracy tomou aquilo como uma indireta, por instantes perguntou-se se Ty estaria com pena dela? A questão mexeu com seus brios. Ty terminou de comer e se recostou na cadeira. — Se você concordar em trabalhar comigo Tracy, e depois vier a concluir que sou injusto com você ou impossível de agradar, poderá preencher um cheque e deixar o emprego, sem ressentimentos. O olhar melancólico de Ty era quase como um imã, e foi impossível para Tracy desviar a atenção dele. Confiava naquele homem completamente. Como ela não dissesse nada, ele prosseguiu: — O trabalho não será fácil no começo. Terá que se esforçar muito e requer força física. — Está querendo dizer que vou trabalhar no rancho? Será que não há nenhum trabalho de escritório que eu possa fazer? — argumentou Tracy incrédula. — Eu nunca fiz nada parecido. O embaraço dela foi tão evidente que Ty logo retrucou: — Você não é filha adotiva de Sam Langtry? Se bem o conheço ele deve ter mostrado a você um bocado de coisas em sua fazenda. — Sam ensinou Rio e não a mim, talvez você precise de alguém como ela, não como eu. Nunca fiquei tempo suficiente no rancho para aprender algo. Minha mãe... — Mudou de assunto rapidamente. — Kane me ensinou a montar e me levava para cavalgar de vez em quando, mas... Sua voz morreu e Tracy mergulhou em suas lembranças. Ela era uma total incompetente. Rio ao contrário, era espetacular em tudo que dizia respeito ao rancho ou aos animais. Rio crescera na fazenda enquanto que Ramona odiava o lugar. Nos primeiros seis meses de casamento de sua mãe com Langtry, Tracy passara apenas duas semanas lá. Mas Sam Langtry a havia amado apesar de tudo. Claro que amava Rio e Kane que eram seus filhos legítimos, mas isso não o impedira de amá-la. Agora Sam se fora. E com ele, todo o amor e o carinho que recebera em sua vida. — Como eu já disse, Rio é maravilhosa em tudo que faz mas eu não sou como ela. — Virei aqui amanhã e sairemos para comprar as roupas que vai precisar. Tracy olhou-o incrédula e disse: — Falei sério, senhor...
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— Ty. — Ty, eu não sou Rio. Aliás, sou o oposto dela. — Se trabalhar para mim, então já estará fazendo algo que Rio não faria. Ela me deixou na mão. — Não estou competindo com ela. Nunca fiz isso — retrucou Tracy com rudeza. — Claro que já fez. Não seria normal se não o fizesse... Ao menos um pouquinho. Irmãs agem assim. Esteja pronta amanhã à uma hora. Terá tempo de fazer as malas antes de se mudar para o rancho. — Como assim me mudar? Não posso fazer isso! — Não tem outra opção. — Ty abriu um enorme sorriso. — Vamos pôr um pouco de carne sobre esses seus ossos, menina. Verá que não será tão mau assim Tracy. Eu sei apreciar gente trabalhadora e de caráter. Tracy sentiu um nó na garganta. Ty a ajudou a levar as louças para cozinha e depois de vê-las colocadas na máquina de lavar louça, deixou a cobertura. O discurso final dele a perturbou, aquela história de bom caráter não estava clara para Tracy. Mas, afinal de contas, para uma hipócrita como ela que tinha tanto a esconder, não seria difícil descobrir mais esse truque. CAPÍTULO IV Na tarde seguinte, Ty foi pontual. Sua noção de como comprar roupas e utensílios para o rancho provou ser uma lição de rapidez e eficiência. E ele era um tirano. O Stetson dela tinha que ser o Stetson, e não qualquer chapéu. As camisas e calças jeans tinham que ser um número maior que as que lhe serviam no momento, por que ele tinha certeza que a faria ganhar peso. As botas também, já que precisariam ser confortáveis mesmo depois de horas de uso. E meias, meias que suavizassem o impacto do couro nos seus pés. Tracy não objetou. Lembrou-se da primeira vez que Kane a levara para cavalgar. Havia se negado a tomar algumas roupas emprestadas de Rio. Ao invés disso, apesar das objeções de Kane, usara uma camisa de mangas curtas, jeans justos e botas finas com meia-calça. O resultado disso fora voltar do passeio com assaduras pelo corpo todo. Depois daquele incidente comprara roupas apropriadas, que haviam se perdido entre uma das últimas mudanças entre o Rancho Langtry e a cobertura de sua mãe em Dallas. Então seguiu adiante com os ditames de Ty. A conversa entre eles era esparsa e o coração de Tracy estava em um turbilhão de dúvidas. E se depois de comprar todas aquelas roupas e se preparar para mudar para o rancho, seu esforço se revelasse inútil... O que faria se tudo desse errado? O que aconteceria se ela não pudesse fazer o trabalho? Se realmente descobrisse que era totalmente incompetente, sem possibilidade de melhora? Quanto tempo Ty levaria para ver suas expectativas quanto a Tracy serem frustradas? Claro, uma vez que ela decepcionava-se a si mesma com tanta freqüência, por que o mesmo não poderia acontecer com Ty, que era dinâmico e trabalhador?
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Estavam colocando os últimos pacotes de Tracy no bagageiro do carro de Ty quando ele falou: — Tem dúvidas? A pergunta a fez sentir-se transparente. Ela sabia que era boa em esconder seus sentimentos e pensamentos, o que significava que Ty era mais perceptivo do que as pessoas com quem costumava se relacionar. Não tinha certeza se isso era bom ou ruim, mas o fato a deixou com a sensação de que entre eles existia pelo menos, uma pequena conexão. E isso era potencialmente perigoso. Olhando-o atentamente, respondeu: — Isso está começando a se transformar em uma grande produção. Estou começando a pensar que você espera que eu marque a ferro, sozinha, cada uma das cabeças de gado da sua fazenda, numa só manhã. — A época de marcar o gado já passou faz tempo. Mas se fosse o caso, prometo que teria um dia inteiro para fazê-lo... — ele disse com um meio sorriso. Tracy examinou-lhe a expressão tentando descobrir se Ty Cameron estava falando sério ou não. — Foi uma brincadeira, Tracy. Você se preocupa um bocado, não é? Ela desviou o olhar, e Ty pôde ver sua expressão ir relaxando gradativamente. — Talvez quando me conhecer melhor você consiga relaxar um pouco mais. Aqueles enormes olhos azuis voltaram a fitá-lo como se buscassem a verdade, mas Ty ignorou sua cautela. — Pronta para voltar para casa e apanhar suas coisas? — Pus tudo no meu carro esta manhã, basta pararmos na garagem. Entraram no carro, Ty no volante e Tracy no banco do passageiro. Um leve traço de preocupação voltou a marcar sua testa. Esperou que ele desse a partida no motor antes de perguntar: — Ty... Na outra noite, quando me levou para sua casa, a empregada estava lá? — Maria tira os sábados de folga, e só voltou depois que eu a trouxe para sua casa. Portanto a resposta é não. Ninguém além de você, eu e Parker sabe que você esteve no Rancho Cameron, desmaiada. Mas Maria sabe que foi você quem destruiu a garagem e o carro. E antes que pergunte, ela não sabe a razão que a levou a visitar o rancho com Kane, ano passado. Vendo o desconforto estampado no rosto de Tracy, emendou: — Não é o fim do mundo, Tracy. Console-se com o fato de que ninguém sabe que esteve em Cameron, muito menos em que estado você se encontrava. Tracy desviou o olhar. — Eu não estava bêbada aquela noite. Tinha tomado apenas um drinque antes, e alguns goles do segundo... Um espasmo de raiva fez Ty ignorar o resto das palavras dela. Claro que estava embriagada. Talvez não fosse preciso muito para uma mulher do seu tamanho, mas fora o bastante para fazê-la desmaiar. Ele não gostava de ouvir mentiras, uma vez que ambos sabiam a verdade, mas deixou passar. Pelo menos por enquanto. Tracy não escolheu seu quarto no Rancho Cameron. Maria Sandoz, a governanta,
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havia feito isso por ela. Tracy não fez objeção. O quarto era próximo ao centro da casa tanto quanto da suíte de Ty e tinha um quarto de hóspedes vago no momento, entre eles. Longe o bastante para sua tranqüilidade. Desfez as malas rapidamente, tirou as etiquetas das roupas novas e separou-as para serem lavadas. Maria voltou ao quarto exatamente quando Tracy terminava e debaixo dos seus protestos inúteis, levou as peças para lavá-las pessoalmente. Ty pedira que fosse encontrá-lo depois de se instalar, então foi o que ela fez. No escritório, o encontrou sentado atrás de uma grande escrivaninha. — Gostaria que você preenchesse alguns papéis antes de começarmos a trabalhar. São formulários padrão. Pode usar minha mesa para isso. Quando terminar me encontre na sala de jantar para comermos. Mais tarde, já sentados à mesa, começaram a jantar em silêncio. Tracy se sentira completamente inadequada ao preencher os formulários de emprego. Ramona a proibira de arrumar qualquer trabalho, e com a fortuna que herdara um ano antes nem lhe passara pela cabeça procurar algo para fazer depois que deixara sua mãe. Tinha feito um ano de faculdade antes que as exigências de Ramona a obrigassem a parar. Naquele ano aproveitara todas as aulas de Arte permitidas, já que sabia que sua permanência ali seria curta. Ramona desprezara sua escolha, mas teria sido pior se tivesse optado por um currículo mais tradicional. Sentira-se desconfortável vendo Ty ler seu currículo à mesa. Já estavam no meio da refeição quando o viu pegar o papel novamente. Percebeu quando o olhar dele se deteve no campo destinado aos seus empregos anteriores. Estava em branco. No instante em que ele levantou os olhos em sua direção Tracy baixou os seus para o prato. — Você nunca teve um emprego? Ou deixou em branco para que eu não pegue referências suas com antigos patrões? — Nunca trabalhei — respondeu ela. — Sempre foi tão rica a ponto de não pensar nisso? — Acho que sim. — O olhar de Tracy caiu sobre a comida. Isso não era verdade, ela e a mãe nem sempre tinham sido ricas. Na verdade, se lembrava de tempos sombrios sem dinheiro e dos esquemas nojentos que sua mãe usava para continuar vivendo sua vida desregrada. Ela nunca revelara aquilo a ninguém, pois sentia vergonha dos atos que sua própria mãe praticava. — Apenas um ano de faculdade. Mesma razão? Tracy tomou fôlego antes de assentir. — Quando você era criança, o que queria ser quando crescesse? — Ty perguntou, em seguida. — Nunca pensou em ter uma carreira? Agora era fácil detectar a desaprovação na voz de Ty. Ele jamais entenderia. Tomaria como preguiça ou tolice suas atitudes. Ah, se ele soubesse... Tracy tinha um sonho sim, um sonho para quando se libertasse da relação tóxica e sufocante que mantinha com a mãe. Era tão disparatado esse sonho, que muitas vezes o
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considerava mais como fantasia... Mas, por medo de dividir segredos, o mantinha apenas para si. Era o seu mais doce segredo. — Tracy, não respondeu minha pergunta. Ela olhou para Ty. A rispidez dele a levou a falar a verdade, talvez por acreditar que jamais ele a levaria a sério. — Eu queria escrever e ilustrar histórias que eu inventava para me distrair. Era uma confissão imensa e verdadeira. E provavelmente soaria frívola aos ouvidos de um homem com ele. Porém quando viu o interesse em seus olhos, Tracy se retesou na cadeira. Iria fazer troça dela? Por que havia lhe contado? Céus, que tolice!! — Bem, eu superei isso — Tracy disse, colocando seu guardanapo de lado. O sofrimento que essa mentira causou a fez sentir-se traindo seu sonho, mas não suportaria o escárnio de Ty. Fora sua culpa expor algo tão íntimo e precioso. Sua mãe não lhe ensinara nada? — Isso é muito ruim. As palavras de Ty a fizeram sentir um súbito cansaço. Ele estava simplesmente sendo educado. Não podia ser sincero aquele ar de desapontamento. Afinal Ty era dono de uma fazenda imensa e de várias outras companhias, por que levaria em conta os sonhos insignificantes de alguém como ela? — Que tipo de trabalho farei amanhã? — perguntou Tracy mudando de assunto. Seu apetite se fora, mas Ty continuava saboreando a comida. — Preciso de uma mão firme para me ajudar. Tracy tentou agir como se não se incomodasse com o jeito dele. Teria de se acostumar, já que ficaria lá por meses. Muitos meses, provavelmente. — Já calculou quanto tempo vou levar para pagar o que lhe devo? — Quer mesmo que eu faça isso? — Acho que não... O silêncio recaiu entre eles e Tracy não pôde deixar de pensar na noite em que Ty a trouxera para casa inconsciente. Precisava saber o que havia se passado. Suspeitava que Greg colocara algo em sua bebida, mas quando e como viera parar ali? Onde e em que condições fora encontrada por Ty? Fisicamente não havia indícios de que fora estuprada, mas isso não queria dizer nada. Embora essa idéia fosse nauseante, tinha que saber a verdade. Assim que ele terminasse de comer, perguntaria a respeito. — A outra noite... Como foi que acabei vindo parar na sua casa? Ty apenas a olhou longa e profundamente. O estômago de Tracy dava voltas de ansiedade e receio. Provavelmente ele estava pensando em qual era a melhor maneira de lhe contar a verdade. Que devia ser tão horrenda quanto suas suspeitas. De repente Ty atirou seu guardanapo e se levantou da mesa. Parecia furioso, e Tracy ficou ainda mais confusa. — Ele me deixou em algum lugar público? — Você desmaiou, ele a carregou para fora da boate. Encontrei-os na calçada e aquele playboy concordou que seria mais prudente que eu a trouxesse para casa. Foi isso.
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O alívio de Tracy foi imenso ao ouvir o relato. Mas passou logo. E ela sentiu-se mortificada em seguida. — Eu não estava bêbada, Ty. Juro. Greg pôs algo na minha bebida. Ty ergueu o sobrolho, em descrédito. Tracy insistiu: — Então, como explicar que em um momento eu estava bem e no seguinte desmaiei. — Você tem sempre esses desmaios? — Não, claro que não... A expressão dura dele se suavizou um pouco ao dizer: — Tracy há sempre a primeira vez. — Não é o que você está pensando... Juro. — Mas você tem um problema com a bebida. — Não era uma pergunta era uma afirmação. — Estava tomando um pouco de vinho para conseguir dormir... Só isso. Ando um pouco tensa e... — Tenho algumas garrafas em casa, isso será um problema? — Ty perguntou sério. — Não. De jeito algum. — Não tenho contra quem bebe socialmente, mas vou avisando que não tolero um empregado meu bêbado. Se você beber durante o trabalho ou aparecer embriagada na minha frente, saiba que a expulsarei daqui mais rápido do que um raio. Fui claro? Tracy se sentia enjoada com a conversa. Ele ainda não acreditava nela. Fez um gesto de cabeça assentindo. — Sim. Ty pareceu satisfeito com a resposta. — Você terá um remédio natural para sua insônia aqui. Chama-se trabalho duro. E ele tinha o remédio para a pequena dose de simpatia que chegara a despertar nela, sua aspereza. A manhã seguinte foi um pesadelo. Tracy tinha estado preocupada demais para conseguir dormir na noite anterior, e após duas horas limpando estábulos estava morta de fadiga. Não passara bem nas últimas semanas, mas agora se sentia muito, muito pior. Estava apavorada com a possibilidade de enjoar e suas pernas bambearem, apavorada com a possibilidade de mostrar qualquer indício de seu mal-estar e Ty interpretar como um sinal de preguiça ou má vontade para com o trabalho. A inexperiência já a fazia vagarosa e o mal-estar só piorava as coisas. E o estábulo parecia sólido. Apenas uns poucos cavalos permaneciam ali, mas cada baia precisava ser limpa. O que significava manejar um ancinho e uma pá, retirar a palha imunda e varrer depois. Não ousava ir até a casa para pedir uma aspirina ou outro analgésico, então suportou calada uma dor de cabeça terrível. No final das contas, apenas seu orgulho a mantinha trabalhando. Não era apenas um trabalho para pagar seu débito, mas a chance de um recomeço. Sua vida de milionária estava uma desordem tão grande, que ela sozinha não conseguia organizar. Por mais patético que isso parecesse, fazer trabalho pesado e servil era algo tão diverso de qualquer coisa que já tentara que podia ser a única maneira de tirá-la daquela
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crise. De repente, cavar estrume de cavalo virará sua grande chance na vida. Só não riu nessa hora por que precisava poupar suas forças para continuar trabalhando. Ty pôde observar Tracy no almoço por que ela parecia distante de tudo. Comeram na cozinha, porém o único que apreciou a refeição foi ele. A princípio Tracy se atirou na comida quase com desespero. Agora, ela comia como se cada garfada fosse pesada demais para ser levada a boca, e as mastigava com lentidão como se o esforço fosse extenuante. Ela estava suada e amarrotada, e seus cabelos pareciam tão sem forças quanto ela própria. Exceto pelas olheiras que acentuavam a falta de brilho em seus olhos, pela vermelhidão de suas bochechas causadas pelo esforço físico, seu rosto estava branco como papel. E o tremor que sacudia seu corpo era tão involuntário que Ty duvidava de que Tracy estivesse ciente dele. A culpa tornava difícil para Ty sustentar-lhe o olhar, mas ele continuou a observá-la. Sabia, obviamente, que uma manhã no estábulo era uma coisa que Tracy não estava apta a fazer, pois o serviço era pesado demais, principalmente para uma garota que jamais havia feito nada na vida. E depois, sua aparência mostrava que ela não estava apenas cansada, mas exausta. E doente... Não estava em condições de executar aquele trabalho e ele não devia tê-la pressionado tanto para que o aceitasse. — Você pode ficar aqui dentro esta tarde — disse Ty, imediatamente arrependido pelo seu tom de voz ríspido. — Ainda tenho baias para limpar. Ty disfarçou sua surpresa. Nem de longe imaginara que encontraria resistência à sua ordem. Mas leu no olhar de Tracy um laivo de orgulho ferido. — Alguém terminará o trabalho. — Você me deu essa tarefa. Posso terminá-la até o fim do dia, prometo que amanhã serei mais rápida. Ao ouvir o tom emocionado das palavras dela Ty sentiu-se ainda pior. — Se você abusar hoje, não restará energia alguma para amanhã. — Restará sim. Teria que ser mais firme com ela. — Eu quero que tire o resto do dia de folga. Considere isto uma ordem. Tracy estava visivelmente contrariada. — Não. Você vai achar que sou preguiçosa ou que desisto fácil por que sou uma garota rica e mimada. — Não vou pensar nada disso. — Vai sim. Já acha que sou uma mentirosa, alguém incapaz de merecer confiança. Não vou lhe dar chance para se certificar que sou uma indolente que não serve para nada. Dito isso, pôs seu guardanapo sobre a mesa e levantou-se abruptamente. Foi o bastante para perder o equilíbrio, Ty correu para ampará-la, mas não foi rápido o bastante para evitar que, na ânsia de se apoiar na mesa Tracy derrubasse seu prato no
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chão. O barulho fez Maria correr para a cozinha. Tracy apoiava ambas as mãos contra o torso de Ty, impondo certa distância. Ele a fez sentar-se novamente e ficar quieta. — Chame o médico Maria e veja se ele pode vir já, caso não possa, chame uma ambulância. — Não. Não preciso de médico. — Claro que não, sou eu quem precisa... Você está doente garota, está ardendo em febre. Tracy balançou a cabeça. — Estou apenas cansada. Daqui a pouco estarei recuperada. — Bobagem. Vai ver um médico nem que eu precise carregar você. — Não vai não. Não pode... A resposta de Ty foi instantânea. Pegou-a no colo e sem lhe dar chance de reação, carregou-a porta a fora. — Normalmente eu admiro teimosia — Ty comentou ao ajudá-la a entrar no carro quatro horas mais tarde. — Mas não quando ela coloca em risco a saúde de um dos meus empregados. Tinham passado a tarde num cubículo do pronto-socorro a espera de um médico. Tracy respondera as perguntas dele, fizera uma série de exames de sangue, fora submetida ao exame físico e quando finalmente lhe deram um diagnóstico Ty a repreen-deu suavemente. Tracy estava anêmica e com uma infecção respiratória. Foi-lhe prescrito um antibiótico, algumas vitaminas e repouso absoluto por dois dias. E nas próximas semanas devia evitar qualquer esforço físico. Agora estavam ambos no carro de Ty. — Pode me deixar em casa, posso fazer repouso lá. — ela pediu. — A menos que prefira esquecer do emprego e aceitar meu cheque. — Fará repouso em Cameron onde Maria poderá cuidar de você. Em seguida, ligou o carro, engatou a primeira marcha e saiu. Tracy abriu os olhos e olhou-o com ressentimento. Tudo tinha que ser do jeito dele. Ele estava esperando por isso. — A menos que você queira desistir. A maneira com Ty pronunciou a palavra desistir foi devastadora. A intenção era fazê-la reagir, deixá-la com raiva demais para desistir. Conseguiu seu intento. Irada, Tracy replicou: — E lhe dar motivo para dizer que estava certo com relação a mim? Esqueça, não vou lhe dar essa satisfação. A raiva lhe dera energia para reagir à provocação. As sobrancelhas de Ty se levantaram e ele sorriu. Um sorriso lindo que mexeu com Tracy. — Malcriada e raivosa. Parece que a soneca que tirou na maca lhe fez bem. Mais um cochilo antes do jantar, e você vai se sentir ainda melhor. Tracy mal fechou os olhos e já estava adormecida. Nem percebeu quando Ty a tirou do carro e a carregou até a cama.
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CAPÍTULO V Para uma insone veterana, a idéia de ficar de cama era simplesmente horripilante. Tracy temia dormir durante o dia e perder o sono à noite. Temia passar mais uma noite acordada, se revirando por entre os lençóis, com os pensamentos ocupados com aquelas lembranças horríveis que gostaria de esquecer. Então na manhã seguinte se levantou, vestiu-se e arrumou a cama, mesmo com todos os músculos doloridos. Apressou-se em chegar à sala de jantar antes que Maria lhe trouxesse o desjejum na bandeja. Ty já estava sentado à mesa lendo o jornal e saboreando sua primeira xícara de café quando ela chegou. Suas sobrancelhas se arquearam em desaprovação. — Você devia estar na cama — ele a lembrou. Sua voz ainda estava rouca, devia ter acordado fazia pouco tempo. — Não posso passar o dia deitada e ainda conseguir dormir a noite. Além do mais, sinto-me muito melhor — respondeu Tracy sentando-se no lugar que habitualmente lhe era reservado à mesa. — Parece mesmo melhor. Sem febre. Ela aproveitou a deixa. — Acho que tudo que eu precisava era de uma boa noite de sono. — Você precisa de dois dias de repouso absoluto. Pelo menos dois dias. Sem discussão. — Não me sinto doente a ponto de ficar de cama. Na verdade, nem me sinto doente, apenas um pouco dolorida. — Tracy... — Ficar deitada não vai me deixar mais forte. — Não se trata de ficar mais forte, mas sim de curarmos sua anemia. — argumentou Ty. O fato de Ty ter usado o plural, estranhamente fez coração de Tracy pulsar mais forte. Havia dito tão naturalmente aquilo, como se restaurar sua saúde fosse uma tarefa tão dele quanto dela. Certamente ele não pretendera que seu comentário tivesse essa conotação, mas foi o que deu a entender. — Vou comer melhor, e agora tenho também as vitaminas para tomar. Depois, que espécie de médico diagnostica uma infecção respiratória e prescreve dois dias de repouso absoluto? Pensei que estivesse com pneumonia. — Você está com uma infecção respiratória, e a última coisa que precisa é ficar respirando poeira e pó de feno. Teria ele mudado de idéia quanto ao pagamento da dívida em trabalho? Ou estaria mesmo preocupado em protegê-la de qualquer maneira? — Ainda não tive sequer uma crise de tosse, hoje. Acho que aquele médico cometeu um engano, mas mesmo que ele esteja certo, me recuso a passar o dia na cama. Não há nada que eu possa fazer? Percebi que não posso limpar estábulos, mas certamente deve haver algo que eu possa fazer para saldar minha dívida. E agora tem também a conta de
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ontem do hospital. — A conta do hospital é problema meu, já que você trabalha para mim. E depois, um dia ou dois não fazem muita diferença numa longa jornada. — Eu já estava doente antes de você me contratar, portanto a conta do hospital é minha. Se já a pagou, pode adicionar o valor ao meu débito. — Pior ainda. As palavras concisas agitaram Tracy. — Você está exagerando. A conta do hospital é minha responsabilidade. — Você trabalha para mim. Tracy suspirou, já cansada, mas ao menos já tinha uma resposta, ele não desistira da idéia de vê-la trabalhando em troca de seu débito. — Não sou um de seus cavalos, então você não é responsável por mim o tempo todo. — Você teve um colapso durante a jornada de trabalho. Fim da discussão. — Continuo querendo algo para fazer — insistiu ela. — Você não tem uma piscina? Não precisa de alguém para mantê-la limpa e analisar o PH da água? Posso fazer isso, de outra maneira vou voltar para San Antônio. — Você está discutindo comigo agora, mas bastará você sair lá fora para ficar como a chama de uma vela sob o vento forte. — Não vou não. Ademais, se me cansar posso voltar para casa. Maria entrou na sala. — Esta mocinha deveria estar na cama, fazendo o repouso que o médico mandou — disse ela para Ty, apontando para Tracy, enquanto punha dois pratos fumegantes diante deles. Havia comida para ambos, portanto Tracy concluiu que Maria estivera ouvindo a conversa deles. Porém a boa senhora acrescentou: — Mas, si, ela realmente está com uma cara melhor. Minha comida vai deixá-la mais forte. Talvez deva levá-la com você, mas a traga de volta para descansar antes do almoço. Desse modo ela pode ficar aqui dentro, e não voltará para casa. Ty ergueu a cabeça e fitou Maria com um olhar decepcionado. — O médico disse descanso absoluto. Ela não duraria uma hora, mesmo dentro da picape. — Então ambos aprendam uma coisa. Você pode achar que ela não agüenta mais de dez minutos lá fora, eu também não acho que o médico esteja certo... Tracy não vai agüentar ficar dois dias deitada. Como se já tivesse dito o bastante por hora, Maria voltou para a cozinha. Ty levantou a voz, mas teve que segui-la até o outro cômodo para falar com ela. — Maria, quem paga o seu salário? A porta fechou-se atrás de Maria, mas ambos ouviram sua resposta. — Um patrão muito generoso que é conhecido pela sua sabedoria e formosura. Um risinho escapou antes que Tracy pudesse se conter. O olhar decepcionado de Ty dirigiu-se para ela, o que fez o sorriso desaparecer de seu rosto. O jeito como Ty e a empregada se relacionavam era inesperado para Tracy. A insubordinação de Maria e a reação de Ty a isso lhe causaram um efeito surpreendente. Sem dúvida mudou sua impressão a respeito dele. Subitamente o mundo parecia mais brilhante e mais esperançoso.
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— Você devia sorrir mais vezes — Ty recomendou, surpreendendo-a naquela atitude descontraída. — Não acho que tenha visto um deles ainda. Pode ser agradável. — Em seguida pegou o garfo e começou a comer. Tracy sentiu um terremoto dentro de si. Uma das primeiras vezes que ela e a mãe tinham visitado o Rancho Langtry antes de Ramona se casar com Sam, ele havia dito algo parecido: — Srta. Tracy, não acho que já tenhamos visto um dos seus sorrisos ainda. Isso seria realmente maravilhoso. Tracy pegou o garfo e tentou suprimir a emoção que aquela lembrança lhe trouxe. Às vezes ela sentia tanta saudade de Sam Langtry que não podia suportar. Mas, precisava lembrar-se de que Ty não tinha nada parecido com Sam. Estranhamente, ao pegar seu garfo, surpreendeu-se desejando que Ty pudesse vir a ter algumas das qualidades do bom e velho Sam. Não por que estava atraída por Ty Cameron, mas porque isso significaria ter mais um homem bom no mundo. Tracy acompanhou Ty quando ele reuniu seus homens para a revisão das tarefas do dia. Ele a apresentara a todos no dia anterior. Mas o que não pode prever foi seu embaraço ao sentir sete pares de olhos fixos no seu rosto enquanto não recebia tarefa alguma. Um daqueles homens tinha terminado seu trabalho no dia anterior, portanto já sabiam que ela não estava apta para aquele serviço. Ficou aliviada quando os homens se dirigiram para fora, cumprimentando-a polidamente ao passarem. Ty os seguiu, e quando chegou à porta, parou para que ela o precedesse. — Se você ainda acha que está bem, podemos ir levar suprimentos na nova cerca. Pode manusear os portões, mas só os portões. Era patético ver a alegria de Tracy por ter algo para fazer. Mas ela também estava ciente de que aquele era um pequeno teste. Volta e meia sentia o olhar de Ty sobre si, procurando por qualquer indício de cansaço. E apesar de não se sentir tão cansada, procurou esconder a ansiedade que sentia por ele tê-la deixado trabalhar naquele dia. Ty dirigiu a picape em baixa velocidade através da estradinha que acompanhava a cerca. A cada portão perto dos postos Tracy saía da caminhonete, abria, esperava ele passar com a caminhonete e fechava em seguida. Eram cinco ao longo do caminho e quase que Tracy capitulou no último. Além de estar abatida, o esforço de esconder isso de Ty a consumia ainda mais. Sua frustração a deixou emotiva. O que estava fazendo no Rancho Cameron, provando que podia abrir e fechar portões? Discutindo para merecer uma tarefa para depois de dois quilômetros estar exausta? — Será que você consegue dirigir? — Dirigir? — Tracy olhou para ele. Apontando à frente, Ty mostrou que dois dos seus homens estavam usando um trator para rolar as estacas para a nova cerca. — E só manter a caminhonete à esquerda e depois um pouco à frente do trator, assim posso ajudá-los a colocar os pilares nos buracos. — Vai confiar outro veículo em minhas mãos? Um leve sorriso aflorou nos lábios de Ty, e ele resolveu ignorar a pergunta.
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— Você pode dirigir ou prefere que eu chame outra pessoa para fazê-lo? — Mas... — A única coisa que você pode atingir aqui é o trator, mas duvido que consiga bater nele. — Todos sabem sobre o que houve na garagem? — O que acha? Você provavelmente é a maior fonte de divertimento que já tivemos nos últimos tempos. Tracy desviou o rosto e sentiu as faces queimarem de vergonha. Num sobressalto sentiu a mão forte de Ty em seu antebraço, e o ouviu concluir: — E provavelmente a mais linda mulher em quem qualquer um de nós já pôs os olhos. Qualquer coisa que faça chamará a atenção de todos. O olhar dela flutuou de encontro ao dele como se a reação ao toque fosse devastadora. Havia algo de doce em seu olhar, algo que a fez desejar coisas há muito esquecidas. Ty afastou a mão, mas seus dedos ainda se demoraram tempo suficiente para sugerir relutância. Seus olhares se cruzaram por um instante e Tracy não pode desviar a atenção. Durante anos qualquer toque masculino a apavorara e agora, quando Ty a tocava só o que conseguia era ansiar por mais. Seus medos desapareciam diante dele. Com todos os homens do mundo, por que justamente com Ty tinha que se sentir desse jeito? E por que motivos a simples idéia de que ele poderia tocá-la novamente a enchia de ansiedade? Tracy ficou muito mais de uma hora com Ty aquela manhã, mas ficou feliz quando ele a trouxe de volta para casa e pôde se recostar para um cochilo. O calor lhe roubara as forças. Havia certa satisfação em saber que suportara a tarefa que lhe fora designada. Mesmo quando sentira a fraqueza dominando suas pernas, prosseguira firme no volante até que Ty tivesse terminado de colocar os mourões. Adormeceu logo, e só quando Maria a chamou para o almoço é que despertou. Realmente estava doente, pois ao acordar, a fadiga ainda tomava conta de seu corpo. Acordou, comeu e voltou a dormir até a hora do jantar. Os dois dias que se seguiram transcorreram mais ou menos do mesmo jeito. Tracy se limitava apenas a comer e dormir, sem sair do quarto. No terceiro dia, aborrecida por não ter nada para fazer, atormentou Maria até que conseguiu permissão para que tirasse o pó dos móveis da sala de estar e jantar. Na hora do jantar, sentada à mesa com Ty, abordou o assunto. — Gostaria de voltar aos estábulos amanhã. — Ainda é muito cedo — respondeu ele. — Então por que estou aqui? A cada dia que passa me sinto mais em débito com você. Ty descansou o garfo sobre a mesa e falou: — Ainda não está pronta para o trabalho pesado, mas já provou que é capaz de forçar sua natureza até o ponto de ter um colapso de tanto trabalhar. Se estivesse bem, seria diferente, mas no seu estado esse comportamento é apenas autodestrutivo. Por dias ele tinha sido gentil e delicado com ela, mas o tom de desaprovação tornara a aparecer em sua voz, mostrando qual a real opinião dele a seu respeito.
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— O jeito como eu me exijo não é da sua conta — replicou Tracy em voz muito baixa. — Você me pressionou para aceitar esse trabalho, agora ou me dá um trabalho de verdade ou aceita meu cheque. — Não para ambas as coisas. — Certo. Então vou voltar para San Antônio. Acharei um médico que ateste que estou apta para o trabalho. Dito isso, rumou para o seu quarto, deixando Ty sozinho à mesa. Na solidão do seu quarto, Tracy ponderou sobre seu comportamento e percebeu que se portara de forma muito semelhante à de sua mãe. Ramona, sim, era mestre em pressionar e conseguir seu intento. Não importava se seus motivos eram egoístas ou injustos, era através de manobras como a que acabara de adotar que sua mãe obtinha resultados. Na verdade, Ty estava sendo cuidadoso com sua saúde, só isso. Agira como Ramona, exigindo uma coisa que nem ao menos era justa ou razoável... Só por capricho. Era isso que admirava em Ty. A noção clara do que era certo ou adequado. A visão ampla e justa das situações, do caráter moral e ético das suas decisões. Devia desculpas a ele. Criou coragem e saiu do quarto em busca de Ty. Ty vira um reflexo de Ramona em sua filha e não odiara isso. Saíra para o pátio para espairecer. Com os cotovelos apoiados na cerca, se pôs a divagar. Um movimento atrás dos arbustos e ele teve certeza que era Tracy saindo com sua bagagem. Certamente ela iria embora e cumpriria sua promessa. Teria se equivocado tanto em relação a ela? A feição de Tracy, com seus enormes olhos azuis lhe surgiu diante dos olhos e o incomodou. Não, aquela garota era muito confusa para ele... Problemática demais. Mas também era a primeira mulher que o atraía desde que Rio o encantara. Podia entender seu sentimento por Rio. Linda, perfeita e desejável. Rio teria sido uma companheira plena para sua vida. Era tão ligada quanto ele aos valores do campo. Mas Rio se apaixonara por Kane Langtry. Já seus sentimentos em relação à Tracy LeDeux eram um mistério. Era a última moça que poderia combinar com ele em todo o Texas. Não podiam ser mais diferentes um do outro. Talvez estivesse sem se relacionar com uma mulher há tempo demais. E a beleza de Tracy parecia ser um desafio a ser vencido, um apelo sexual ilusório. Seria ela pura como parecia ou apenas uma versão mais nova da própria mãe? O som de gravetos sendo pisados perto dele arrancou-o de seus devaneios. A voz que ouviu em seguida era estranhamente calma e amigável. — Passei a vida toda tentando buscar a atenção das pessoas. Sempre tive a necessidade de me sentir útil. Mesmo quando ninguém me queria a sua volta, ou quando aceitavam a minha presença, sempre me julgavam fraca ou delicada demais para fazer parte das coisas interessantes que estavam vivendo. Tracy fez uma pausa, para recuperar o fôlego, e continuou: — Não estou me desculpando, ou talvez esteja. Talvez seja outra forma de manipulação, como a que tentei fazer no jantar. Não sei exatamente como fazer. Mas sei que quero pedir desculpas a você. Trabalharei quando e no que você disser se ainda quiser que eu fique... É claro.
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— Você é um problema e tanto, sabia? — respondeu Ty, sentindo uma nova onda de carinho por ela. Ele não podia ter expressado sua opinião de pior maneira. Soube disso quando Tracy o olhou tentando ocultar sua mágoa, sem sucesso. Ty tocou sua mão, como uma forma de desculpar-se pelo que havia dito. Não tivera intenção de magoá-la, mas o fizera. — Está tudo bem, não se preocupe — disse ele tocando-a no ombro. Sentiu o corpo rígido de Tracy sob seus dedos. — Só quero que você se recupere um pouco mais, depois sim, vamos trabalhar juntos. Abalado pela turbulência de emoções que a proximidade dela provocara, Ty procurou se controlar. — Obrigada — Tracy virou-se e saiu de perto dele, caminhando de volta para casa, desaparecendo lentamente na escuridão, deixando-o com os olhos perdidos em seu rastro. CAPÍTULO VI Na noite seguinte Tracy juntou-se à Ty na sala de jantar para fazerem a refeição juntos. Eles mal tinham começado a comer quando ele comentou: — Maria tirou algum tempo de folga para visitar a irmã em El Paso. Tracy olhou para ele como se quisesse entender o que aquelas palavras significavam, logo que fizeram sentido entrou em pânico. Sem Maria, ambos estavam sozinhos naquela casa. Certamente ele já fizera planos para colocar alguém no lugar da empregada, alguém para fazer o papel extra-oficial de acompanhante. A frase seguinte distraiu Tracy de suas preocupações. — Você provavelmente já está forte o bastante para poder cozinhar e manter a casa arrumada. Assim você pode trabalhar aqui dentro pelas próximas duas semanas. Tracy, estarrecida, olhou para ele. — Eu não sei cozinhar muito bem, isso não é segredo para você... — Mas sabe ler muito bem, e Maria deixou todas as suas receitas escritas. Sei que ela permitia que você fizesse alguns serviços domésticos, assim deve saber onde ficam as coisas da casa. Naquele momento, Tracy entendeu que não tinha mais volta. Estivera esperando por um trabalho, e a viagem de Maria lhe proporcionara a possibilidade de começar a saldar sua dívida para com Ty. Isso tornava impossível uma recusa. Não havia ameaçado voltar para San Antônio se ficasse sem nada para fazer? Porém sua preocupação ia além de não estar preparada para cozinhar, o que já a deixava intranqüila, mas sim que Ty não estivesse planejando trazer alguém para morar na casa enquanto ela estivesse ali. — Você e eu viveríamos aqui... Sem... O olhar de Ty tornou-se cortante e ele terminou a frase por ela: — Sem uma acompanhante? Tracy assentiu timidamente.
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— Está preocupada com sua reputação? Ele perguntou aquilo de maneira delicada, mas o simples fato de perguntar já significava que Ty considerava um pouco tardia sua preocupação. O episódio em que a pegara bêbada com Gregory Parker e a trouxera para casa, evidentemente havia posto a perder seu direito de reclamar. Tracy não estava certa de como lidaria com aquela situação. A última coisa que ela queria era ir direto ao assunto e exigir a presença de outra pessoa na casa, uma vez que Ty já decidira ser desnecessário. E o que lhe responderia caso pedisse? Dificilmente ele teria coragem de dizer com todas as letras que já não havia mais nada que pudesse salvar sua má reputação. — E quanto a sua reputação? — perguntou Tracy rapidamente. — Acho que a minha pode suportar isso. Tracy olhou para o outro lado e continuou comendo. O que os homens de Ty pensariam dela quando Maria voltasse de El Paso e Tracy tivesse que ir trabalhar com eles? Uma vida inteira de vergonha remoia dentro dela e a inevitável sensação de fracasso tomou conta de seu ser. Ty não podia sequer imaginar os horríveis segredos que conviviam com ela. Mas devia desconfiar que desde o início algo a maculava. Se sua reputação valia tão pouco para ele, não havia muito que Tracy pudesse fazer para mudar essa avaliação. Sabia que, no conceito adotado por aquela sociedade hipócrita em que viviam, existiam coisas que uma vez perdidas, nunca eram recuperadas. Talvez o melhor a fazer no Rancho Cameron fosse se resguardar, empenhar-se no serviço e procurar fazê-lo da melhor maneira possível. Podia conseguir algum auto-respeito com isso, mesmo se ninguém mais a respeitasse. Não era um futuro muito promissor o que tinha diante de si. Mesmo assim Tracy se recusou a capitular. Foi para seu quarto e ao sair de lá só tinha um objetivo em mente: encontrar uma maneira de se transformar numa fantástica cozinheira. O café da manhã tinha que ser perfeito. Tudo tinha que ser perfeito. Na noite anterior ela pegara seu carro e dirigira até a estrada interestadual. Na junção das estradas havia um enorme restaurante que servia de parada de caminhões e ficava aberto vinte e quatro horas por dia. Foi até lá para ver o cardápio e perguntar se podia fazer seus pedidos e passar depois para buscá-los Naquele momento, às cinco e quinze da manhã seguinte ela estava entrando na cozinha de volta da sua primeira viagem oficial até o restaurante. Trazia nas mãos uma valise térmica onde estavam guardados os pratos quentes. Foi rápida em desempacotar a comida e colocá-la em travessas. Panquecas, ovos, batata frita, bacon e lingüiça foram diretamente para o forno de microondas. Colocou pão fresco na torradeira e serviu café diretamente da cafeteira. Assim que as torradas pularam da torradeira, Tracy passou manteiga nelas e juntou-as com os outros pratos na bandeja, dirigiu-se à sala de refeições. Ty estava justamente entrando com o jornal debaixo do braço quando cruzou com Tracy, ela apenas lhe dirigiu um rápido sorriso e voltou para a cozinha. Quando retornou e tomou assento à mesa, percebeu que Ty já servira café para ambos.
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A refeição transcorreu tranqüila e Tracy não viu motivo para contar que não fora ela quem cozinhara a refeição. Tudo que importava era servir uma boa comida para Ty, não suportaria servir uma refeição ruim e totalmente sem sabor, como as que ela costumava preparar, e ter que vê-lo ir se juntar aos homens no refeitório. Contanto que Ty tivesse suas refeições à hora e a tempo, e a casa estivesse limpa e em ordem, os mecanismos para isso não vinham ao caso. Teria tempo para ir ao restaurante três vezes por dia, mesmo que isso fosse cansativo. Eles terminaram de comer e Ty disse: — Você sabe como transferir as ligações da casa? — Maria me ensinou como fazê-lo. Ty pôs-se em pé, o olhar afiado direto na face de Tracy. — Foi uma ótima refeição, Tracy. Obrigada. O silêncio entre eles parecia pulsar de expectativa e Tracy prendeu a respiração. Deveria contar o que havia feito? Mas logo ele se virou para sair e o momento passou. Tracy continuou a buscar as refeições no restaurante de estrada nos quatro dias seguintes. Acordava às três e meia da manhã, vestia-se correndo, dirigia quarenta minutos até o restaurante e mais quarenta na volta, era cansativo. E, além disso, sentia-se como uma criminosa. Ty comia os pratos que ela trazia, agradecia, mas o silêncio que se seguia a deixava desconfortável. Claro que ele devia ter notado que a cozinha não exibia sinais de estar sendo usada. Ao sair da casa, obrigatoriamente, Ty passava por lá e certamente não lhe havia escapado que não havia louça suja sobre a enorme pia de mármore. Mas o silêncio entre eles estava aumentando e se tornando mais pronunciado. Tracy sentia que naqueles silêncios prolongados, Ty esperava que ela dissesse alguma coisa. Portanto, à medida que Tracy se calava, percebia crescer o desapontamento de Ty. O peso da culpa ia tomando conta de si, deixando-a ainda mais insegura do que quando chegara ao Rancho Cameron. Essa história das refeições acabou por se tornar um novo tormento, um dilema moral. Tracy, que tinha a sensibilidade exacerbada e já vivera sob pressão sua vida inteira, sofria com o clima pesado entre eles. O jantar transcorreu da mesma forma, com ele agradecendo ao final da refeição. Em seguida o mesmo olhar gelado em sua direção antes de deixar a mesa. Agora Ty estava no escritório fazendo o trabalho burocrático. Tracy arriscou ir até a porta, mas arrependida deu meia-volta e já estava se retirando quando o ouviu: — Ou você entra aqui e fala comigo ou procure outro lugar para ficar. Não vou suportar seus passos rangendo no assoalho mais uma vez. Deus do Céu! Ele estava bravo! Já sentira seu mau humor antes. Não escolhera uma boa hora para se confessar. — Entre Tracy... Pelo menos deixe um de nós livre dessa situação — bradou em seguida. Ela sentiu o sarcasmo em sua voz e quis que o chão se abrisse para que ela pudesse desaparecer dali. Tomou fôlego e caminhou para dentro do escritório, quase sem pensar
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no que viria a seguir. Dias de tortura sentindo-se mal por causa das refeições que buscava no restaurante, tentando fazer um bom trabalho em vão, dias de tortura ouvindo seus agradecimentos seguidos por olhares de reprovação culminando num arroubo de mau humor da parte dele. — Eu fiz o curso de Economia Doméstica no colegial e passei com nota A, mas fora da classe a única coisa que já cozinhei foram ovos, torradas e macarrão com queijo. Adoro bater bolos, mas você não pode viver de biscoitos e pão-de-ló — disse Tracy em tom calmo. — Não vou estragar sua comida, dessa forma você terá que ir comer com seus empregados no refeitório. Assim eles vão saber que eu também não sou boa nisso. O olhar rude de Ty se suavizou. Tracy estava tremendo de raiva, frustração e desapontamento. — Eu nunca disse que havia feito aquela comida. Você sabia disso e me pressionou até que eu o dissesse. Eu odiava aqueles seus silêncios pretensiosos quando você saía da mesa sem olhar para trás. Deve ter se sentido muito bem se sabendo moralmente superior. O olhar de Ty flamejou com o insulto, mas ele se recostou na cadeira com calma antes de perguntar: — Quanto você gastou com a comida? — Gastei o meu dinheiro. — Você acha que eu sou tão cruel e exigente? A pergunta a deixou ainda mais emotiva do que antes e precisou cerrar os dentes para se controlar. — Sim, acho. Ty se levantou, mas Tracy manteve o olhar firme e continuou: — Tem mais uma coisa, acho que estraguei uma camisa sua na lavanderia. Compro outra. — Tenho centenas de camisas — ele retrucou, dando a volta na escrivaninha. — Perdoe-me por parecer tão impossível de agradar. Você realmente se preocupa com isso, não é verdade? Eles estavam muito próximos então, e Tracy deu um passo atrás. A proximidade de Ty a deixava sem forças. — Chega de comida de restaurante — disse ele peremptoriamente. — Se você só sabe fazer bolos, ovos e macarrão, é isso que vamos comer. — Você trabalha duro, se a comida não for boa... — Se a comida não for boa, eu levo você para comer no restaurante da estrada. —Agora ele estava sorrindo, um sorriso lindo que a fazia acreditar em seus bons sentimentos. — Você é muito ocupado para isso. Vá comer com seus empregados e deixe que eles tirem suas conclusões. — Que espécie de conclusões? Você está insinuando que há algo de sexual entre nós que precise de supervisão? Tem medo por isso? Tracy sacudiu a cabeça horrorizada, lutando contra uma onda de tremores que ameaçava tomar conta de seu corpo. — Não estou sugerindo nada disso, mas as pessoas podem fazer especulações.
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O silêncio que se seguiu, acompanhado do olhar flamejante de Ty, fixo nela, a deixaram com a sensação de ter um painel luminoso preso à testa. Quando ele falou, as palavras soaram-lhe doces, pelo menos a princípio. — Certo Tracy. Provavelmente você está certa. Arrumarei alguém para pernoitar aqui, assim poderá dormir mais tranqüila. O sorriso atraente lhe voltara ao rosto, mas algo nele a fez sentir-se no limite do autocontrole. Com a voz mais baixa, acrescentou: — Por que eu acho que há uma atração forte entre nós. Se não tivermos que nos preocupar tanto com as aparências, talvez não tenhamos que ser tão vigilantes em ocultar isso. Atemorizada, Tracy perdeu o fôlego. — Não estou interessada... Nisso. Ty estava próximo o suficiente para que sua mão facilmente alcançasse uma mecha dos cabelos de Tracy. Subitamente sentiu-se paralisada. Deixou-o tocar os cachos prateados. Por que o toque de Ty se espalhava dentro dela como um raio, deixando-a quente e excitada? Por que aquele toque era tão bem-vindo? Quando a mão dele deslizou para sua face, e a palma tocou-lhe a pele com suavidade, Tracy estremeceu. O contato a fez desejar ser tocada além do rosto. Seu corpo pulsava em regiões jamais imaginadas por Tracy, regiões que a vergonha impedia de serem lembradas, pois eram íntimas e sensuais demais... E que nunca havia sonhado que pudessem produzir sensações tão prazerosas. — Por favor... — murmurou ela, arrasada com a idéia de qualquer coisa associada a sexo com Ty. Ou qualquer outro homem. — Por favor, não me toque. — As palavras mal eram audíveis. — Se eu achasse que você queria mesmo dizer isso, eu retiraria minha mão — sussurrou Ty, e de alguma forma isso prolongou o estranho prazer que o hálito dele contra o seu rosto provocava. — Você está gostando, Tracy... Eu sinto o que se passa com você por que é o mesmo que acontece comigo. Foi então que ele se aproximou mais do rosto de Tracy, e ela cerrou os olhos. Foi tão gentil e carinhoso o toque dos lábios dele nos seus que não conseguiu rechaçá-lo. A sensação que veio a seguir foi de estranha curiosidade, a mesma que sentira na boate quando se chocara contra Ty. A mesma corrente de eletricidade percorreu-a de alto a baixo. Agora os braços de Ty a enlaçavam, o que a fez se retesar de pronto. Apreensiva, procurou resistir ao abraço e afastá-lo quando ele a puxou contra si, porém o calor suave da boca de Ty roubava-lhe as forças. O beijo foi uma revelação. O medo parecia se dissipar para longe. E o prazer se espalhava dentro dela como uma luz dourada. Não se apercebeu da sua reação, até sentir o algodão da camisa de Ty sob seus dedos. Ela correspondera ao carinho. A ponta da língua dele tocava seus lábios. De repente Ty aumentou a pressão do beijo, num segundo sua língua invadia a boca de Tracy e ela sentiu-se devorada de paixão. Seus temores sumiram e ela deixou-se sucumbir. Há muito tempo que deixara de beijar, de ter afeição ou respeito. Apenas um doloroso e brutal ataque que a fizera detestar a idéia de sexo, e se
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perguntar por que o mundo tinha que ser tão violento para suportar algo tão detestável e degradante. Mas Tracy não estava detestando. Não havia nada de degradante naquele beijo que a fazia derreter por dentro e fazia vibrar pontos íntimos de seu corpo. Foi um novo choque sentir os lábios se separando e o beijo chegando ao fim. O mundo girava como um carrossel quando abriu os olhos. O timbre rouco da voz de Ty trouxe nitidez às coisas ao dizer: — Eu reconheço que isso responde muitas questões. Ao menos para mim. Tracy ficou paralisada e se afastou com brusquidão de Ty. Lágrimas toldaram seus olhos e um nó na garganta quase a impedia de falar. — Significa que você sabe algo a meu respeito e decidiu tirar vantagem disso. Ty segurou-a pelos ombros e sacudiu-a de leve. — O que acha que eu sei? Que você não é muito experiente? Que reage como uma virgem? A vergonha a assaltou como um rio de veneno. De alguma forma ele descobrira a seu respeito e resolveu pô-la à prova. Através do filtro amargo da vergonha ela entendeu as palavras dele sob uma outra ótica. Como se estivesse representando um papel para fazê-lo de tolo. — Não brinque comigo... — Tracy sentia o coração partido em mil pedaços. — Nem toda mulher inexperiente que, no entanto não é virgem, teve escolha. — Tracy? Ela ouviu a surpresa expressa em sua voz, e as emoções turbulentas em seu interior se multiplicaram. Percebeu que suas palavras a denunciavam, denunciavam seu passado negro. — Tracy? — O tom gentil da voz de Ty a atingiu. Afastou-se dele, confusa demais para olhar em seus olhos. — Deixe-me em paz. Não estou interessada em você. Não quero nada... Nada desse jeito. Tracy escapou e fugiu para a segurança de seu quarto. Como uma porta que nunca poderia manter fechada. Assim era seu segredo, e demorou um pouco para compreender por que o revelara para Ty. Fora um mal-entendido. E por ter interpretado mal suas palavras, acabara por se abrir. Tracy passou boa parte da noite ao lado da banheira, tentando não ficar doente. Talvez não tivesse dito nada literalmente, porém, falara o bastante para que Ty tirasse suas próprias conclusões a respeito do que acontecera com ela. Ela não era virgem, mas não por sua opção. A palavra "estupro" não cabia na mente de Tracy, que há muito tentava esquecer aquilo. Mas agora voltava com força total, e trazia dor. Um dos amantes bêbados de sua mãe a pegara desarmada e tirara proveito disso. A lembrança desse episódio ainda a confundia e devastava. Só por volta da meia-noite é que tomou consciência da razão que a levara a falar com Ty. Por que se importava com ele. Não podia chamar esse sentimento de amor, já que a palavra a assustava por demais. Mas gostava dele, e isso a apavorava. Tinha medo de não conseguir controlar esse
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sentimento. Adorava a maneira como ele a tocava, como se significasse algo especial. Melhor que ele a rejeitasse agora do que mais tarde, depois que ela já estivesse envolvida por demais. Quando foi para a cama, Tracy se encolheu como um caramujo debaixo das cobertas, insone e vestida. Tinha que se levantar em pouco tempo e preparar o café da manhã para um homem que não conseguia sequer encarar. O segredo de Tracy LeDeux deixou Ty enojado. Raras vezes na vida sentira tamanha raiva. Quando se aproximou da cama de Tracy e a viu pequena, frágil e indefesa, essa raiva só aumentou. Algum imbecil havia se aproveitado dessa fragilidade, e se perguntou se tal canalha havia sido apanhado e recebido o castigo merecido. Afastou uma mecha de cabelo da testa delicada da moça, e pensou que já tinha ultrapassado há muito a linha divisória que separava patrão-empregada. A relação entre eles era bem diferente dessa. Olhou com redobrada ternura para Tracy adormecida e antes de deixar o quarto, cobriu-a cuidadosamente. Pé ante pé saiu de lá sem que fosse notada sua visita noturna. CAPÍTULO VII Na manhã seguinte, quando Tracy entrou na cozinha já passava das onze horas. Estava tão contrariada por ter acordado tarde que parecia prestes a desatar em prantos. Já era ruim o bastante que Ty a tivesse mandado fazer a comida sozinha, e ainda por cima perdera a hora do café e já estava atrasada para começar o almoço. Já não bastava o sentimento de culpa pelo modo de vida que fora forçada a levar, que não a deixava em paz, precisava mostrar sua incompetência de forma tão clara?! E ainda por cima, teria que encará-lo. Oh, Deus! Por que simplesmente não arrumava as malas e ia embora para San Antônio? Na verdade chegara a pegar as malas no armário, mas sentira-se envergonhada de sua atitude e as devolvera à prateleira. Mas, naquele momento, apenas em pensar nas coisas que teria de ouvir de Ty, a simples idéia de fugir já lhe parecia uma saída nobre... Tinha certeza de que, assim que chegasse a casa ele a mandaria embora, colocaria um fim em tudo aquilo e lhe diria para nunca mais olhar para seu rosto novamente. Precisou fazer força para chegar até a cozinha. Mas quando chegou lá tomou um susto. Ty estava diante de um livro de receitas, perdido entre as panelas. Pareceu não perceber a chegada de Tracy, tão concentrado estava no livro de receitas. Para se fazer notar, Tracy pigarreou. Quando ele levantou o olhar, sorriu e falou num tom de voz suave: — Como podemos saber que aparência essa coisa deve ter, se não há figuras no livro?
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Tracy continuou parada, rígida. A doçura de Ty a deixava ainda mais aflita. Como podia parecer tão calmo naquela situação? Será que ele queria traumatizá-la ainda mais? — Eu dormi demais — desculpou-se em voz inaudível. — Desculpe-me... Era eu quem deveria estar fazendo isso. Ty, absorto, não tirava os olhos do livro de receitas. — Você estava aborrecida ontem à noite. Não quis acordá-la porque pensei que um descanso extra só poderia lhe fazer bem. Ele estava tão doce. E parecia mais interessado no livro do que nela. Tracy se moveu cautelosa até onde Ty estava e disse: — Se não se importar em comer um pouco mais tarde, posso começar a preparar já. Esquecendo por um momento o livro de receitas, Ty ergueu a cabeça e olhou-a atentamente. Quando sentiu a intensidade daquele olhar, Tracy pareceu congelar inteira. — Por acaso vai se desmanchar se eu olhar para você? — Não, se você só olhar. Se disser alguma coisa, já não garanto. — Sobre ontem à noite, quero dizer que sinto muito por saber que alguém a feriu de maneira tão profunda e desprezível. Se eu soubesse quem foi o sujeito que fez isso, faria justiça com minhas próprias mãos. Mas, isso é passado. O que importa, para mim, é que você é uma mulher linda, gentil por dentro e por fora e de quem eu gosto muito. E não vejo problema nenhum se você dormiu um pouquinho a mais. A expressão grave do rosto de Ty se suavizou num sorriso divertido e ele acrescentou: — Bom, estou ficando faminto. Voto por irmos almoçar no restaurante da estrada, e dividiremos a responsabilidade no preparo do jantar. Tracy ainda estava em choque. Esperava por tudo, menos por aquela reação... Sem saber o que fazer ou o que falar, ela assentiu com um gesto de cabeça. Como o silêncio na cozinha já começava ficar opressivo, Ty fechou o livro de receitas, olhou-a e falou novamente: — Você sabe que houve algo especial entre nós, ontem à noite. E isso nos impede que continuemos a nos tratar como patrão e empregada... Meio que hesitante, ele continuou: — Não sei se qualquer um de nós está pronto para colocar isso em palavras agora, mas também não acho que seja necessário, pelo menos por enquanto. O que eu gostaria é de encontrar espaço para sermos amigos. Tracy precisou de um pouquinho mais de tempo para se recuperar e conseguir olhar para ele. Ty manteve-se imóvel, fitando-a atentamente, até que seus olhares se reencontrassem. — Você não é a mulher que pensei que fosse, e fico feliz por isso. Gostaria que se sentisse mais à vontade em minha companhia, e que não fosse tão sensível às minhas mudanças de humor. Quero que me respeite, mas não acho que medo seja algo útil por aqui. Confusa e sem acreditar naquilo que estava ouvindo, emocionada e sem conseguir esconder o fato, Tracy simplesmente não sabia o que falar.
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Ele não poderia ter-lhe dito nada melhor. E ao mesmo tempo essas palavras pareciam romper a barreira entre gostar e amar. E para sua maior surpresa, Tracy acreditou em cada sílaba que ouvira. — As coisas não mudam só por que a gente quer que mudem — afirmou ela em voz baixa. — Querer algo já é um começo, Tracy. O que acontece depois só depende do quanto realmente se quer. As palavras de Ty soaram como uma promessa. O calor desse impacto tomou seu coração. Ela o olhou e sentiu um sopro fresco de emoção. Um sorriso assomou nos lábios de Ty e Tracy sentiu a resposta do próprio coração a esse sorriso. — Bem, eu gostaria de almoçar agora. Está pronta para irmos? — convidou Ty. Naquele instante, Tracy sentiu-se num daqueles raros momentos em que a esperança surgia em sua vida. A sensação de que alguma coisa podia dar certo para ela era esquisita, mas elevou seu espírito. Foi impossível conter o discreto sorriso de alívio que lhe chegou aos lábios. A vida de Tracy começou a mudar depois daquele dia. As coisas entre ela e Ty raramente lembravam uma relação de empregada e patrão propriamente dita. E pela primeira vez ela não estava desconfiada ou temerosa de sentir crescer a amizade entre os dois. Sua preocupação com a comida foi desaparecendo, uma vez que a preparação das refeições era um projeto conjunto. Ty decidira que seria assim e Tracy não encontrou um meio de discordar, tamanha era a determinação e o entusiasmo dele. Passavam horas olhando os livros de receitas de Maria e revistas de culinária. Quando ele estava fora, Tracy se ocupava preparando os utensílios e ingredientes para o preparo dos pratos escolhidos. No princípio sentia-se embaraçada por ser tão incompetente na cozinha quanto Ty, que sabia ainda menos que ela sobre cozinhar, depois se sentiu impelida a ajudá-lo. Bem mais tarde é que se deu conta do que Ty estava realmente fazendo, e quando entendeu, seu coração acabou se contorcendo de dor. Milionário, fazendeiro e homem do petróleo, Ty Cameron era a personificação do machismo, se dispunha a trabalhar na própria cozinha por que algo realmente importava. Ela importava para ele. Nunca mais a beijara, embora tivessem estado perto disso. Trabalhavam lado a lado, e era mais que normal que acabassem se tocando. Mas esses contatos continuavam provocando em Tracy fagulhas de eletricidade, espasmos de prazer que, pela primeira vez em sua vida a faziam sentir algum desejo sexual. Suas primeiras tentativas na cozinha foram um tanto quanto desanimadoras, porém eles resolveram o problema enchendo a despensa com guloseimas e saladas. Durante os primeiros cinco dias, os fiascos se repetiram entre as panelas, inclusive Ned James, que estava ocupando um dos quartos de hóspedes, desistiu de comer com eles e se juntou aos outros homens no refeitório. Na quinta-feira à noite eles terminaram o jantar e limparam a cozinha, como de hábito. Tracy estava inquieta, então Ty se juntou a ela para uma caminhada noturna. Saíram pela estradinha que terminava na rodovia, ambos num silêncio ao mesmo
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tempo confortável e turbulento. Confortável porque Tracy sentia-se cada vez mais à vontade com ele, turbulento por causa dos sentimentos que a cada segundo se tornavam mais intensos. Temia pelo que poderia acontecer, ou não acontecer. Havia tanta coisa que Ty não sabia a seu respeito, tanta coisa que gostaria que ele nunca viesse a saber. Seria possível que um homem tão bom não desconfiasse de seu passado feio? Seria possível que alguém assim pudesse agüentar a verdade sobre sua vida? Suas mentiras e ações condenáveis? A noite estava cálida e a brisa soprava carregada de aromas vindos da terra e da relva recém-cortada. Tracy reuniu coragem antes de falar. — O mundo é sério, Ty. Eu realmente aprecio o que está fazendo por mim. Não esperava nada disso... — Nem eu tampouco, mas estou começando a gostar do resultado. Tracy olhou para frente e eles caminharam mais um pouco antes que ela reorganizasse seus pensamentos e pudesse controlar as emoções para falar: — Desde a primeira vez que encontrei Sam Langtry, ele procurou ser bom comigo. Pela primeira vez na minha vida achei que alguém se importava comigo. Ele era gentil, a figura do pai benevolente, a versão em carne e osso do meu ideal de pai. Eu... O idolatrava. Tracy dirigiu a Ty um olhar apreensivo antes de prosseguir: — A verdade é que Sam não precisava fazer nada diferente para me ajudar ou para me agradar. Sendo a pessoa que ele era, já bastava para mim. Então, o que eu quero dizer é que você não precisa fazer nada especial por mim. Tracy hesitou antes de continuar: — Não precisa se preocupar com tudo que vai me dizer, ou como vai dizer. Não precisa se preocupar com o que pode me ferir, como se eu fosse uma bonequinha de porcelana, ou algo assim. — Você se sente segura? — Sim. — E quer dizer que posso ser eu mesmo, com os meus arroubos e temperamento difícil? — Não precisa cuidar de mim ou dos meus... Problemas. Entendo quem você é... Agora. — Confia em mim? — Mais do que pensei ser possível. Isso não é uma ofensa, pelo contrário. — Quanto você confia em mim, Tracy? Quer que eu seja eu mesmo, que não me preocupe com seus problemas, mas será que você é capaz de ser você mesma ao meu lado? Tracy olhou-o com estupefação. — Você continua em guarda, tensa. Menos que antes, claro, mas ainda assim muito mais do que eu gostaria que estivesse. Por que não relaxa um pouco mais? Tracy não podia responder a essa pergunta. — Que tal se começássemos a falar um com o outro com mais liberdade. Se eu
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quiser algo, eu peço. Se você quiser, você pede. Simples e claro. Sem receios ou reservas. Se estivermos magoados um com o outro, diremos, se estivermos alegres... Diremos também. Tracy ousou levantar o olhar para o rosto de Ty, seu coração batia freneticamente de tanta alegria. Viu-o sorrindo para ela. Ele chegou mais perto e a trouxe para junto de si. Lentamente a abraçou, seu rosto quase tocando o dela, e murmurou com carinho: — Esperei tanto por este momento. Era só o que eu pensava nos últimos dias. Os lábios se juntaram numa comunhão amorosa, Ty a apertava mais junto ao seu corpo e só o que Tracy podia pensar era que estava próxima do paraíso. Sem medos, sem sobressaltos, só o enlevo do toque dos lábios de Ty nos seus. Estava apaixonada por Ty Cameron, e quando os lábios dele se afastaram dos dela, Tracy recostou sua face contra o peito másculo, coberto pela camisa de algodão macio e pensou que seu único temor agora era não ser boa o bastante para aquele homem. CAPÍTULO VIII Tracy entrara num universo novo desde que chegara ao Rancho Cameron. E não houve um dia sequer nas semanas seguintes sem que ela agradecesse por estar ali. O trabalho no rancho era árduo e exaustivo, mas sentia que o nervosismo que minara sua vida se fora. Ganhara peso e músculos, e pela primeira vez em sua vida tinha força física. Estar com Ty a maior parte dos dias e noites era como provar um pouquinho do paraíso. Ele vivia sua vida com retidão e praticidade, e isso lhe dava segurança. Positivamente, estava perdidamente apaixonada por ele. Seu maior medo era que isso ficasse evidente demais e que não fosse correspondida. Os beijos entre eles não eram muito freqüentes, mas sentia que Ty se preocupava demais com sua integridade, e essa era a causa que o mantinha afastado dela. Precisava da sólida previsibilidade da rotina do trabalho árduo e do companheirismo. Precisava da estabilidade e da calma emocional do ambiente onde só cabiam disputas menores sobre assuntos cotidianos, sem mentiras ou manipulações e encontrara isso no Rancho Cameron. Sua vida pregressa começava a se esvanecer da memória. Tracy concentrava sua atenção no trabalho do rancho, dedicando seu tempo e energia para se tornar uma amazona melhor ou em se inteirar de todos os detalhes a respeito do gado e da vida na fazenda. Cada dia era um teste para sua força e seus talentos. Os fracassos eram freqüentes, mas não permanentes por que sempre podia tentar de novo e com mais empenho. Ty era na verdade sua única distração, a relação deles lhe dava tudo o que precisava em sua nova vida, além de um brilho dourado de excitação e uma paz crescente. A antiga Tracy teria se atemorizado com tamanha felicidade. Mas a nova Tracy estava ocupada demais com a satisfação das pequenas descobertas para se preocupar
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com qualquer coisa que pudesse lhe roubar a alegria. Foi numa rápida visita à sua cobertura em San Antônio, numa tarde depois do almoço que ela se deparou com a dura realidade existente além das fronteiras do Rancho Cameron. Estava lá apenas para pegar sua correspondência e dar uma olhada em tudo quando, dez minutos depois, ouviu a campainha tocar. Embora estranhando o fato do interfone não anunciar a chegada de nenhum visitante, estava apressada demais em voltar ao rancho para se preocupar com isso, simplesmente abriu a porta. Ramona LeDeux Langtry estava parada no pequeno lobby entre a porta e o elevador. Vestida num conjunto branco que realçava seus cabelos louros, Ramona parecia rica, elegante e glamourosa. Assim que viu Tracy, arqueou a sobrancelha. — Nossa! Olhe só para você — exclamou ela, entrando porta adentro antes de cobri-la de alto a baixo com um olhar escrutinador. Tracy sentiu o coração gelar e procurou esconder sua surpresa. — Você parece muito bem. Bronzeada e forte. — Ramona apertou os olhos, pensativa. — Diferente... — Olá, mãe. O cumprimento rígido fez Ramona sorrir. — "Olá, mãe" — ironizou ela. — Muito apropriado. Quando o modo como tem me evitado tem sido tudo, menos apropriado ou respeitoso. Tracy fechou a porta. Segurando a maçaneta, recostou-se contra a madeira, aparentando uma casualidade que estava longe de sentir na presença de sua mãe. — O que a traz a San Antônio? — Boatos — Ramona respondeu vagamente enquanto examinava à sua volta. — Onde está hospedada? — Tracy perguntou. Sorrindo, ela respondeu: — Aqui, com minha filha, é claro. Você certamente tem um quarto extra. — Não acho uma boa idéia — Tracy falou sentindo seus nervos fraquejarem. — Por que não? — O belo rosto de Ramona aparentava uma surpresa que seus olhos desmentiam. — Não podemos morar juntas — Tracy respondeu de forma solene. — Lógico que podemos — assegurou-lhe Ramona com um sorriso. — Sempre estivemos juntas. Nunca entendi essa sua rebeliãozinha do ano passado. Mesmo assim dei um tempo para você pensar. — Tenho quase vinte e três anos, mãe. Planejo continuar vivendo sozinha. — E quanto a mim? — O tom de voz amedrontado de Ramona era falso. Tracy ouviu um alarme mental disparar naquele momento. — Você pode continuar vivendo sua vida por conta própria. Ramona parecia ofendida. — Já não sei o que pensar Tracy. Por que está sendo rude comigo? — Mãe, é bom saber que está bem, mas só passei aqui para pegar algumas coisas. Estou com um pouco de pressa. — Oh! Você está fora? — Estou fora da cidade.
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— Ótimo, podemos viajar juntas. — Não é possível, pois... — E por que não, Tracy? — Ramona interrompeu a filha, fingindo estar magoada. — Nossa Tracy, você nunca foi uma menina cruel! A acusação sutil ecoou dentro de Tracy. Não só não queria viajar com sua mãe, como nem ao menos queria vê-la. E deixara isso muito claro. — Você sabe o porquê. A falsa mágoa se dissipou e os olhos de Ramona brilharam, calculistas. — Sim, eu sei querida. Você está vivendo com Ty Cameron. Está dormindo com ele? — Você precisa ir, mãe. Quero fechar a casa. — Apressada para voltar para Cameron? Por acaso ele já sabe a seu respeito? — perguntou Ramona com astúcia. — Não sabe, não é? E você está apaixonada por ele. Tracy não respondeu. Ramona tinha farejado uma oportunidade, por isso voltara. De repente Tracy percebeu rugas no rosto de sua mãe, e um brilho estranho e intenso nos olhos azuis. Ramona continuava sendo uma mulher estonteantemente bela, mas finalmente mostrava sinais da idade. Talvez isso explicasse o brilho estranho em seus olhos. Estava com medo de deixar de ser atraente para os homens. Conseguira seduzir muitos homens ricos com sua aparência, e a simples idéia de deixar de ser capaz disso devia aterrorizá-la. Perder seus atrativos era algo muito doloroso para alguém com a mentalidade dela. A expressão de Ramona endureceu e Tracy soube o que esperar. Era uma coisa antiga entre elas. Sempre que Tracy demonstrava alguma resistência, Ramona começava a desmontar pedaço a pedaço a própria filha. Até que esta estivesse desmoralizada demais para lutar. — Bem, devo cumprimentá-la pelo seu bom gosto e sorte. Ty Cameron é incrivelmente rico e atraente, mas deve se lembrar que homens como ele procuram uma esposa com atributos que você não pode sequer sonhar em preencher. — Você tem que sair — Tracy tornou a falar com uma calma surpreendente. — Preciso voltar. Ramona ignorou a ordem. — Envolver-se com Ty Cameron foi um erro tático. Se a relação de vocês se tornar pública vai ser mais difícil para a conquista de seu próximo homem. Sabe como essas coisas são... Muito embora Tracy tivesse ganas de agarrar sua mãe pelo pescoço, estava chocada demais com o sangue-frio da análise. — Você precisava ter escolhido um homem mais fácil. Alguém cuja solidão ou o ego exigisse uma esposa bonita como troféu. Um homem mais... Compreensivo, digamos. — Não quero ouvir nem mais uma palavra. — Tracy abriu a porta. — Adeus. Ramona deu uma risada curta, mas seus olhos faiscavam de raiva. — Você deveria saber que ninguém, muito menos você, pode me dizer adeus e ficar por isso mesmo. Ninguém me conhece tão bem quanto você, filhinha. — Então você precisa de dinheiro. — Não era uma pergunta. — Agora sim, vejo que está deixando a polidez de lado — Ramona retrucou, irônica. — Claro que preciso de dinheiro. E você me deve muito. Sam Langtry lhe deixou uma montanha de dinheiro e me insultou com uma migalha. Sabe que isso não foi direito.
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— Certo, Ramona. Sei como ninguém que se começar a te dar dinheiro, começará tudo de novo. — Teme que eu não te deixe mais em paz? Que não pare de exigir a minha parte? — Algo assim. Ramona riu. — Você está muito afiada para uma garota que tem tanto a esconder. Já era demais para ser suportado. Tracy estava tremendo dos pés a cabeça quando falou: — Fora daqui, mãe. Um sorriso genuíno aflorou nos lábios de Ramona. — Certo, querida. Eu vou. Talvez você precise de um tempo para pensar. Talvez precise voltar para ele antes de decidir se vai preferir que ele descubra tudo a seu respeito. — Não vou deixar que você me chantageie. Você abusou de uma criança, de uma menor. E antes que vá falar com Ty Cameron sugiro que verifique as implicações disso. — Como pensa em me deter? Volte para seu fazendeiro rico, Tracy. Vamos ver o que ele vai fazer quando descobrir quem é você. — Não me procure mais Ramona. A ordem fez sua mãe parar a caminho da saída, e olhar para ela. — Não seja tola e não se faça de superior comigo. Sou a única pessoa que já se importou com você. Éramos uma equipe, você e eu. E está linda agora, muito mais do que eu já fui. Mas podemos tornar toda essa beleza lucrativa. Tracy pegou a mãe pelo braço e a levou para fora do apartamento. — Nunca mais quero ver seu rosto. Ramona puxou o braço e sorrindo, disse: — Seremos ótimas juntas, Tracy. Como nos velhos tempos. Eu entro em contato com você. Ramona pegou o elevador e deixou Tracy só. Imóvel, ela deixou que finalmente o impacto da visita a atingisse com força total. Como não imaginara antes que isso poderia acontecer? Era apenas questão de tempo. Como não imaginara, a despeito dos meses anteriores, que um futuro com Ty era impossível, que naqueles meses tinham vivido um conto de fadas, um lindo sonho frágil demais para sobreviver ao primeiro sopro da realidade? Tracy pegou suas coisas e deixou a cobertura. Quando estacionou o carro perto da casa do rancho, ficou chocada em perceber que viera como um autômato durante toda a longa viagem de San Antônio até ali. Que tal se eu e você apenas falássemos um com o outro?, Ty havia lhe perguntado meses atrás. Por semanas e semanas haviam falado de tudo, menos do seu passado. Ou de parte do seu passado. Tracy percebeu que apenas falara sobre Sam, Kane e Rio, suas visitas à Langtry, sua escola, lugares onde tinha estado. Apenas lembranças agradáveis. Quase não mencionara o nome de Ramona, e muito menos dividira com Ty suas experiências traumáticas numa vida repleta de medo e escuridão. Fingira que não precisava contar nada disso a ele já que estava recomeçando sua
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vida, e teria suas próprias opções dali em diante. Porém Ramona retornara para mostrar quem realmente estava no comando. Tracy saiu do carro como um zumbi, entrou na casa e passou o resto da tarde trancada em seu quarto, olhando para a parede. Tracy não deu nenhuma explicação para seu comportamento na volta de San Antônio, e Ty também não falou nada a respeito. Esse fato apenas relembrou Tracy de que Ty confiava nela, e a fez sentir-se culpada porque ela não confiava nele a tal ponto. De alguma maneira Tracy conseguiu jantar e manter uma conversa quase normal. Em seguida, escapou para ajudar Maria a limpar a cozinha. Ty estava no escritório quando ela terminou e antes que pudesse se recolher, ele a convidou para irem juntos à sala para um relax. Tracy estava certa de que nunca mais conseguiria relaxar. O Rancho Cameron já não era mais um universo alternativo e maravilhoso onde as coisas eram honestas e sadias. O veneno das maquinações de Ramona havia contaminado tudo e Tracy estava de luto pela sua perda. Eles sentaram juntos no sofá e Ty pegou o controle remoto da televisão, quando Tracy começou a ficar muito impaciente para ficar quieta. Ela olhou de um jeito que, esperava, fosse casual. Mas nem tentou sorrir. — Já pensou em dar uma escapada? Ty pegou-lhe a mão e a pôs sobre a própria coxa. — Está chegando uma época atarefada do ano. Trabalho de outono. — Ele apertou sua mão gentilmente. Tracy tentou disfarçar o desespero que a resposta lhe trouxe. — Nada muito longo. Apenas alguns dias — insistiu ela com cuidado. Se conseguisse deixar Ty longe por alguns dias ou semanas, talvez fizesse Ramona desistir do seu intento. Nesse intervalo poderia surgir outra oportunidade de golpe para sua mãe, afastando o perigo. A culpa de tentar manipular Ty quase sufocava Tracy. Quando ele a olhou fixamente, seu olhar se aguçou: — Você está um pouco ofegante, Tracy. O que há? Suspirando, ela desviou o olhar. Estava em sua mente falar com ele, contar tudo, confessar partes de sua vida que deixara de fora. As palavras estavam na ponta da língua, mas o sabor do medo subitamente paralisou sua vontade. Oh, Deus! Ainda não tinha tido tempo suficiente ao lado de Ty! Amava estar ali com ele, ela o amava. Não tinha tido ainda o suficiente daquela rara sensação de felicidade e contentamento, e seu coração lhe gritava para aproveitar ao máximo. — Pode me contar? — aquela pergunta foi fatal. O que Tracy respondeu não era mentira. — Eu gostaria de estar com você... Em algum lugar. Privado. Um lindo sorriso aflorou na boca máscula de Ty. — Maria saiu esta noite. — Então, puxando-a mais perto de si, ele perguntou: — Quão privado você tem em mente? A sexualidade que tomou conta de Tracy era intensa, mas nem isso conseguiu diminuir sua ansiedade.
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— Não sei bem. Ty lançou-lhe um olhar solene. — Você fez uma longa jornada, Tracy. Mas por mais confortável que pareça estar comigo agora, por mais fácil que pareça para eu tocá-la, você nunca toma a iniciativa. Sempre espera que eu o faça... Depois de uma pausa, continuou: — Estive esperando que tomasse a dianteira, que me beijasse quando sentisse vontade de fazê-lo. Já deve saber que jamais a repeliria. "Sim, ele o faria.", pensou Tracy. Ela odiava seu passado, mas um homem como Ty Cameron jamais conseguiria conviver com isso. No minuto que tomasse conhecimento ele lhe viraria as costas para sempre. Quanto tempo teria antes que Ramona se manifestasse? Já vira sua mãe em ação centenas de vezes. Era uma mulher esperta, fria e sem coração. E cruel. Precisava de dinheiro, provavelmente muito dinheiro. A idéia de se afastarem por algum tempo fora uma tolice, fruto de seu desespero. Ramona era muito persistente. — Tracy? Tem algo errado, não é? — Quero ficar com você — respondeu ela, num fiapo de voz. — Não importa por quanto tempo. — Não tenho um limite de tempo em mente, Tracy. Por mim ficaríamos juntos para sempre. Não percebeu isso ainda? Ela não sabia mais o que pensar. Podia ver em seus olhos a promessa obscura. Não tinha outro jeito, precisava impedi-lo de continuar falando. Ficou de frente para Ty, os joelhos sobre o sofá, sem aviso passou seus braços em torno do pescoço dele, e inclinando-se sobre seu corpo juntou seus lábios aos dele. O beijo foi repentino e vigoroso. Ty correspondeu ao imprevisto com igual vigor. Em segundos ela estava sob ele no sofá, seus beijos eram tão lascivos e fogosos que os únicos sons que se ouviam na sala eram da respiração ofegante, das roupas roçando umas nas outras, e dos botões pulando das casas. Tracy estava gemendo quando tudo parou. Ela abriu os olhos e viu a razão. Ty olhava para baixo, em sua direção e seu olhar a fez sentir-se exposta. Sua blusa estava desabotoada, os dois lados abertos, e o ar gelado soprava sobre sua pele avermelhada. Gentilmente Ty segurou-a pelos pulsos e tirando os braços do seu pescoço ergueu-os acima da cabeça de Tracy. O peso do corpo de Ty sobre o seu tornava impossível qualquer movimento. — Eu esperei semanas que você viesse até mim, mas não esperava por isso querida. Eu adoro seu lado maluco e ardente, mas ele não tem nada a ver com desespero. Não posso suportar o medo de volta aos seus olhos. O que isto fez a você? Tracy não volte para aquele lugar horrível que você vivia antes de vir aqui. Lágrimas rolavam pela face de Tracy. — Volte para cá, Tracy, fique comigo. Nada que ficou para trás importa. — Importa sim. — Foi só o que ela conseguiu balbuciar entre os soluços que a impediam de falar. — Então me conte, fale sobre isso e supere o passado.
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— Não — disse em voz entrecortada pela dor. — Não, não, não... — Ouça-me Tracy... — ordenou ele em voz suave. — Ramona LeDeux já dormiu com muitos homens para ter segredos. A frase chocante fez cessar o ataque de histeria de Tracy e a levou a olhar para Ty. — Sei de alguma coisa e posso adivinhar o resto. Sua consciência a está levando ao desespero minha querida, as coisas com as quais você teve de conviver te cobrem de vergonha, não é? — Eu não posso... Tolerar. Ty saiu de cima de Tracy e ela sentou-se no sofá. — Você é a pessoa mais importante da minha vida. — Admitir isso já era um grande risco. — E eu não suportaria ter de contar a você, por que eu mesma não tolero pensar nisso. — Dê-me uma chance, Tracy. Os segredos, por piores que sejam são mais leves de carregar quando os dividimos com alguém de confiança. Esta era a ocasião que eu esperava, vamos sair e conversar. Podemos cavalgar, ou só caminhar pela noite. Ou só ficarmos aqui. Talvez ele estivesse certo, talvez fosse o momento de dividir seus segredos. Mas ele estava enganado numa coisa, não eram fáceis assim de serem assimilados. Eram explosivos e estavam a ponto de virem à tona. CAPITULO IX Tracy re-abotoou a blusa. Era melhor ficar em casa para isso. Assim, se Ty quisesse que ela partisse após a conversa, estaria perto das suas coisas e não lá fora. Seria só arrumar as malas e partir. Ty continuava calmamente sentado no sofá, mas Tracy estava agitada demais para relaxar. Sentou-se na mesa de centro de frente para ele, esfregando as mãos nervosamente. — O que aconteceu com você, hoje, Tracy? O que houve para deixá-la assim? — Ramona foi a minha casa hoje enquanto eu estava lá. Ela quer dinheiro e quer a mim. Se sabe algo sobre a minha mãe, deve saber também que ela sempre consegue o que quer. — Ela pode ter você? — Não, nunca mais — respondeu Tracy e sentiu seu nervosismo diminuir. Era isso. Mesmo que Ty reagisse da pior maneira possível, era aquele o momento de contar tudo. Estava cansada demais de carregar aquele peso todo em seu peito, cheia de viver sob o domínio do medo. Odiava sua vida, jamais a viveria daquela forma outra vez, e se Ty fosse a metade do homem que imaginava que era, ao menos isso ele saberia. — Será que te ajuda saber que eu descobri muita coisa, inclusive que sua mãe usou uma porção de homens, e que ela usou você? Tracy apertou as mãos com força, antes de dizer: — Você descobriu coisas que minha mãe fez, mas provavelmente não sabe as coisas
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que eu fiz. Eu era uma mentirosa e uma ladra, e era sua cúmplice. Eu fazia o que ela mandava e não contava nada a ninguém. Primeiro por que não havia a quem contar e mais tarde por que me envergonhava. Ela era tudo que eu tinha, e morria de medo de ficar só no meio da estrada caso ela fosse presa. Tracy sentiu a pressão voltar e olhou para longe, inquieta. — Não imagina o poder que o medo exerce sobre alguém cuja vida já é um pesadelo. E quando você acredita que é tão sem valor quanto sua mãe afirma. É a mistura perfeita do medo e da culpa ao mesmo tempo. Ty estava tão quieto que fez o coração de Tracy falhar uma batida. — Eu estava roubando coisas em joalherias e lojas de departamento aos quatro anos. Além de ser mais fácil para uma criança colocar jóias caras no bolso sem que ninguém perceba, é bem mais simples culpar a criança, que não sabe o que é certo ou errado, e se apanhada, a mãe da criança fica apenas mortificada pelo "incidente". Tracy parou de falar para enxugar as lágrimas que lhe corriam abundantes pelo rosto. Então, continuou: — Eu era a criança mais bem vestida do Texas, era só entrar nos provadores das lojas caras e eu saía com a roupa mais cara vestida debaixo da minha própria. Meu trabalho quando estávamos hospedadas em algum lugar era pegar as caixas de jóias dos outros quartos, quando seus ocupantes estavam ocupados em outro lugar. E era uma mentirosa também, pois tinha prática em fingir ignorância quando perguntada pelo paradeiro de qualquer coisa. Tracy cruzou os braços, respirou fundo e prosseguiu no seu relato: — Estava no auge da minha carreira como ladra e mentirosa quando finalmente fiz uma amiga, estava no segundo ano e ela se chamava Emmy Jean. Um dia sumiu um berloque da pulseira dela e sabíamos que havia sido roubado, eu o havia roubado. Emmy começou a chorar e disse que Deus não gostava de quem roubava e mentia. Ela disse isso sem pensar em mim, mas eu ouvi como um recado pessoal. Acabei devolvendo o berloque, deixando cair perto da carteira dela, mas as palavras nunca mais saíram da minha mente. Tracy parou um momento, sentindo a tristeza das lembranças tomarem conta de si. — Continuei comendo e dormindo, mas a idéia de Deus me condenando nunca mais me abandonou. Os roubos continuaram até que Ramona conseguiu encontrar um jeito de atrair homens ricos. Impaciente consigo mesma, os nervos à flor da pele, Tracy recomeçou: — Isso resume minha infância. As coisas começaram a acontecer com os homens e eu não me dei conta disso. Só depois que um dos namorados de Ramona me atacou quando tinha quase dezesseis anos foi que entendi que, sutilmente, ela estava me pondo em jogo. Ty sentia a raiva invadi-lo. Mas, pacientemente, esperou que Tracy continuasse seu relato. — Não sei se ela tinha consciência de que eu podia ser estuprada, nunca tive certeza. Não contei a ninguém, não contei a Sam. Ramona me convenceu de que a saúde dele era frágil e eu poderia matá-lo com isso. Ele viveu mais seis anos e eu temi cada dia que ele descobrisse. Ty abriu a boca para falar, mas ela o impediu com um gesto e continuou falando, sem conseguir parar: — Mas antes que você comece a pensar que eu era apenas uma vítima inocente nisso
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tudo, devo lhe dizer que quando eu fiquei quieta sobre o golpe de Ramona em Kane e Rio, não foi só por medo dela, mas por um estranho senso de lealdade a ela. Depois, ela estava lutando contra Kane e ele era um poderoso inimigo. A vontade de dividir aquela sujeira impelia Tracy. — Além disso, quando finalmente tudo acabou e ela foi embora acabei me perguntando, até que ponto eu não tinha agido assim por que tinha certa queda por Kane. Ele era bom e nunca encostara um dedo em mim. Talvez tenha sido o único homem com quem cheguei a ter pensamentos eróticos, e com quem eu poderia ter uma família decente. Não posso dizer como aconteceu, mas Ramona pareceu saber como trazê-lo para mim. Depois de tudo isso, diga-me Ty, ainda acha que valeu o tempo e o esforço que você gastou para reabilitar uma garota rica e desmiolada? Ty a segurou pelos ombros e a puxou para perto, sussurrando em seu ouvido: — Não acha que está sendo muito dura consigo? — falou mansamente. — Acha que sou ingênuo de mais para estar preparado para isso? Ou está só aterrorizada? Com medo que eu a abandone? Tracy olhou-o fixamente, sua dor encontrando reflexo na ternura dele. — Sinto-me como se estivesse morrendo, como se tivesse cortado meu próprio coração e agora fosse sangrar até a morte. — O que você está sentindo é a dor se esvaindo. Deixe-a ir, Tracy. Já passou, acabou. Ainda estou aqui e ninguém vai sangrar até a morte. Naquele momento, Tracy finalmente capitulou. As lágrimas vieram numa torrente, os soluços saindo convulsivos do peito, seus joelhos tremendo. Ty a conduziu para fora da sala, até a privacidade de seu quarto. A dor e a vergonha de uma vida inteira fluindo através dela até que tudo perdeu a nitidez. Sentado na poltrona diante da cama de casal, Ty segurou Tracy em seu colo, amparando seu pranto. Como uma criança exausta de chorar, a certo ponto Tracy adormeceu, e nem percebeu quando Ty a carregou para seu quarto, a despiu e a pôs debaixo dos lençóis. Depois de se certificar que dormia profundamente, beijou-lhe a testa e saiu do quarto em silêncio. Tracy acordou na manhã seguinte sentindo-se atordoada. Seus olhos ainda estavam inchados pelo choro. Fez um esforço e levantou-se da cama, dirigindo-se ao banheiro para tomar uma ducha. Eram sete horas da manhã quando ela saiu do quarto rumo à cozinha. A casa parecia envolta em quietude, e isso lhe deu uma imensa paz interior, um sentimento inédito. Entrou na cozinha exatamente quando Ty vinha do pátio. Relanceou os olhos sobre ela, mas foi o bastante para Tracy se sentir inspecionada. — Tem certeza de que está pronta para sair da cama? — perguntou ele com extrema delicadeza, e com um sorriso que a fez se enternecer. — Dormi demais. Mais uma vez... — Podemos fazer o que você quiser hoje. Podemos até sair alguns dias como sugeriu ontem. — Esta é uma época do ano muito atribulada — replicou Tracy, usando o argumento dele. — Tenho gente trabalhando para mim, e se ainda quiser, podemos viajar.
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A oferta a tocou e a tornou corajosa. — Nós ainda somos... Amigos? — murmurou Tracy. — Não me conhece o bastante para saber a resposta? — Tenho medo. — Medo de quê? — Que isto seja um sonho, que a noite passada não tenha sido como eu me lembro. E que eu esteja longe daqui, sonhando com você... A face de Ty ficou sombria. — Você não acredita no que conversamos ontem? Não acredita muito na vida, não é? — Nada é tão bom assim. Ty segurou-lhe a face com ambas as mãos. — Você vai superar isso Tracy. Provavelmente vai levar algum tempo, mas vai aprender a esperar sempre pelo melhor. Em seguida se inclinou para beijá-la. Um beijo terno, sem a flama da paixão, do desejo, mas cheio de amor. Separou-se dela, e a fez sentar-se à mesa. — Tem algo interessante no jornal de hoje. — E erguendo-o, mostrou a manchete para Tracy. Em letras garrafais a manchete dizia: "Preso por estupro e drogas". O artigo que se seguia, falava sobre a prisão de Gregory Parker III, depois de cinco mulheres terem dado queixa contra ele por drogá-las e estuprá-las em encontros. — Você não estava bêbada aquela noite, mas não acreditei em você. Nem lhe dei o benefício da dúvida. Perdoe-me. Tracy encarou o olhar sombrio de Ty e seu coração parecia explodir com a maior gratidão e o mais profundo amor que jamais sonhara poder sentir em toda sua vida. Os dias seguintes foram preenchidos com trabalho árduo no campo. Tracy não estava interessada em sair dos domínios do Rancho Cameron, então eles não iam além dos portões. Talvez um dia ela se cansasse da vida na fazenda, mas era difícil imaginar que isso fosse acontecer. Sua nova vida não podia ser mais diferente da anterior. Também, agora Tracy tinha um senso de direção claro e estabilidade para poder fazer planos para o futuro e contava com a presença forte e protetora de Ty a seu lado. Raramente pensava em Ramona, e estava ocupada demais com o trabalho para se preocupar com seus esquemas maquiavélicos. A admiração por Ty só aumentava. Estavam mais próximos e mais integrados, apenas um simples olhar ou um toque já era suficiente para se entenderem. Tracy se sentia livre para expressar seu carinho, e fazia isso com demonstrações físicas. O nível de sensualidade entre eles se tornara mais e mais intenso, embora os limites continuassem existindo. Tracy sentia-se pronta para ir além, mas não ousava mencionar isso. Talvez isso acontecesse porque Ty era um homem de princípios e, portanto, estava esperando o casamento para ir além. Mas a cada noite, quando se deitava, Tracy orava para que tudo desse certo, e que
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ela nunca precisasse sair da vida de Ty Cameron. O calor da tarde no Texas era escaldante, mas Tracy se adaptara muito bem a ele. Estavam no curral, tratando de um dos novilhos que havia se ferido. O animal estava com dor e inquieto, e era preciso paciência e habilidade para suturar o corte antes que o anestésico fizesse efeito. Tracy auxiliava Ty, acalmando o bezerro, falando com ele gentilmente enquanto eram dados os pontos. — Você tem jeito para isso, Tracy — comentou Ty mais tarde, quando estavam voltando para casa. — E parece que o novilho concorda comigo. Tocou o celular de Ty e ele atendeu. Ao desligar, sua expressão já não tinha nada de ameno. — Ramona está em casa, e quer falar com você. Seus pensamentos estavam tão distantes da mãe, que Tracy levou algum tempo até se dar conta do que se passava. — Então é isso — disse secamente, resolvida a encarar Ramona. — Quero estar com você — Ty avisou. Tracy desviou o olhar, indecisa. — Olhe para mim, Tracy, ouça-me. Por que eu quero te dizer isto há muito tempo. — Então, segurou o rosto de Tracy. — Não há nada que Ramona possa dizer ou fazer que me faça mudar de idéia, que possa mudar o que eu sinto por você. Tem que saber disso, porque quero estar ao seu lado. Não por que ache que é incapaz de lidar com Ramona, mas porque quero ver a mulher que amo finalmente fechar a porta do passado. Vai ser maravilhoso. Com um meio sorriso, ele concluiu: — E está mais do que na hora de Ramona saber disso. Ela precisa certificar-se de que nada que venha a fazer pode nos atingir, e que desta vez, ela perdeu a viagem. Tentando controlar a emoção que as palavras de Ty lhe provocaram, Tracy disse: — Esse confronto pode ser muito feio. E profano. — Feiúra e profanação não me incomodam. Vamos encará-las pela última vez hoje. Ela encostou o rosto contra o peito de Ty, sentindo o conforto de sua presença. — Vamos, querida... Fazemos tudo por aqui juntos. — Ty deu-lhe um beijo e completou: — Nós somos muito bons juntos. — Sim, somos — repetiu baixinho. Ty passou o braço sobre os ombros de Tracy e, abraçados se dirigiram para a casa. CAPÍTULO X A notícia da chegada de Ramona e a ansiedade que precedia aquele encontro fizeram os nervos de Tracy ficarem tensos, o que era bem razoável dadas as circunstâncias. Ela não estava preparada para esse encontro repentino com Ramona, pois a felicidade que desfrutava ao lado de Ty não a deixava pensar em coisas tristes. Mas sua autoconfiança recém-conquistada desde que chegara ao Rancho Cameron, quando conversara com Ty e expusera toda a sua dor e remorso que carregava, encontrando nele o conforto e a proteção que tanto precisava, subitamente se
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fortalecera. Tracy encarara os mais traumatizantes eventos de sua vida solitária, que a fizeram viver eternamente com medo. Dessa vez, não estava sozinha e já que fora tão longe, não tinha mais por que temer Ramona. De repente tinha a certeza que o encontro com sua mãe não seria aquele bicho-de-sete-cabeças que sempre imaginara... Seria difícil, até mesmo constrangedor, mas nada além disso. A sensação que tinha era de sofrimento, afinal esse poderia ser considerado como o "último" encontro entre mãe e filha. E, apesar de tudo, Ramona ainda era sua mãe. Porém, a excitação, a descoberta de como a vida podia ser bonita, o gosto pela liberdade que começava a sentir, eram sentimentos que sobrepujavam qualquer outro sentimento. Quando entrou na cozinha, a sensação de calma e bem-estar que invadiu Tracy, fez sumir qualquer traço de ansiedade. Estava pronta para Ramona e ansiosa para terminar com tudo. O sobressalto e a palidez demonstrados por Ramona quando Tracy entrou na sala, eram a prova de que sua calma e resolução apareciam de maneira clara e inabalável, não dando chance para que a mãe a intimidasse. Mas Ramona recuperou-se rápido, enquanto lançava um olhar avaliador sobre Ty, que vinha logo atrás de Tracy. — Olá, Sr. Cameron, como é bom vê-lo novamente... — disse Ramona, sorrindo e se acomodando numa poltrona. Calculista contumaz, ela foi direto ao assunto que a levara até ali. — Gostaria de estar a sós com minha filha por alguns minutos. Importa-se? Tracy se recostou contra o sofá, de forma casual. — Eu me importo. Não espero que sua visita seja longa. E não há nada que o Sr. Cameron não possa ouvir da nossa conversa. Ty se acomodou numa poltrona próxima de Tracy, e algo na postura de ambos incomodou Ramona, sobremaneira, a ponto de deixá-la no limite do seu autocontrole. — Mas, querida... — insistiu ela, fazendo rodeios e olhando significativamente para a filha. — Não acho que o Sr. Cam... — Há apenas dois assuntos que temos a tratar — interrompeu Tracy, rudemente. — E já tenho decisão tomada sobre ambos. Não lhe darei um tostão e não pretendo vê-la novamente. Tracy sentiu o choque que suas palavras causaram em Ramona. Talvez ela estivesse precipitando as coisas, mas repentinamente não podia tolerar ser um joguete nas mãos de sua mãe. Já tinha sofrido o suficiente para uma vida inteira. Aliás, por muitas vidas. Fazendo uma expressão de ultrajada, Ramona revidou: — Como ousa falar dessa maneira com sua mãe, Tracy? — E como você ousa vir até aqui para chantagear sua própria filha? Sua única filha! — retrucou ela. — Você e esse... Sr. Cameron parecem muito confiantes. Confiantes demais, dadas as circunstâncias. — O Sr. Cameron sabe de tudo, Ramona. Não há segredos entre nós, nada que você
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possa usar. Por isso, aceite um conselho: É melhor você sair daqui, agora, e procurar outra pessoa em quem aplicar seus golpes. Alguém que tenha mais a esconder do que você. — Você não teve coragem de contar tudo a ele, não é mesmo?! — Ramona perguntou incrédula e cheia de soberba. Sua expressão se assemelhava à de uma atriz amadora representando uma peça ruim. Naquele momento Tracy percebeu o quão patética era sua mãe, e o tempo que perdera tendo medo de suas chantagens. — Tudo, Ramona — repetiu Tracy. — Por isso, acho melhor você ir embora... Agora. — Duvido que tenha contado tudo... Sua coragem não chega a tanto. Jamais confessaria que é a mais cara prostituta do Texas. — Contei, sim. Contei também que você extorquiu dinheiro do meu estuprador para ficar quieta. Acho que isso é crime também, afinal você obstruiu o trabalho da justiça e encobriu um crime. Acho que isso também é crime neste Estado. Afinal eu era sua filha e menor de idade... — Você jamais suportaria que eu expusesse isso à imprensa. — Tudo que eu quero é cuidar da minha vida, Ramona. E, acredite, esta é uma decisão permanente. Portanto, esteja avisada: se você procurar a imprensa, eu procurarei a polícia... Pense bem antes de fazer qualquer coisa, lembre-se de que bons advogados custam muito caro... Especialmente os criminais. — Ora, sua... — gritou Ramona, avançando sobre Tracy. Tracy ouviu o ruído de Ty se pondo de pé e percebeu a intimidação que isso provocou em Ramona. Uma onda de bem-estar a envolveu, fazendo com que se sentisse vitoriosa. Sabia que daquele momento em diante, nunca mais teria medo de nada. — Foi uma decisão sábia — concluiu Tracy. — Agora saia. Tracy acompanhou a mãe até a porta para ter certeza de que ela estava indo embora. Viu o carro arrancar e sumir na estrada. Chegou a pensar em seguir o carro dela até que saísse do Rancho Cameron. Só quando viu a poeira baixar no horizonte é que se voltou para o interior da casa. Deu de encontro com o corpo musculoso de Ty que estava bem atrás dela, os olhos azuis brilhando de satisfação, e um sorriso de satisfação e orgulho brincando em seus lábios. — Garanto-lhe que foi um dos maiores prazeres da minha vida assistir você enfrentá-la desse jeito, e virar a mesa. Você é uma mulher incrível Tracy LeDeux, e estou orgulhoso por tê-la conhecido. Tracy exalou um longo suspiro e devolveu-lhe o sorriso. Só então falou: — Obrigada por me salvar de Greg Parker aquela noite, e ter sido tão rígido e desaprovador. Por ter ido ao meu apartamento no dia seguinte, mesmo depois de eu ter destruído seu carro e a garagem, e ter ignorado seus telefonemas. Não sei quanto tempo eu viveria se você não tivesse aparecido em minha vida. Tracy abraçou-o bem forte, como se não quisesse se separar de Ty nunca mais, e continuou: — Obrigada por cada coisa que fez por mim desde aquela noite fatídica. Especialmente por me trazer para esse maravilhoso mundo de sonhos... — Acabou tudo, Tracy — ele sussurrou, beijando-a nos cabelos. — Fiz reservas para o jantar. Um lugar onde podemos sentar, conversar e passar um tempo agradável. O
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que você acha da minha idéia? — Que é melhor eu correr para o chuveiro e procurar a roupa mais bonita que eu tiver no guarda-roupa... — Faça isso. Vou falar com Maria e encontro você, aqui, às cinco. O beijo que se seguiu foi longo e intenso, e de certa forma era um prenuncio do que Ty tinha em mente para aquela noite. Tracy ficou olhando-o depois que ele se afastou, e chegou à conclusão que fora a sorte que a havia trazido ao Rancho Cameron. O rouco "até logo" de Ty foi uma promessa que aqueceu o coração de Tracy até o entardecer. Levou dias para que Tracy se recuperasse do encontro com sua mãe. Não que a conversa que havia tido com Ramona a tivesse traumatizado, mas porque aquele encontro tinha colocado um ponto final no relacionamento doentio existente entre as duas. E isso fora definitivo. Lentamente, à medida que os dias foram passando, ela pôde sentir os efeitos que a paz, a segurança e a magia do Rancho Cameron causavam em si. Sentia-se segura e em paz onde quer que estivesse, e começou a compreender que trazia essa paz dentro de si mesma, que não era o lugar que lhe proporcionava tal sensação. Mas, seu novo posicionamento diante da vida, suas conclusões a respeito de si mesma seriam postos a prova. Foi durante o café da manhã. Estavam sentados, quase acabando a primeira refeição do dia. Ty olhou-a e avisou que estavam de partida para o Rancho Langtry. — Kane tem telefonado desde sua chegada aqui, querendo saber como você está, e me fez prometer que a levaria até Langtry. Rio está grávida e isso a impede de trabalhar na fazenda, provavelmente sua visita vai tirá-la do enfado de passar o dia todo em casa ao lado dele... Só sei que eu ficaria enfastiado de passar tanto tempo com ele. Tracy estava imune a brincadeira de Ty quanto à Rio estar cansada da companhia de Kane. Sabia que aqueles dois eram loucos um pelo outro. Do mesmo jeito que sabia, também, que Rio estava tão acostumada a ficar na lida da fazenda que esse retiro forçado devia realmente estar enlouquecendo-a. Mas o anúncio da viagem a Langtry a deixou doente de ansiedade. A pior coisa que fizera fora justamente com Rio e Kane. Ficara quieta quando deveria ter falado. Podia ter poupado ambos da agonia que Ramona provocara. Não importava que ambos a tivessem perdoado. Ela não era uma criança indefesa naquela época, era uma mulher feita de quase vinte e um anos, com uma clara noção de moral, e mesmo assim os abandonara. A voz de Ty chamou a atenção de Tracy. Ela ergueu o rosto e fitou-o. — Há muito tempo que não vejo esse olhar Tracy, e odeio vê-lo agora. Eles querem vê-la, querem deixar claro que está tudo bem entre eles e certificarem-se de que a mesma coisa acontece com você. Tracy abandonou seu garfo e pegou o guardanapo no colo, hesitante. Não conseguia falar nada.
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Como se não tivesse percebido o mal-estar de Tracy, Ty continuou falando: — Li suas cartas no back-up do computador. É uma boa coisa a se fazer. A declaração dele a perturbou. Isso queria dizer que Ty sabia de tudo que havia feito. Sabia que havia enviado cheques para as lojas que se lembrava ter roubado durante a infância e adolescência. Sabia que tentara, do mesmo modo, ressarcir a maioria das pessoas que também havia lesado. Não conseguira achar muitas delas, já que era pequena demais na época, mas continuava procurando na ânsia de reparar seus erros. Escrevera para Kane e Rio, e como eles estavam casados e felizes na expectativa do primeiro filho, tinha encontrado um pouco de paz de espírito. Mas não havia carta ou dinheiro que pudesse compensá-los pelo sofrimento passado, e Tracy sabia disso. — Estamos juntos hoje, Tracy — disse Ty, suavemente. — E estaremos juntos amanhã, depois de amanhã e assim dia após dia, mesmo que você não me deixe levá-la à Langtry hoje. Mas já que viemos até aqui, acho que devemos levar adiante mais essa tarefa. Tracy não podia falar de tão emocionada que estava. Mas correspondeu quando Ty apertou sua mão, solidário e companheiro. O Rancho Langtry não parecia tão impressionante quanto o Rancho Cameron, quando visto do céu, mas uma vez no chão parecia tão grande quanto um pequeno país. Assim que pousaram, um empregado foi recebê-los na pista de pouso e os levou até a sede da fazenda. Ty, todo cavalheiro, saiu antes do jipe e deu a mão para Tracy, ajudando-a a descer. Pegaram as maletas e deram a volta no pátio. Os hóspedes entravam pela porta da frente e só a família usava a porta dos fundos. Não passou despercebido para Tracy que Ty a estava conduzindo para os fundos da casa, Kane e Rio esperavam por eles na soleira, e o receio de Tracy de ser recebida com frieza se desvaneceu nessa hora. No início sentiu desconforto e tensão, e foi incapaz de falar. Mas Kane a enlaçou e rodopiou com ela até deixá-la tonta. Na seqüência, Tracy retribuiu o abraço e não pode conter o pranto. Abraçar Rio foi mais complicado, já que a silhueta avantajada pela gravidez era maior que os braços delgados de Tracy. Tão emocionada que estava, apenas balbuciou: — Não posso crer... — Tracy referia-se ao mesmo tempo a adiantada gestação de Rio e à calorosa acolhida. — Nós também mal podemos acreditar. Pensamos que nunca mais a teríamos de volta. Que essa tenha sido sua ausência mais longa, afinal, você faz parte da nossa família e nós lhe queremos muito bem. — Vamos entrar e pegar uma caixa de lenços. Lá dentro, Kane esperou que os soluços de Tracy cessassem para dizer: — Como foi que Cameron a trouxe até aqui, irmãzinha? Daqui para frente vamos nos falar pelo menos uma vez por mês por telefone e passaremos os feriados e datas especiais juntos, como uma família. Dessa vez, quando Tracy explodiu em lágrimas, Kane a trouxe para junto de si, num abraço apertado, e deixou que ela abafasse os soluços em sua camisa. A noite quente e gostosa levou Rio e Tracy para conversar à beira da piscina. Em
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pouco tempo, Ty e Kane juntaram-se a elas com champanhe e taças, prometendo momentos de deliciosa descontração. Tracy estava radiante, esbanjando alegria. Agradecia a Deus as mudanças ocorridas em sua vida, e atribuía a Ty o mérito de tudo aquilo. Tudo parecia perfeito quando se deu conta de que, ao ver Kane e Rio casados e transbordantes de felicidade com a chegada do primeiro filho, uma pontada de melancolia lhe surgia. Parecia que lhe faltava alguma coisa... Mais tarde, quando caminhavam pelo jardim na noite aprazível, os dois casais de braços dados jogando conversa fora, Tracy pensava na sorte que tinha. Estava de volta a Langtry, recebida com amor no seio da família, e ao lado de Ty. Sentia-se quase culpada por ainda querer mais. Mas queria mais. Queria Ty Cameron. Queria Ty do jeito que Rio tinha Kane. Tracy amara Ty em silêncio, por meses e tivera dele mais do que sequer sonhara ter de um homem. Mas desejava muito mais... Queria ser esposa dele, para dividirem tudo desde as coisas mais pequenas da vida até aquele sentimento avassalador que guardava dentro de si Porém não podia esquecer que havia uma barreira entre eles. Uma barreira que parecia intransponível para Ty. Sabia que ele a amava, mas já não bastava só isso. Uma voz enrouquecida tirou Tracy de seus devaneios, era Ty apontando as estrelas. — Parecem diamantes lá em cima, não parecem? Vê aquela lá, a mais brilhante? — Ele fez um gesto, como se tivesse pegado alguma coisa no ar. — Peguei para você, querida. Tracy riu da brincadeira infantil e fingiu aceitar a estrela que ele oferecia na mão fechada. Com voz macia ele prosseguiu no jogo: — Querida, peguei um pedaço do céu para te dar. — Então, aproximou mais a mão e mostrou o que escondia entre os dedos. — Uma estrela para você se lembrar de mim para sempre. Sem fôlego, Tracy viu o homem dos seus sonhos segurar-lhe a mão trêmula e colocar no dedo anular um anel de brilhantes. Em seguida, Ty se pôs de joelhos diante dela e disse em voz solene: — Srta. Tracy LeDeux, quer ser minha esposa? Tracy se atirou sobre ele envolvendo-o num longo e apaixonado beijo, só interrompido por que Ty quis completar sua proposta. — A senhorita tem quatro semanas para providenciar tudo para que tenhamos o mais belo casamento da história do Texas. Acha que dá conta de mais esta tarefa? E fazendo cara de mau, Ty fingiu ordenar: — Ou será que vai me desapontar, exatamente agora? Ao que ela respondeu: — Já desapontei meu patrão alguma vez? A resposta de Ty Cameron foi um beijo ainda mais apaixonado. E Tracy soube que seu futuro seria lindo e sereno como num conto de fadas. O seu conto de fadas. Fim
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SUSAN FOX é fã dos faroestes e dos caubóis e pensa em heróis românticos sempre com chapéus e botas! No tempo livre que tem, Susan é uma assumida fã de filmes na televisão. Ela gosta particularmente de filmes românticos, e também lê uma variedade de novelas românticas — todos com finais felizes — e planeja escrever muitos mais de sua própria lavra.

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